26 de nov. de 2009

Morre o criminalista Waldir Troncoso Peres

MEMÓRIA

Considerado um dos mais importantes criminalistas do País, o advogado Waldir Troncoso Peres morreu no domingo, em São Paulo, aos 85 anos, em consequência de insuficiência renal. Ele estava internado no Hospital Albert Einstein, onde seu corpo foi velado até as 13h de ontem, quando foi transportado para sua cidade natal, Vargem Grande do Sul, para um outro velório preparado por seus familiares. O enterro deve acontecer às 9 horas de hoje.

Filho de um agricultor espanhol, Peres se mudou para a capital paulista com 16 anos. Formou-se em 1947 na Faculdade de Direito do Largo São Francisco. Dono de uma admirável oratória, atuou até 2004, quando foi vítima de um acidente vascular cerebral (AVC) que prejudicou sua fala.

Em nota, o presidente da seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, Luiz Flávio Borges D’Urso, lamentou a morte do colega. “Em sua vitoriosa trajetória profissional escreveu seu nome entre os grandes criminalistas brasileiros, como Evaristo de Moraes, Dante Delmanto, Raimundo Paschoal Barbosa e Manoel Pedro Pimentel”, lembrou. “Estes advogados transformaram a Advocacia Criminal em arte, ao assegurar que ninguém é indigno de defesa.”

Sobre seu ofício, Peres afirmava que, se o cliente cometesse um crime, seria defendido por ele. Se cometesse o segundo, também. Mas se cometesse o terceiro, não o defenderia mais, para não parecer que era “profissional do crime”. Em sua carreira, foi saudado como “lenda viva das tribunas do júri” e “príncipe dos advogados.” No total, defendeu mais de 130 pessoas acusadas de crime passional, entre eles o famoso caso do cantor Lindomar Castilho.


Terça-feira, 14 de abril de 2009

25 de nov. de 2009

Com capas de papelão, livros por R$ 6

CULTURA
Projeto apoia jovens e catadores

Em uma salinha na Vila Madalena, a artista plástica Lúcia Rosa não se cansa de ensinar jovens a montar livros. Um trabalho artesanal, feito um a um. A capa, de papelão, é pintada com guache; o miolo, diagramado e impresso graças a um computador simples, é grampeado e colado; dentro, desde obras de escritores alternativos até publicações de Manoel de Barros, Alice Ruiz, Haroldo de Campos, Glauco Mattoso, Marcelino Freire...

O projeto Dulcinéia Catadora - homenagem a uma catadora de papel chamada Dulcinéia Santos que, segundo Lúcia, "representa bem a batalha pela vida", além de se referir à Dulcinéia de Dom Quixote, "o amor impossível" - nasceu de forma embrionária na Bienal de Arte de 2006, inspirado em similar argentino.

No ano seguinte, começou a publicar livros de autores contemporâneos. Sempre em baixas tiragens, de 50 a cem exemplares. "Pedimos autorização para os escritores, que não ganham nada com isso", afirma Lúcia. Cada exemplar é vendido por R$ 6 - pedidos podem ser feitos pelo e-mail dulcineiacatadora.pedidos@gmail.com - e toda a renda é revertida para o projeto.

Os jovens que trabalham na confecção dos livros ganham R$ 6 por hora. "Gosto de fazer isso porque um dia quero estudar para ser designer gráfico", diz Maurício Araujo da Silva, de 20 anos, que mora em Interlagos e participa do Dulcinéia desde o início do ano. "Descobri o projeto há pouco tempo; é a minha segunda vez aqui", conta Janaína Aparecida da Silva, de 25 anos, que mora na Parada Inglesa e sonha um dia se tornar jornalista.

O papelão para as capas é adquirido dos catadores por R$ 1 o quilo - cooperativas de reciclagem costumam pagar de R$ 0,20 a R$ 0,30 pela mesma quantidade.

Às 21 horas de hoje, a Mercearia São Pedro - Rua Rodésia, 34, Vila Madalena - será a sede do lançamento de mais dois títulos da Dulcinéia: Tribêbada, antologia de contos de vários autores; e Signicidade, do premiado poeta Frederico Barbosa. "São poemas ligados à questão urbana", adianta Barbosa, sobre seu livro.

"Acho o projeto (Dulcinéia) muito importante porque aproxima a moçada de uma literatura que talvez eles nunca teriam contato e une artes plásticas e literatura", diz. "E é um trabalho ecológico muito curioso de reciclagem."


Sábado, 21 de novembro de 2009

24 de nov. de 2009

Um ano e meio e R$ 4,5 milhões depois, renasce o Cacilda Becker

CULTURA
Teatro da Lapa, que reabre hoje, passou por obra radical - apenas duas das paredes originais ficaram de pé

O Teatro Cacilda Becker, na Lapa, nasceu de novo. Neste caso, não é apenas força de expressão. Após um ano e meio de obras, o espaço reabre hoje - às 21h, com a peça ApontoTchekhov - praticamente todo refeito. "Foi quase uma reconstrução", admite a arquiteta da Secretaria Municipal de Cultura Silvana Maria Santopaolo, coautora do projeto. "Somente duas paredes do prédio antigo foram mantidas."

Ao custo de R$ 4,5 milhões, foi a primeira grande intervenção sofrida pelo espaço, inaugurado em 1988 - cujo nome homenageia a atriz paulista Cacilda Becker (1921-1969), um dos maiores mitos dos palcos brasileiros. "Nas outras vezes, foram feitas apenas reformas pontuais", lembra a arquiteta.

A obra vinha sendo planejada desde 2006 e foi iniciada no ano passado. "A situação era lamentável. Chovia dentro do palco", comenta Silvana. Os sinais de melhorias estão por todos os lados. A cabine de som, por exemplo, tinha acesso por uma rudimentar escada de marinheiro e só comportava uma pessoa por vez. Hoje, tornou-se ampla e confortável. Ventiladores mambembes - eram três de cada lado - foram substituídos por aparelhos de ar-condicionado. E, no hall de entrada, um excerto do poema Atriz, em que Carlos Drummond de Andrade homenageia Cacilda, estampa a parede principal - ao lado da herma, que já existia, de autoria do escultor Vasco Prado.

MELHORIAS
A mudança que terá maior impacto artístico, porém, é a ampliação do palco. Sua altura foi aumentada de 6 para 11 metros. E o chão também cresceu, já que os camarins - que ocupavam parte da boca de cena - foram removidos dali e instalados no fundo do teatro. "Os camarins ficavam no palco porque, na época, esqueceram de construí-los", revela a arquiteta. "Então tiveram de ser improvisados depois que a obra ficou pronta." Parece piada.

Do lado externo, o paisagismo também foi alterado, com o plantio de novas mudas de árvores. As quatro que já existiam - três bauínias e uma tipuana - foram conservadas. "Mas existe a ideia de transplantá-las. Com a nova construção, elas sofrem um pouco, pela proximidade", explica Silvana.

Se depender das aspirações de Silvana, a intervenção não acabará agora. "Meu sonho é tirar os muros que fecham o teatro", defende. "Assim ele se abriria para a cidade. Seria como uma nova praça." A capacidade do teatro - 195 lugares - permanece a mesma, após a reforma.

PROGRAMAÇÃO

Teatro
ApontoTchekhov: dias 20 e 21, às 21h; dia 22, às 19h. R$ 10; Peter Pan e Wendy: dias 21 e 22, às 16h. R$ 10; A Casa: dias 3, 4 e 5 de dezembro, às 21h; dia 6 de dezembro, às 19h. R$ 10; Romeu e Julieta: dias 5 e 6 de dezembro, às 16h. R$ 10; Histórias de Lá, do Lado de Cá: dias 12 e 13 de dezembro, às 16h. R$ 10; O Dragão: dias 17, 18, 19 e 20 de dezembro, às 21h. R$ 10; Marajá Sonhador e Outras Histórias: dias 19 e 20 de dezembro, às 16h. R$ 10

Dança
Park Na Hoon e Sungsoo Ahn Pick-up Group: dias 26 e 27, às 21h. Grátis; Lee Tae - Sang D.T.1 e Ahn Aesoon Dance Company: dias 28 e 29, às 21h. Grátis; Meu Prazer: dias 10, 11 e 12 de dezembro, às 21h; dia 13 de dezembro, às 19h. R$ 10

Música:
Lulina e Marcelo Jeneci: dia 1º de dezembro, às 21h. Grátis; Bruno Morais e Anelis Assumpção: dia 8 de dezembro, às 21h. Grátis; Tulipa Ruiz e Iara Rennó: dia 15 de dezembro, às 21h. Grátis.

Teatro Cacilda Becker: Rua Tito, 295, Lapa; tel.: (11) 3864-4513. Funcionamento da Bilheteria: as vendas de ingresso começam 1 hora antes de cada espetáculo


Sexta-feira, 20 de novembro de 2009

23 de nov. de 2009

A arte dos operários, no Municipal

CULTURA
Restauração do quase centenário teatro paulistano é feita por 70 trabalhadores com sensibilidade artística

Desde julho de 2008, o Teatro Municipal de São Paulo está em obras. Em tarefas detalhistas, 70 profissionais dedicam-se a recuperar ornamentos, esculturas de bronze, a cúpula de cobre, pinturas no teto, vitrais... Tudo deteriorado pelo tempo. É a terceira grande intervenção no prédio, símbolo da erudição e elegância de uma São Paulo de quase cem anos atrás: saído das pranchetas de Ramos de Azevedo, foi inaugurado em 1911 e passou por reformas em 1954 e em 1987.

O trabalho todo, previsto para ser finalizado no primeiro semestre do ano que vem, mexe com os sonhos até dos operários que lá atuam. "Eu já achava o teatro a coisa mais linda da cidade. Quando vim trabalhar aqui, tive a chance de conhecê-lo por dentro", revela Alcino José da Silva, piauiense que há 18 anos vive na capital paulista. "Tenho muita vontade de assistir a alguma coisa (no teatro), mas acho que a chance é mínima." Ele pode cultivar a esperança, já que a Secretaria Municipal de Cultura avalia a possibilidade de, com o término das obras, promover um espetáculo aberto a todos os funcionários da restauração.

Entre capacetes e ferramentas, as histórias que se entrecruzam por ali têm enredo semelhante: boa parte dos funcionários não nasceu em São Paulo e só conhecia o Municipal "de passar em frente".

DETALHES
Apesar da importância - de fato e pelo simbolismo todo - do trabalho ali realizado por eles, o discurso comum tem uma humildade sincera. É "no olho", por exemplo, que eles refazem os ornatos da fachada - um total de 1.813 -, muitos quebrados e quase irreconhecíveis. "Não me acho um escultor, muito menos um artista", afirma o baiano Carlito dos Santos Rocha, de 28 anos. "Eu só olho o modelo e vou copiando." Nascido em Roraima, seu colega Jenival Afonso do Carmo, de 34, equilibra-se nas alturas para, com espátula na mão, dizer que cada um desses enfeites pode levar até 40 dias para ficar tinindo.

E há os especialistas em cobre. Que dedicam-se a restaurar, por exemplo, a cúpula do prédio - uma gigante estrutura de 30 metros de diâmetro, que fica a 40 metros do chão. Ali, já fizeram reparos pontuais, corrigindo problemas de infiltração de água. E, a partir de dezembro, irão deixá-la bonita como se fosse nova. Entre esses profissionais estão os primos Gedival e Cláudio Santos da Motta, de 32 e 33 anos, ambos baianos. "São Paulo foi onde eu consegui trabalho. Então gosto desta cidade", frisa Cláudio. Gedival concorda. E seguem na luta.

O negócio de Márcio Santos de Lima, de 26 anos, nascido em Ribeirão Pires, no ABC paulista, é dar um jeito nas esculturas de bronze - há seis espalhadas, no alto, pelo lado externo do Municipal. "São 30 dias para restaurar cada uma delas", conta, enquanto se detém nos retoques finais de Poesia Lírica. "São muitas as dificuldades", ressalta a arquiteta Gabriela Kozlowski, que acompanha as obras. "As chuvas, a temperatura e a umidade são inimigos do trabalho pois os procedimentos são sensíveis."

No interior, também há muito o que fazer. As 200 mil peças de vidro que formam os 25 conjuntos de vitrais passam por restauração, no mesmo ateliê que as fez, em 1911. Nos tetos dos salões, as pinturas recebem cuidados especiais com pinceladas milimétricas.

O baiano Lucivaldo Alves de Almeida, de 31 anos, é um dos que ficam boa parte do dia olhando para cima, em busca de algum detalhe que mereça restauração. "De tempos em tempos, tenho de mexer bastante o pescoço, senão no fim do dia não há quem aguente de dor", conta. Quem quiser conhecer as obras terá oportunidade em breve. No dia 8, está prevista uma visita monitorada ao local - inscrições pelo e-mail dphdivulga@prefeitura.sp.gov.br.

FORMA E CONTEÚDO
Mas não só as obras têm colocado o Municipal sob os holofotes. No início do mês, o maestro Jamil Maluf se demitiu do posto de diretor artístico do Municipal. Em comunicado enviado aos músicos, ele atribuiu sua saída às "aspirações do secretário (...) de Cultura de já iniciar informalmente a implantação da nova estrutura que irá vigorar na futura fundação". Referia-se ao fato de que a Secretaria pretende criar uma fundação para administrar a entidade, para regularizar a situação de contratação dos integrantes dos corpos artísticos - atualmente, todos têm contratos temporários, renovados sempre que expiram.

Outra notícia recente: a licitação para a reforma do palco do Municipal foi suspensa por tempo indeterminado pela Empresa Municipal de Urbanização (Emurb), como publicado no Diário Oficial da Cidade em 30 de outubro. Além disso, o Ministério Público Estadual investiga - conforme o Estado revelou em março - possível superfaturamento na compra de oito instrumentos musicais, em novembro de 2007.

Por causa do atual estágio das obras, desde setembro, o Municipal está completamente fechado. Mesmo assim, há vida artística lá dentro. Duas semanas atrás, a Rede Globo utilizou o interior do espaço para gravar cenas de uma novela. No fim de outubro, um grupo apresentou esquetes no palco do teatro, como forma de celebrar a formatura de um curso de contrarregragem e mecânica cênica oferecido por um projeto de capacitação cultural.

E, alheio a barulheira da obra, um pianista solitário costuma dedilhar o novíssimo Steinway do Municipal. Sem público, sem aplausos no fim, Gilberto Tinetti executa as peças como um trabalho voluntário. "Há uma recomendação do fabricante (do piano) para que ele não fique parado", explica o pianista. "Então, venho, a cada dez dias, e fico tocando por cerca de três horas."


Domingo, 22 de novembro de 2009

22 de nov. de 2009

O baladeiro da literatura

PAULISTÂNIA
Escritor premiado, Marcelino Freire celebra o sucesso do evento que agita a Vila Madalena há quatro anos

Chama-se Balada Literária e não tem pompa nem frescura a festa cult que, pelo quarto ano consecutivo, agita bares, centros culturais e livrarias da Vila Madalena, do dia 19 a 22, com eventos extras dias 25 e 29. Mas - prova do sucesso que é - atrai para suas mesas nomes consagrados como Lygia Fagundes Telles, Mario Prata, João Gilberto Noll e João Ubaldo Ribeiro. À frente dessa empreitada está o escritor Marcelino Freire, 42 anos, nascido em Sertânia (PE) e radicado em São Paulo desde 1991.

Boêmio inveterado, recebe a reportagem em um bar - o Mercearia São Pedro - que fica a poucos metros de sua casa e começa contando que a ideia da Balada nasceu da vontade de tomar mais cerveja. Foi em 2005 e Marcelino estava na famosa Flip, a Feira Literária Internacional de Parati. "Aí me dei conta que lá faltava cerveja", lembra. "Eu era um bêbado sofrido, perambulando por Parati e mendigando cerveja. Não pode faltar cerveja em uma festa. Fiquei indignado."

Então propôs ao proprietário da Livraria da Vila, Samuel Seibel, a criação de um evento literário na Vila Madalena. "Pô, aqui tem os bares todos... Cerveja não vai faltar." No ano seguinte ocorria a I Balada Literária, com apoio da livraria.

Consolidado, o evento espera receber este ano cerca de 100 escritores, entre figuras conhecidas, novatos e gente alternativa em debates com o público. Nas semanas que antecedem a festa, o celular de Marcelino não para - o telefone tocou sete vezes durante as duas horas em que durou a entrevista ao Estado. "Eu não tenho equipe nem patrocinador oficial", diz. "Peço ajuda de um por um, até para os taxistas. Costumo dizer que, enquanto as outras festas são feitas com um milhão, esta é feita com humilhação." A livraria de Seibel, primeiro a compartilhar o projeto, sempre esteve entre os apoiadores.

CAPÍTULO PRIMEIRO
Caçula de 14 irmãos - dos quais somente nove vingaram -, Marcelino teve o estalo de se tornar escritor aos 9 anos de idade, quando já morava no Recife (PE). Leu um poema de Manuel Bandeira (1886-1968) no livro escolar de um irmão e ficou fascinado. Pediu uma obra dele de presente - "em uma casa onde pouco se lia", frisa. Ganhou Estrela da Vida Inteira. "Quando soube que Bandeira era pernambucano que nem eu, vi que eu podia me tornar alguém como ele." E a vontade de ser poeta corroborava a observação constante do pai, que insistia, desgostoso, que Marcelino era um "menino muito aluado".

Adolescente, arrumou emprego em um banco. Começou como office boy, depois virou escriturário e, por fim, revisor. "Com o tempo, revisava até as cartas do presidente do banco", diz. Essa rotina durou até 1989, quando decidiu pedir a conta para tentar se tornar escritor - ele já fazia faculdade de Letras, curso que jamais concluiu.

Dois anos depois, mudou-se para São Paulo, cidade que ele ainda nem sequer conhecia. "Dois dias de viagem dentro de um ônibus, cheguei aqui e tudo era feio e frio", afirma. "Mas eu queria essa bagunça. Estava cansado de tanta beleza, sol, praia... E, além disso, sou preguiçoso. Muito preguiçoso. Então preciso de uma cidade veloz." E completa: "Recife amanhece. São Paulo acorda. Eu precisava de uma cidade que me acordasse."

VOLUME II
Morou de favor na casa de um amigo em Aricanduva, zona leste. Uma edícula. "Ele dividia comigo até o que não tinha", emociona-se. Conseguiu rápido trabalho de revisor em uma agência de publicidade e logo se mudou para uma travessa da Avenida Paulista. Viveu também no Bexiga até encontrar o seu cantinho paulistano: o bairro da Vila Madalena, na zona oeste, seu endereço desde 1995. Mora sozinho. Ou melhor, na companhia de quase 400 pinguins de geladeira. Quase uma metáfora do "sertanejo", como gosta de lembrar. "A gente chega e passa muito frio aqui em São Paulo", brinca. "Na verdade, eu queria um. Depois resolvi que três ficariam bem em cima da geladeira. Aí coloquei seis, depois 12. Hoje todo mundo me presenteia com um pinguim."

PÁGINA ATUAL
Entre idas e vindas, trabalhos fixos e frilas, atuou como revisor publicitário até 2006. Paralelamente, conciliava sua carreira de escritor. Assim lançou AcRústico (em 1995), eraOdito (1998), Angu de Sangue (2000), nova edição de eraOdito (2002), BaléRalé (2003), Os Cem Menores Contos Brasileiros do Século (2004), Contos Negreiros (2005) e RASIF (2008). Em 2006, levou o Prêmio Jabuti por Contos Negreiros.

"Aos poucos comecei a perceber que minha agenda estava tomando praticamente o ano todo", relembra, citando inúmeras participações em eventos literários, convites para palestras e seu trabalho em oficinas para aprendizes da escrita. Era hora de deixar por completo de ser revisor para viver somente - e exatamente - como escritor.

Entre uma viagem e outra, é na mesma Vila Madalena que persiste. De livraria em livraria. De café em café. De sebo em sebo. De bar em bar. "É o caminho da perdição etílico-literária", define. De preferência, com laptop a tiracolo. "Gosto de levar as ideias debaixo do braço."


Domingo, 15 de novembro de 2009

21 de nov. de 2009

Eles sobreviveram para contar...

ACIDENTE NO RODOANEL
Apesar do susto e do mau estado dos veículos, vítimas escaparam do acidente com ferimentos de pouca gravidade

Caminhoneiro experiente, com mais de 20 anos de profissão, Reginaldo Aparecido Pereira, de 40 anos, está acostumado às surpresas das estradas. Ao ouvir na noite de sexta-feira um forte estrondo, imaginou que estava sobre uma grande buraco. Assustado, abriu a porta do caminhão em movimento e se jogou no acostamento. Ele ficou desacordado até ser socorrido pela equipe de resgate. O susto foi tão grande que Reginaldo não se lembra do que aconteceu do momento que se jogou do veículo até entrar na ambulância.

Quem conta a história é a sobrinha Rosemeire Ferreira dos Santos, que acompanhou a tia, mulher do caminhoneiro, Cleusa Inácio Pereira, de 48 anos, até o hospital na madrugada de ontem. O encontro foi emocionante. Todos choraram muito diante da sorte de Reginaldo de ter sobrevivido ao desabamento das vigas sobre o caminhão.

O caminhoneiro quebrou três costelas, teve um corte leve no rosto, uma fratura na clavícula e sofreu uma torção no braço. O rosto ficou inchado, mas ele conversava sem dificuldades. "Ele está consciente e reconhece todo mundo", disse Cleusa. Ontem à tarde estava prevista uma segunda tomografia pela equipe médica para confirmar se estava tudo bem. Ele deve ter alta do hospital hoje.

O casal Reginaldo e Cleusa, muito religioso, visitou a Basílica de Aparecida no fim de semana para pagar uma promessa. Rosemeire não sabe qual era o pedido, apenas que era algo referente à vida dos próprios tios. Cleusa fez aniversário na quarta-feira.

Habituada com a rotina do marido, Cleusa costuma falar com ele por telefone várias vezes ao dia. Na sexta-feira à noite ela sabia que ele iria até a empresa de transportes onde trabalha para trocar de caminhão. Era azul, novinho em folha. Ficou completamente destruído, enquanto Reginaldo, como todos diziam, "nasceu de novo".

A família, que mora em Osasco, assistia à TV quando soube do acidente, pouco depois das 21h. O último telefonema entre os dois havia sido às 20h30. Rosemeire tentou convencer a tia de que o caminhão não era o de Reginaldo, mas Cleusa afirmava, chorando: "É ele, é ele." Ela tentou falar pelo rádio e pelo celular. Ninguém respondia. Estava confirmado que Reginaldo era uma das três vítimas. Desde a madrugada Cleusa não saiu do lado do marido no hospital.

Luana Augusto Coradi, de 21 anos, passa todos os dias pela Régis Bittencourt, pois mora em Embu. "Vi as vigas chegando em uma carreta, depois as vi sendo colocadas e, por fim, as vi caindo", conta a bancária, que, ao contrário de muitos supersticiosos, tem o número 13 como um amuleto. "Ela conheceu o namorado no dia 13. O aniversário dele também é no dia 13 e foi no último dia 13 que Luana nasceu de novo", diz a mãe da bancária, Maria Estênia Augusto Otaviano.

Luana atribui à mãe a sorte de estar viva. "Naquela noite, estava indo ao aniversário de um amigo", lembra Luana. "Antes de sair, parei para me despedir de minha mãe e parei para falar com ela." Esses poucos minutos fizeram a diferença. Enquanto guiava seu automóvel Clio vermelho 2008, "novinho", pela Régis Bittencourt, Luana olhou para as vigas do Rodoanel. "Vi a ponte entortando e um pó caindo. Logo depois, tudo desabou."

Luana diz que não se lembra muito bem do que aconteceu depois disso. "Tudo ainda está muito confuso", diz a bancária que está tomando três remédios, um deles, calmante. "Só sei que bati em um Celta (o veículo de Carlos Fernando Rangel) e capotei, só não sei quantas vezes", recorda. O carro de Luana ficou de cabeça para baixo e ela conseguiu sair pela janela, engatinhando pelo chão, lotado de cacos de vidro. Os joelhos dela estão machucados dos cortes que sofreu e do impacto da batida.

Por não estar muito ferida, Luana foi deixada de lado pelos policiais que trabalhavam no resgate das vítimas e ligou para o namorado, Thomaz José Angelo Filho, de 26 anos. "Cheguei muito rápido ao local e levei Luana com o meu carro até o Pronto-Socorro Municipal Central de Embu", fala o namorado. Luana não chegou a fazer os curativos no PS. "Não havia condições. O médico não tinha nem luvas para tratar do meu joelho e não havia cadeiras de rodas para todos os que aguardavam."

De lá, Thomaz a levou para o Hospital Professor Edmundo Vasconcelos, no bairro da Vila Clementino, zona sul de São Paulo. Lá, ela usou seu plano de saúde para ser atendida. "Limparam meus ferimentos, fizeram chapa dos meus joelhos e colocaram a proteção no meu pescoço, que está dolorido por causa do capotamento", conta Luana, mostrando ainda a marca do cinto de segurança em seu peito. "Isso porque nunca uso cinto de segurança. Sexta-feira, algo me fez colocá-lo."

Maria Estênia está indignada com a falta de atenção que os policiais do resgate deram à sua filha. "Vou querer indenização, mas estamos vendo ainda como fazer isso", relata a mãe, uma vez que o plano de saúde cobre metade do tratamento e Luana tem de pagar o restante. Já Luana não quer pensar na burocracia de uma indenização. "Ainda não consegui dormir, acredita? Fecho os olhos e vejo o acidente. Agora, só quero respirar, porque tudo foi muito intenso."

O sapateiro José Carlos dos Santos, de 56 anos, estava voltando para a casa em Embu com a mulher, Rosa Helena, de 53, a filha Giovana, de 11, e a neta Nicole, de 7. Ele trabalha em Pinheiros, zona oeste de São Paulo, e mora na região há 20 anos. Num outro carro, logo atrás, vinham o filho Eduardo Alves dos Santos, de 29 anos, e a mulher dele, Luciana Gomes, de 24 anos, os pais de Nicole. Assim, José Carlos que passou pelo viaduto, escutou um barulho. Então, ouviu gritos e o trânsito da pista contrária começou a parar. "Olhei para trás e vi o viaduto no chão", diz Carlos. "Vi uma correria. Gente pedindo extintor, um carro esmagado e um caminhão", conta Rosa Helena.

Passados alguns segundos do choque, o casal se lembrou do filho e da nora. Rosa Helena pegou o celular e ligou para eles. Os dois já tinham chegado em casa. "Por sorte, a minha nora sugeriu que fizessem outro caminho, que fossem pela Estrada do Campo Limpo, que não tem tanto caminhão como o Rodoanel", conta o sapateiro. A mulher respirou aliviada e jurou que nunca mais pegaria aquele trecho do Rodoanel novamente.

em parceria com Valéria França, Paula Pacheco, Etienne Jacintho e Moacir Assunção.

Domingo, 15 de novembro de 2009

20 de nov. de 2009

Comerciantes festejam aumento da venda de vela

APAGÃO

Para donos de mercadinhos e lojas de velas, o apagão teve um efeito ótimo: paulistanos que passaram a noite no escuro correram para comprar velas na manhã de ontem. “Todo mundo chegava aqui dizendo que queria se prevenir para o próximo blecaute”, conta Salim Smaili, dono de uma loja de utilidades domésticas no bairro do Limão. Ele comemorava: somente na parte da manhã vendeu 144 pacotes de velas – 30% a mais do que está acostumado. Dos 13 compartimentos reservados ao produto em suas prateleiras, quatro ficaram vazios.

A uma quadra dali, André Cavalheiro, proprietário de uma loja de velas, também era só alegria. “Só hoje cedo, vendi 15 quilos a mais de velas soltas e 24 pacotes de vela em maço. Ou seja: 20% a mais do que o normal.” E não foi só a clientela que estava desprevenida. Funcionária da loja, Eliane Aparecida da Silva também passou apuros durante o apagão. “Trabalho em uma loja que vende velas e não tinha nenhuma em casa”, diz.

Em um mercadinho do bairro da Casa Verde, a funcionária Teresa Nakamatsu estava espantada com o aumento na procura de velas. “Se tivéssemos ficado abertos na hora do apagão teria havido uma invasão aqui.”

A Associação Paulista de Supermercados não conseguiu dados sobre as vendas de velas “porque se tratava de fato muito recente”.


Quinta-feira, 12 de novembro de 2009