1 de jul. de 2009

''Queremos a igualdade de uso dos espaços''

ENTREVISTA: Sandra Perito: arquiteta, doutora em Arquitetura Inclusiva pela USP
Presidente do Instituto Brasil Acessível acredita que acessibilidade não é 'fazer favor' e pode ser oportunidade de negócio

"A nossa missão é promover a inclusão social no ambiente construído", não se cansa de repetir a arquiteta Sandra Perito, de 48 anos, doutora em Arquitetura Inclusiva pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de São Paulo (USP) e presidente do Instituto Brasil Acessível. Por meio da organização que preside - e graças a uma parceria com o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento da Arquitetura -, ela está à frente da 1ª Jornada Nacional de Arquitetura Inclusiva, que termina hoje no Millenium Centro de Convenções (informações pelo 3887-9496). Na semana passada, Sandra conversou com o Estado sobre o tema.

Qual é a ideia da Jornada?

A gente quer mostrar que a arquitetura inclusiva é uma oportunidade de negócio. Porque a questão da acessibilidade não é fazer favor aos outros, como muitos pensam. Também é rentável. Tem um mercado que não está sendo atendido. Com o envelhecimento da população, então, nem brinca. Estamos diante de uma oportunidade: existe potencial para isso e quem faz assim apresenta-se com um diferencial.

O que é arquitetura inclusiva?

Engana-se quem pensa que é algo apenas para o idoso e para o deficiente. É planejar os espaços para todo mundo, sem categorizar as pessoas. A nossa ideia é que todos os espaços sejam usados por todas as pessoas da mesma maneira, seja ela idosa, criança, mãe com bebê, grávida...

Igualdade, então?

Exatamente. Queremos garantir a igualdade de uso. Nada disso de haver, em um estabelecimento, uma entrada principal cheia de degraus e outra, pelos fundos, acessível aos deficientes. Tem um restaurante aqui perto (no bairro do Campo Belo) que é um absurdo. São cinco degraus para entrar. O acesso para deficientes é uma rampinha que vai direto ao subsolo.

Quem bolou o conceito de arquitetura inclusiva?

Foi um arquiteto americano (Ronald Mace) no começo da década de 90. Ele usava cadeira de rodas e sentia mais que qualquer um, na pele, todos os constrangimentos, dificuldades e até a impossibilidade de usar os espaços. Então criou o conceito de desenho universal: tentar projetar abrangendo o maior número de pessoas. Obviamente que levar isso ao limite seria utópico. Mas quanto mais você abre seu pensamento, mais consegue oferecer essas condições dentro de um espaço projetado.

E de onde veio o seu interesse por essa luta?

Minha preocupação com o tema começou pela família. Três de meus avós morreram com mais de 90 anos e eu percebia as dificuldades que eles tinham para usar a casa onde viveram nos últimos 30, 40 anos de suas vidas. Então pensava: alguma coisa não está certo. Chega uma hora em que a pessoa não consegue mais subir as escadas, começa a improvisar o quarto na sala, o banheiro no lavabo. Passa a viver indignamente porque não consegue usar sua própria casa.

Você chegou a aplicar tais conceitos?

Sim. Em 2003, na reta final de meu doutorado, resolvi construir uma casa para testar a tese. Mede 260 m² e fica em Taubaté, em um condomínio fechado. Provei que é viável, que temos produtos no mercado nacional que atendem a esses critérios. A ideia do conceito é a adaptabilidade, ou seja, planejar para que os ambientes tenham a capacidade de se adaptar às necessidades de quem for usá-los. Eles não são adaptados. São adaptáveis.

Como assim?

Por exemplo: esta casa em Taubaté não tem elevador. Mas há um espaço para que ele seja instalado, caso necessário. Os banheiros não precisam ter as barras de apoio, mas os encanamentos têm de ser pensados para que, em uma eventual instalação dessas barras, não sejam furados acidentalmente.

O instituto nasceu quando?

Fundei em 2004. Após terminar o doutorado, fui incentivada por colegas a montá-lo, a fim de promover a inclusão social pelo ambiente a ser construído, coisa em que ninguém estava trabalhando. A gente tenta melhorar a relação entre as pessoas e o ambiente.


Quarta-feira, 17 de Junho de 2009

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