28 de fev. de 2009

Os últimos dias da Favela da Paz

Barracos na Marginal do Tietê vão dar lugar a uma alça de acesso de um lado e a conjunto habitacional de outro
HABITAÇÃO

A vendedora de acarajés Maria Pereira, uma das moradoras mais antigas da Favela da Paz – ocupação próxima à Ponte Julio de Mesquita Neto, na Marginal do Tietê – já avisou: não pretende sair dali, onde vive há 15 anos, por dinheiro nenhum. “Não quero saber de ‘favela em pé’, não gosto de apartamento”, repete ela, que vive na favela com o marido, cinco filhos, duas noras e um neto em um barraco de pouco menos de 20 metros quadrados.

Mas, se depender dos planos dos governos municipal e estadual, ela terá sim de se mudar. Assim como a vizinha Favela Aldeinha – esvaziada em janeiro, após um processo que levou sete meses –, onde viviam 576 famílias, os cerca de 900 barracos e casebres de alvenaria que existiam na Favela da Paz começaram a ser removidos há seis meses. A primeira etapa, que extinguiu as habitações das áreas de risco, foi concluída no início da semana e hoje não resta quase nenhum dos barracos que vão dar lugar a uma alça que dá acesso à Marginal do Tietê.

De acordo com a Secretaria Municipal da Habitação (Sehab), as famílias retiradas puderam optar por receber R$ 5 mil de verba de apoio habitacional – o popular cheque despejo –, R$ 8 mil para compra de moradia da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) ou auxílio aluguel, no valor de R$ 300 mensais. Das 331 famílias que já saíram dali, 29 escolheram a última opção.

É o caso de Maria Alves da Silva, que há oito anos pegou sua televisão e R$ 550 e trocou por um barraco na Favela da Paz. Seis meses atrás, ela – que trabalha como mascate – e o marido – pedreiro – deixaram o endereço e foram para um apartamento. “Mas não está dando muito certo, não. Acho que vamos ter de voltar a morar em barraco de novo.” Ela argumenta que o dinheiro que eles ganham não é suficiente para as despesas.

Parte da área de 21 mil metros quadrados ocupada pela favela será utilizada para a construção de uma alça de acesso à Marginal do Tietê. No restante, graças a uma parceria com o governo do Estado, a meta é a construção de um conjunto habitacional com 400 unidades, obra cuja licitação deve ser aberta no meio deste ano.

Serão edifícios com cinco andares e infraestrutura sanitária completa. “A expectativa é que os prédios fiquem prontos no ano que vem”, afirma o secretário da Habitação, Elton Santa Fé Zacarias. Cada unidade deve custar R$ 45 mil, mas as prestações serão subsidiadas, conforme padrão do CDHU.

Por enquanto, a torcida entre os remanescentes é para que tudo isso não saia do papel. Basta uma caminhada pelo que restou da favela – entre os escombros dos barracos destruídos – para entender que todos ali querem ficar onde estão. A ideia de viver em um conjunto habitacional, chamado por eles de “favela em pé”, parece algo abominável.

ELES QUEREM “PUXADINHO”
“O morador de uma favela – pobre e, em geral, de família numerosa, com muitos filhos – não gosta de ser transferido para apartamento”, comenta o arquiteto e urbanista Cândido Malta Campos Filho, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP). “O apartamento não possibilita o ‘puxadinho’, nem vertical – lajes que chegam a cinco andares, em alguns casos –, nem horizontal.” Na casa de verdade, a família múltipla da favela não cabe.

Outra questão levantada pelos moradores é o fato de que, em região urbanizada, há taxas que eles não podem pagar, como água e luz. “Se o prefeito vive em um ‘palácio’, por que eu não posso continuar aqui, sem despesas?”, pergunta Maria Pereira, indignada. A Favela da Paz não tem nenhuma estrutura de saneamento básico.

Segundo o secretário da Habitação, é possível que algumas construções sejam preservadas. “As casas melhores, que estão construídas há mais tempo, ainda passarão por um estudo”, admite – a região começou a ser ocupada em 1979. “Mas caso alguém não aceite sair de jeito nenhum e julgarmos necessário, iremos até o limite: a reintegração de posse. Trata-se de área pública.”

VIZINHANÇA
A eliminação da favela traz resultados benéficos à vizinhança. “São construções feias que degradam o entorno”, analisa Cândido Malta. “O problema é que muitos moradores dali acabarão se transferindo para outras favelas.” Toda a operação de remoção da Favela da Paz tem sido acompanhada pela Guarda Civil Metropolitana (GCM), que, até agora, não registrou nenhum incidente.

Enquanto isso, o olhar da ambulante Adelizia Almeida Rocha perde-se no horizonte de entulho, onde antes estavam os barracos de seus vizinhos. Sua casa, de apenas um cômodo, restou isolada. É uma ilha de pobreza em meio à miséria destruída. “Moro sozinha, apenas com Jesus”, frisa ela, que é evangélica. “E, se eu não assinar nada, ninguém pode me tirar daqui.”


Terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

27 de fev. de 2009

O endereço dos alimentos

Diariamente, 10 mil toneladas de produtos, vindos de 1.500 municípios, são comercializados na Ceagesp
SÃO PAULO 455 ANOS

Por fora dos pavilhões, caminhões carregam e descarregam por todo lado – são 10 mil veículos por dia. Por dentro, os boxes cheios de frutas, verduras, legumes, pescados e flores traduzem a variedade em cores e aromas – são 10 mil toneladas de produtos por dia. Entre eles, uma multidão apressada – são 50 mil pessoas por dia –, na maioria frequentadores experientes que já sabem aonde ir, completam a impressão: eis um movimentado labirinto ladeado por tentadoras opções alimentícias.

Esse é o Entreposto Terminal de São Paulo da Ceagesp, a Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo, que ocupa uma área de 700 mil metros quadrados na Vila Leopoldina, bairro da zona oeste paulistana. Ali diariamente chegam alimentos produzidos em 1.500 municípios de 25 Estados brasileiros e de outros 14 países. “É a terceira maior central de abastecimento do mundo”, exalta Cláudio Furquim Leite, presidente da Associação dos Permissionários do Entreposto de São Paulo. “E funciona de um modo bastante interessante: é público, mas é o setor privado que opera e organiza.”

De certa forma, foi o que aconteceu ao longo da história da companhia. Ao mesmo tempo que sua estrutura fez com que muitos produtores e atacadistas crescessem, fornecendo alimentos frescos para a pujança comercial e gastronômica paulistana, esses mesmos empresários – ali chamados de permissionários, por terem permissão para explorar cada um dos 2.700 boxes da Ceagesp – fizeram com que a central adquirisse importância e se organizasse.

É o caso da família Benassi, que se tornou uma das mais bem-sucedidas agroempresas que operam no entreposto. A história empreendedora do clã teve início há três gerações, na década de 40, quando João Benassi, proprietário de um pequeno sítio em Jundiaí, começou a comprar bananas dos produtores vizinhos e a revender na cidade. “Assim ele conseguiu dinheiro para começar a plantar uvas”, conta seu filho Mario, de 62 anos.

O segundo passo foi a abertura de uma barraquinha de frutas às margens da Rodovia Anhanguera, nos anos 1950. Mas os sete filhos de João queriam mais. Em 1952 passaram a comercializar os produtos no Mercado da Cantareira, em São Paulo. E, como a produção própria era sazonal e abrangia apenas três meses por ano, passaram a comprar outras frutas, de agricultores vizinhos, para revender na capital paulista.

Os Benassi são um dos fundadores do pavilhão que ocupam até hoje na Ceagesp, inaugurado em 1966 – ainda se chamava Centro Estadual de Abastecimento (Ceasa). “Mas, um ano antes da abertura, chegamos a trabalhar por um tempo aqui, por causa de uma enchente na Cantareira”, lembra Mario. “Não havia energia elétrica. Passávamos as madrugadas no lampião.”

Hoje a empresa é administrada por um de seus filhos, Eduardo. Em Jundiaí, eles seguem produzindo uvas, mexericas e caquis. E, para revender, compram frutas do mundo todo. “Da pitaia brasileira à cereja americana”, exemplifica Eduardo. A estrutura nem se compara à de quando tudo começou. São 50 funcionários na Ceagesp, 120 em um depósito externo, 30 em um escritório em Jundiaí e mais de mil divulgando e vendendo em lojas e supermercados. “Esse trabalho com os varejistas precisa ser diário.”

A Ceagesp nasceu da fusão em 1969 de duas companhias mantidas pelo governo paulista: o Ceasa e a Companhia de Armazéns Gerais do Estado de São Paulo (Cagesp).


Domingo, 25 de janeiro de 2009

26 de fev. de 2009

Comida para quem tem fome

Nos restaurantes do Bom Prato, uma refeição completa custa apenas R$ 1, mas o Estado subsidia R$ 2,25
SÃO PAULO 455 ANOS

É possível comer bem por R$ 1 em São Paulo. Em qualquer um dos 17 restaurantes Bom Prato da cidade – há outros 13 em todo o Estado, perfazendo um total de 43 mil refeições por dia –, a fila da fome encontra alívio para o estômago.

O chefe de cozinha da unidade Jabaquara, onde comem 1.200 todos os dias, é Joel Pego, de 28 anos. Ele é mineiro, vive em São Paulo há cinco anos, já tinha trabalhado em restaurantes de Belo Horizonte, mas na capital paulista começou lavando pratos. “Aí fui subindo e, desde o ano passado, comando a cozinha”, diz, orgulhoso. “Antes, nunca tinha cozinhado para tanta gente.”

Não é Joel quem define o que vai ser servido no dia. Na véspera, um cardápio formulado pela nutricionista Ariadne Holanda Silva, de 32 anos, chega às suas mãos. “Procuro atentar para a sazonalidade, para conseguirmos bons produtos a preços razoáveis. E, claro, planejo para que a refeição seja balanceada e colorida”, explica ela.

No dia 8, quando a reportagem do Estado almoçou no Bom Prato, foram servidos arroz, feijão, farinha de mandioca, pão, chuchu refogado, salada de alface e isca de carne ao molho oriental. De sobremesa, gelatina. E um copo de suco de manga. Tudo em quantidade caprichada. “O prato tem, em média, 1.600 calorias”, diz a nutricionista. “Partimos do pressuposto de que é a única refeição completa que a pessoa terá no dia.” De 60% a 70% dos frequentadores são clientes fixos.

Dentro da cozinha, a movimentação dos funcionários começa bem cedo. Joel, o chefe, chega por volta das 6h20 – para tanto, precisa sair de sua casa, no Tucuruvi, sempre às 5 horas. No total, são 12 funcionários na equipe: além de Joel e de Ariadne, há ajudantes de cozinha. Até as 10h30, a comida toda tem de estar pronta. E haja comida. Diariamente, são consumidos na unidade Bom Prato Jabaquara 200 quilos de arroz, 80 quilos de feijão, 200 quilos de carne, de 60 a 80 quilos de salada, 1.200 pãezinhos e 240 litros de suco.

Mantido pela Secretaria da Agricultura e Abastecimento do governo do Estado, o programa existe desde 2000. O custo de cada refeição é de R$ 3,25, mas, como o governo subsidia R$ 2,25, o cliente paga apenas R$1.

Há dias em que Joel ainda cozinha quando volta para sua casa, onde vive com a mulher e uma cunhada. “Faço quase as mesmas receitas”, diz. “Mas, é claro, em quantidade bem menor.”

Domingo, 25 de janeiro de 2009

25 de fev. de 2009

Uma cozinha para atender à bicharada

Todos os dias, 4 toneladas de comida alimentam os 3,5 mil animais que vivem no Zoo e no Zoo Safári
SÃO PAULO 455 ANOS

Para alimentar os 3.500 animais de 400 espécies que vivem no Zoo e no Zoo Safári, o Setor de Alimentação Animal da Fundação Parque Zoológico produz, diariamente, quatro toneladas de comida. É um trabalho que começa cedo, por volta das 6 horas. Um esquadrão de 22 “cozinheiros” – chamados oficialmente de preparadores de alimentos – se divide entre as sete bancadas de um galpão no Parque Zoológico. Em cada uma delas, são preparados os alimentos de um tipo de animal: aves, primatas, carnívoros, herbívoros, répteis, além de um setor especial para animais em dieta ou tratamento veterinário e outro exclusivo para os bichos do Zoo Safári.

“Esse departamento não para nunca, nem em fim de semana ou feriado”, lembra o zootecnista Henrique Tavares, o “nutricionista de bichos” que coordena essa gigantesca cozinha. “Afinal, os animais comem todos os dias.”

Mesmo que na natureza bicho nenhum tenha o hábito de cozinhar sua comida, há até um fogão industrial no galpão. “Temos animais, como alguns primatas, que recebem alimento cozido, para facilitar a digestão”, conta o zootecnista. “Não à toa, a expectativa de vida deles no Zoo é maior que na natureza.”

Para suprir o setor, a Fundação lança mão de várias fontes. Boa parte dos alimentos vem de uma fazenda de 574 hectares que a entidade tem em Araçoiaba da Serra, na região de Sorocaba. Lá são cultivados 20 tipos de hortaliças, capim, cana-de-açúcar, milho e frutas como banana e laranja. Carnes de boi, carneiro, porco e frango – além de peixes de cinco espécies – são compradas.

Vizinho à cozinha, há o Biotério, onde se criam pequenos bichos para virar comida. São porquinhos-da-índia, camundongos, esquilos-da-mongólia, pintinhos, codornas, grilos, baratas etc. “Nós os abatemos em uma câmara de gás com CO2, dentro dos princípios bioéticos”, afirma Henrique. “Tentamos amenizar ao máximo o sofrimento dos bichos.” Dentro da câmara, eles levam de três a cinco minutos para morrer. O Zoo só dá alimentos vivos a alguns tipos de cobra, que se negam a pegar os já abatidos.

Na outra ponta dessa estrutura estão os tratadores. Atualmente são 30. Todos os dias eles retiram as porções de comida, separadas e quantificadas, do Setor de Alimentação, e levam até os animais. Cada um se responsabiliza por determinados recintos e acabam até fazendo uma certa amizade com a bicharada.

É o caso de Antonio Ribeiro, de 54 anos, metade deles a serviço das aves do Zoo. “Criei meus três filhos com isso aqui. E agora ajudo a criar minha neta”, conta. Nascido em Águas da Prata, município paulista próximo da divisa com Minas Gerais, ele cresceu na zona rural e sempre gostou de animais. “Quando era criança, tinha um canário-da-terra”, lembra.

Acostumadas, as aves do Zoo o reconhecem. “Pela maneira de me aproximar, elas já sabem que sou eu”, garante. “Tem uma arara que vem na minha mão.” Não era a única. Havia também um tucano mansinho, que fazia a alegria de Antonio. Mas ele morreu no ano passado. “Senti muito, porque eu tinha cuidado dele a vida toda.”

São sentimentos individuais que passam despercebidos por 1,5 milhão de pessoas que visitam o Zoo e o Zoo Safári todos os anos.


Domingo, 25 de janeiro de 2009

24 de fev. de 2009

O caminho da água, dos manancias às torneiras

No processo de tratamento da Sabesp, há até degustadores para analisar o sabor e o odor
SÃO PAULO 455 ANOS

A cada segundo, os paulistanos consomem 65.500 litros de água tratada pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). Por dia, são 5,7 bilhões de litros, o equivalente a 2.300 piscinas olímpicas. Até sair nas torneiras, entretanto, essa água percorre um longo caminho. Que inclui até testes em que profissionais a experimentam para ver se está “ok”.

Desde 1993, a Companhia mantém uma equipe de degustadores de água, para analisar a qualidade da que é consumida na cidade de São Paulo. Atualmente, são 12 degustadores, que, uma vez por semana, analisam o cheiro e o gosto da água tratada nas oito estações que abastecem a cidade. Para integrar o grupo, os funcionários da Sabesp interessados precisam fazer um curso de dois dias e passar por uma “calibragem” de cerca de quatro meses – na qual o novato participa dos testes, mas sua opinião não é levada em conta no resultado final.

Antes de cada degustação, o profissional precisa lavar as mãos com sabonete sem cheiro. Não pode estar usando perfume nem maquiagem. Fumantes estão impossibilitados de participar. “Perguntamos até como está o humor da pessoa naquele dia, porque isso também interfere”, afirma a química Márcia Moribe, encarregada do Laboratório de Orgânica do Departamento de Controle de Qualidade dos Produtos Água e Esgoto, que fica em Santana, onde a análise é feita. “É muito sutil, mas com treino a gente consegue sentir diferença de sabor entre um manancial e outro”, garante a química Sonia Diniz, degustadora há 15 anos. Após a análise, relatórios são encaminhados à estação de tratamento correspondente.

Oito estações abastecem a cidade, conforme a região. A maior, com capacidade de 33 mil litros por segundo, é a Estação de Tratamento de Água do Guaraú, no Sistema Cantareira. Antes de chegar a São Paulo, a água passa por sete represas, interligadas por túneis de 2,5 metros de diâmetro – a primeira, Jaguari-Jacareí, a 120 quilômetros de distância.

Logo que entra na estação, a água recebe uma primeira dosagem de cloro – para auxiliar na retirada de matéria orgânica – e, em seguida, sulfato de alumínio. “Esse produto faz com que as impurezas se aglutinem formando flocos mais pesados”, explica o engenheiro sanitário Hélio Castro, superintendente de Produção de Água da Sabesp.

A água então é direcionada aos floculadores, onde é detida, em média, por 25 minutos. “Dentro deles há pás que giram auxiliando o processo de floculação”, explica Hélio. Em seguida, vem a decantação: na estação da Cantareira, são seis “piscinões”, cada um com capacidade de 30 milhões de litros. “A partícula de água demora 90 minutos nesse processo”, conta. A próxima etapa do tratamento é a filtragem – há 48 filtros ali, feitos com camadas de carvão mineral, areia e pedregulhos. A cada 30 horas, um deles deixa de funcionar por dez minutos, para lavagem. Por último, a água recebe cloro – que combate os micro-organismos – e flúor – para reduzir a incidência de cárie na população. Após esse processo, está pronta para ser distribuída e utilizada.


Domingo, 25 de janeiro de 2009

23 de fev. de 2009

560 mil postes = 300 lâmpadas queimadas por dia

Duas empresas são encarregadas de manter acesas as luzes da cidade
SÃO PAULO 455 ANOS

Trocar uma lâmpada queimada de um dos cerca de 560 mil postes da São Paulo não leva mais que dez minutos. Em toda a cidade, queimam e precisam ser substituídas diariamente 300 lâmpadas. Como também há problemas nos transformadores, chaves, células fotoelétricas e fiação, as empresas fazem um total de mil atendimentos por dia.

O trabalho, sempre realizado à noite, desde 1999 é terceirizado. No início, seis firmas foram contratadas pela Prefeitura para a empreitada. De 2002 para cá, são apenas duas – uma encarregada das zonas sul, oeste e central; outra das zonas norte e leste.

E foi esta última que a reportagem do Estado acompanhou na chuvosa noite da quarta-feira, dia 14. Os cerca de cem funcionários da empresa F. M. Rodrigues envolvidos na operação chegam à sede, na Vila Guilherme, às 19 horas. São divididos em duplas – um eletricista e um motorista, que também pode ser eletricista e ajudar no serviço – e partem para determinada região, a bordo de uma caminhonete F-350, equipada com escadas, 90 lâmpadas, soquetes, quatro rolos de fios, cones de sinalização e ferramentas em geral.

Existe um call center (0800-722- 0156) para centralizar as reclamações de moradores que avisam quando a lâmpada de determinado poste está queimada. Os pedidos, transformados em protocolos de atendimento, são enviados para a empresa responsável pela região três vezes por dia (às 7, 12 e 17 horas).

Um funcionário organiza e entrega para as equipes a tarefa da noite. Cada dupla se encarrega de cerca de 20 – mas eles têm a liberdade de trocar quantas mais aparecerem queimadas pelo caminho, seja entre um atendimento e outro, seja em rondas que acabam fazendo após o cumprimento das solicitadas. “Na verdade, devem fazer isso”, diz o supervisor Moisés Mazali. “Se a lâmpada está apagada, a gente para e vai ver o que é, né?”, resume o motorista-eletricista Ricardo Prada.


Domingo, 25 de janeiro de 2009

22 de fev. de 2009

Livros da Mário de Andrade passam por desinfestação inédita

Brocas e cupins atacavam 31% dos exemplares da biblioteca; iniciativa vai custar R$ 700 mil
PATRIMÔNIO

Há um vilão silencioso e cruel que habita as páginas de 31% dos livros da Biblioteca Mário de Andrade, a segunda maior coleção pública do País e a mais importante de São Paulo. Mas, como em uma história de final feliz, a morte desse vilão é certa. E deve ocorrer no próximo capítulo, quando os heróis empunharão as últimas armas de uma batalha que dura oito anos.

Esse enredo de guerra e morte não está impresso em livro nenhum - sai em tinta e papel pela primeira vez agora, no Estado. O vilão, com seus vorazes arroubos de maldade, não integra nenhuma obra de ficção. São as brocas, insetos semelhantes ao cupim, que se alimentam de papel - e adoram algumas substâncias naturais encontradas na cola utilizada em processos de encadernação até os anos 70. O exército de heróis é formado por três frentes: os funcionários da biblioteca, consultores externos e uma equipe contratada como reforço extra para o derradeiro golpe, desferido a partir desta semana.

Os primeiros vestígios de que o centenário acervo da Mário de Andrade - a biblioteca foi fundada em 1926, mas incorporou a antiga coleção da Câmara Municipal - padecia da infestação desses comilões insetos surgiram no ano 2000. "Eles vieram aqui por um conjunto de fatores. As janelas, por exemplo, ficavam abertas durante o horário de trabalho", reconhece a bibliotecária Rita D'Angelo, diretora da Divisão de Acervo.

Uma solução paliativa foi adotada por um grupo de funcionários da instituição, capitaneado por Marluce dos Santos, chefe da Seção de Restauro e Encadernação. Eles passaram a folhear, página a página, cada um dos 200 mil exemplares da chamada Coleção Geral, que ocupa as estantes do 6º ao 14º andar - felizmente, os cerca de 50 mil títulos raros, melhor acondicionados no 1º, 2º, 3º, 4º e 5º andares, não foram atingidos. Cada bicho encontrado era arrancado do livro com uma pinça. E esmagado.

Nesse trabalho ingrato e quase infinito, Marluce chegou a ter a companhia de outros nove colegas, dos 91 que trabalham na biblioteca. Em 2006, essa operação ganhou ares científicos. Começou-se a contabilizar o número de obras infestadas pela praga. Essas, antes de retornar à estante, foram embaladas em um saco de tecido e receberam uma etiqueta com um "I" (de "infestado"). Os livros imediatamente vizinhos também foram ensacados e rotulados - com um "R" ( "em risco").

Dezoito meses depois, os resultados aterrorizaram qualquer amante das Letras. De acordo com um relatório interno da instituição, há andares em que as brocas foram encontradas em mais de 70% dos volumes. No total, 31% do acervo estava infestado. "Graças ao processo constante de higienização, as brocas não destruíram completamente os livros", ressalta a restauradora Norma Cassares, presidente da Associação Brasileira de Encadernação e Restauro (Aber) e um dos profissionais que prestam consultoria à Mário de Andrade. "Mas desde 2005 eu vinha sugerindo um tratamento mais radical e definitivo."

A solução veio. Ao custo de R$ 700 mil, bancados pela Secretaria Municipal de Cultura. No seguramente maior trabalho de desinfestação já feito em uma biblioteca no Brasil - e, acredita-se, no mundo - uma empresa especializada vai utilizar alta tecnologia para matar os insetos, sumariamente, asfixiados.

E é por isso que, desde o início do ano, o corre-corre no prédio da Mário de Andrade, no comecinho da Rua da Consolação, no centro, tem um objetivo: colocar os 200 mil livros em 4 mil caixas de papelão, de modo sistemático, organizado e cuidadoso. Essas caixas começariam a ser levadas ontem para um galpão em Santo Amaro.

Ali, uma moderna estrutura está sendo montada - e deve começar a funcionar ainda nesta semana - para a execução dos insetos. As caixas serão empilhadas e ficarão dentro de uma bolha plástica que abrangerá uma superfície de 110 m². "É um plástico especial, de 12 camadas", explica o especialista alemão em conservação e restauro Stephan Schäfer, proprietário da empresa, cuja sede fica nos Jardins, e professor da Universidade Nova de Lisboa, em Portugal. Dentro da bolha, nada de produtos tóxicos. Nitrogênio é injetado, "expulsando" o oxigênio. "Durante 30 dias, vamos manter uma concentração de 0,1 a 0,3% de oxigênio", explica Shäfer, que receberá, pelo celular, boletins de meia em meia hora com informações sobre temperatura, umidade e níveis de oxigênio dentro da estrutura.

O processo vai repetir-se outras duas vezes até que todo o acervo da biblioteca seja desinfestado. Aí novamente entrará em ação a equipe de Marluce, para limpar, página a página, os restos mortais dos bichos.

Com a reforma da Mário de Andrade - a previsão é de que a instituição volte a funcionar no fim deste ano - todos os andares do prédio terão sistema de ar condicionado. As janelas ficarão vedadas. "Esperamos que as brocas virem história. E nunca tornem a atacar", torce o bibliotecário William Okubo, um dos protagonistas desta guerra que, parece, está chegando ao final feliz.


Domingo, 15 de Fevereiro de 2009

21 de fev. de 2009

Prefeitos querem ''pulmão verde'' para o Rodoanel

Ideia foi lançada ontem em reunião entre Kassab e prefeitos do ABC
AMBIENTE

Um "pulmão verde" ao longo do Rodoanel Mario Covas. Essa foi a principal ideia lançada e debatida durante encontro ocorrido no início da tarde de ontem entre o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), e os membros do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC - que reúne as sete cidades da região -, na prefeitura de São Caetano do Sul, no ABC paulista.

"Vamos fazer um reflorestamento ao longo de toda a via", afirmou o prefeito de São Paulo. "Haverá um custo elevado, uma vez que precisaremos desapropriar muitas áreas. Mas, para o meio ambiente, sempre há a possibilidade de verbas internacionais."

"É uma ideia de alta complexidade, mas todos queremos aderir", disse o prefeito de São Caetano, José Auricchio Júnior (PTB), presidente do Consórcio. Em breve, o plano deve ser apresentado às outras 31 prefeituras que integram a Região Metropolitana de São Paulo.

Outros pontos levantados durante a reunião - a primeira do consórcio que contou com a participação de Kassab - foram a necessidade de adoção de um bilhete único metropolitano no transporte público, a criação de pontos de coleta e reaproveitamento de entulhos da construção civil e a possibilidade de que as outras cidades também tenham o polêmico programa de inspeção veicular obrigatória.

Por fim, os prefeitos se comprometeram a pressionar o Senado pela aprovação da Proposta de Emenda Constitucional 12, que limita os valores que podem ser bloqueados dos orçamentos municipais para pagamento de precatórios.

Os representantes das sete prefeituras que formam a região do ABC - Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra - elogiaram a participação do prefeito paulistano. "Foi um ato diplomático do Kassab", disse Auricchio. "Acredito que, a partir de agora, sua integração ao grupo seja irreversível." Kassab afirmou que, "dentro das possibilidades", comparecerá a outras reuniões.


Quinta-Feira, 19 de Fevereiro de 2009

20 de fev. de 2009

Parques e museus são opções antissamba

Interior também é alternativa para quem busca sossego no feriado
FOLIA

Com a cidade tranquila - cerca de 1,2 milhão de carros devem deixar a capital durante o feriadão -, o paulistano que não gosta do ziriguidum pode aproveitar para descansar e se divertir. Os 50 parques municipais funcionam normalmente durante os quatro dias de carnaval, exceto o da Luz que, como de costume, fecha apenas segunda-feira para manutenção.

Quem for ao Ibirapuera poderá se divertir no único planetário em funcionamento da cidade. Além de sábado e domingo (15h, 17h e 19h, a R$ 5), como de praxe, haverá seções na terça-feira. Para os que gostam de ler ao ar livre, há o projeto Bosque da Leitura - com livros disponíveis todos os domingos nos Parques do Ibirapuera, do Carmo, do Piqueri e da Luz (neste também aos sábados).

O Zoo e o Zoo Safári (R$ 13, cada), que normalmente não abrem às segundas, funcionarão todos os dias durante o carnaval. Quem preferir passear pelos museus terá de se programar bem: a maioria vai abrir apenas no sábado e no domingo. É o caso do Museu do Ipiranga (R$ 4, grátis neste domingo), do Masp (R$ 15), da Pinacoteca do Estado (R$ 4, grátis aos sábados), do Museu do Futebol (R$ 6) e do Museu da Língua Portuguesa (R$ 4). Neste último acontece uma oficina, gratuita, que ensinará jovens a partir de 13 anos a confeccionar bonecos de carnavais de rua. Já ocorreram aulas no dia 9 e ontem. Haverá outras na sexta e no sábado.

INTERIOR
O interior de São Paulo também oferece diversas opções para quem prefere fugir dos salões, dos desfiles de escolas de samba, do transtorno das estradas que levam ao litoral e do movimento das praias. Com o tempo chuvoso, o Circuito das Águas Paulista aguarda ao menos 100 mil turistas no feriado, de acordo com o diretor de Relações Institucionais do consórcio dos oito municípios do circuito, Carlos Tavares. Segundo ele, a região possui 17 mil leitos em hotéis e pousadas. "Mas há muitas casas e chácaras para alugar. O número de pessoas aumenta muito nos feriados", afirmou. O turista pode utilizar as Rodovias Anhanguera, Bandeirantes, Dom Pedro e Fernão Dias. No site www.circuitodasaguaspaulista.com.br, há informações sobre as cidades.

MARCHINHA E AVENTURA

Para quem quer sair do circuito dos sambódromos, mas busca algo animado, São Luís do Paraitinga (a 171 quilômetros de São Paulo) tem um carnaval diferente. A cidade realiza o festival de marchinhas com blocos organizados pelos moradores. "Tenho amigos que vão há cinco anos para São Luís. Eles adoram. Vou tentar neste ano. Sempre fujo do carnaval, já fiquei em casa de praia, em ilha sem energia elétrica. Agora vou acampar", disse a assessora Ana Carolina Garcia, de 24 anos, que mora em São Paulo.

Os apaixonados por aventura podem conhecer a Pedra do Baú (com ao menos 30 rotas de escalada até o cume), uma das principais atrações da estância climática de São Bento do Sapucaí, município a 164 quilômetros de São Paulo, cravado na Serra da Mantiqueira. Ali não faltam montanhas, cachoeiras, rios e turismo de aventura.

O advogado Roberto Morandini Junior, de 28 anos, já tem a rota para fugir do carnaval: o destino é Vargem, a 97 quilômetros da capital. A chácara que ele chama carinhosamente de rancho é um refúgio às margens da Represa de Jaguari-Jacareí. "A gente pesca, descansa, come, dorme. Volta renovado."

em parceria com Tatiana Fávaro.


Terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

19 de fev. de 2009

Com histórico de vítima, jovem reproduz as agressões no filho

Criança de 1 ano de idade foi encaminhada para abrigo
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Conversar com a paulistana Luzia (nome fictício) é quase impossível. Ela recusa-se a olhar nos olhos e economiza palavras. "Não sei" e "sei lá" saem de sua boca aos montes. Aos 25 anos, Luzia tem quatro filhos - de três pais diferentes - e, há seis meses, mora em um abrigo para vítimas de violência, no bairro do Belém, zona leste, com outras 39 mulheres e 30 crianças.

Dois dias antes de parar lá, após um conflito com a mãe - que terminou com a intervenção de policiais e um boletim de ocorrência -, apanhou o filho mais novo, de 1 ano, e fugiu de casa. Depois de uma noite na rua, foram encaminhados pelo Conselho Tutelar para o abrigo.

O histórico era trágico. Os filhos mais velhos - de 6 e 12 anos - vivem com o pai, na Bahia. Ela se envolveu com outro homem e engravidou de mais um filho, hoje com 3 anos. Luzia apanhava, deixou o companheiro, voltou a viver com a mãe. Em casa, atritos permeavam o relacionamento. Nas discussões, descambavam para agressões físicas. Luzia decidiu abandonar filho e mãe. Foi para um albergue.

Conheceu outro homem - o pai do caçula. Viveu com ele outra tragédia. Apanhava tanto que decidiu voltar a morar com a mãe, que não aceitou a ideia de ter a filha de volta com mais um bebê. Novas brigas resultaram na intervenção policial e numa noite dormida nas ruas de São Paulo.

De acordo com os funcionários do abrigo, quando Luzia chegou - "toda machucada, de tanto que apanhava" - parecia ser amorosa com Pedro (nome fictício). Três meses depois, o menino apareceu com hematomas. "Ela disse que o menino tinha caído, mas os médicos diagnosticaram que isso não poderia ser verdade", diz uma assistente social.

Os funcionários, então, ficaram atentos. Flagraram Luzia agredindo Pedro. "Ela batia com o que estivesse à mão", lembra a assistente. Há um mês, o menino foi encaminhado a um abrigo destinado exclusivamente a crianças.

Luzia fala pouco - e muitas vezes de forma incoerente. Não tem contato com a família. Diz que "é chato" viver no abrigo. "Aqui só como, bebo e durmo", afirma. Deixou claro que não sente falta de nenhum dos filhos. Luzia recebe acompanhamento psicológico para tentar superar os traumas e, quem sabe, um dia reencontrar seu caminho, seus filhos, sua vida.


Terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

18 de fev. de 2009

Uma balsa. Dentro de São Paulo

A embarcação que faz a travessia entre o Grajaú e a Ilha do Bororé leva pedestres, carros, charretes e até ônibus
SÃO PAULO 455 ANOS

Se São Paulo se tornou conhecida pelo caos urbano, pela modernidade e pelo alvoroço constante de seus cidadãos, os arredores da Ilha do Bororé mais se assemelham a uma cidadezinha do interior. Apesar do nome, se trata de uma península incrustada na Represa Billings, zona sul paulistana. Para chegar até lá, o acesso mais fácil é via balsa pela represa, a partir do bairro do Grajaú. A travessia ocorre 24 horas por dia e não custa nada – quem banca é a Empresa Metropolitana de Águas e Energia (Emae), vinculada ao governo estadual.

Em média, todos os dias são transportados pela balsa 1.600 passageiros e 1.900 veículos. A estudante de Direito Mariana Santos Chaves, de 20 anos, passa constantemente por ali. “A vida inteira”, conta ela, que nasceu na região e, filha de artesãos, sempre morou na primeira chácara da Ilha do Bororé, a poucos metros do desembarque da balsa. “O lugar é bonito, mas de difícil acesso”, reclama. “E, nos fins de semana, vem gente de todo tipo. É muita bagunça.”

Mas tem quem goste do movimento turístico da Ilha, cheia de chácaras de descanso e lazer. É o caso dos proprietários dos barzinhos e barraquinhas que funcionam no fim da Avenida Dona Belmira Marin, próximo do embarque para quem chega do Grajaú. “Quando aparece mais gente na Ilha, forma fila aqui para esperar a balsa. Daí a gente acaba vendendo mais”, relata o maranhense Francisco Leite, de 59 anos, que adotou São Paulo e há 11 tem uma vendinha ali. A sua é a “Barraca do Bigode”, a poucos metros do “Bar do Barba”. “Tem umas 30 e tantas barracas”, conta o comerciante, em cujo cardápio constam espetinho de camarão a R$ 2 e de peixe a R$ 1,50.

Os peixes do “Bigode” não vêm da represa. “Compro na feira ou em uma peixaria lá de Santo Amaro”, diz. Já os que o aposentado Vicente Antonio Borba, de 64 anos, come em sua casa são. Ele mora no Jardim Jobá, na zona sul, próximo de Taboão da Serra, e há 20 anos costuma pescar na Billings. Desde 1998, quando se aposentou – era preparador de máquinas de uma empresa –, fez do hobby quase uma obrigação. “Venho todos os dias e fico aqui das 7 às 13 horas. Não saio sem uns seis quilos de tilápias”, garante, com a água na altura das canelas. E prova que não é papo de pescador: mostra para a reportagem o balaio cheio. Para quem toma quatro ônibus e gasta uma hora e meia por dia para chegar à pescaria, o resultado precisa mesmo valer a pena.

A balsa faz cerca de 255 viagens diárias – que levam 5 minutos cada uma. Só para nas madrugadas de quinta-feira, geralmente entre 1 hora e 2h30, quando são realizados serviços rotineiros de manutenção. Trabalham ali nove funcionários, em revezamento. Um é o mestre fluvial Selmo Pereira Couto, de 32 anos, “piloto” da embarcação. “Sempre fui da região. Hoje vivo no Grajaú e meu pai mora na Ilha”, conta. Para conseguir o cargo, ele teve de tirar habilitação na Marinha – fez um curso de uma semana em Santos.

De sua cabine, Selmo apenas “dá a partida” e controla a velocidade, que fica na média dos 10 km/h. O trajeto não tem como errar, pois um cabo de aço em cada uma das extremidades laterais da embarcação, preso uma ponta na Ilha, uma ponta no Grajaú, funciona como trilho.

Nas viagens, a balsa transporta gente a pé, carros – cabem 16 veículos –, charretes, motos, bicicletas e até ônibus. Sim, os motoristas da linha 6L11 Ilha do Bororé–Terminal Grajaú têm o privilégio de descansar, de motores desligados, durante os cinco minutos de travessia da represa.

Domingo, 25 de janeiro de 2009

17 de fev. de 2009

De carne de bode a celular - muitos celulares

Apenas 20% do que vai parar nos Achados e Perdidos da maior rodoviária da América Latina é recuperado
SÃO PAULO 455 ANOS

Quando tinha 7 anos e se mudou com a família para São Paulo, a piauiense Mayara Veraz se impressionou com a primeira coisa que viu por aqui: o Terminal Rodoviário do Tietê, o maior da América Latina, por onde circulam 90 mil pessoas por dia – o equivalente a dez vezes a população da cidade de Holambra. “Nós nos perdemos e levamos um bom tempo para conseguir nos localizar”, lembra.

Doze anos depois, ela é a moça de sorriso bonito que cuida da seção de Achados e Perdidos da gigante rodoviária. Todos os meses, em média 150 objetos e documentos vão para suas mãos. Em dezembro, mês de férias escolares e feriados de final de ano, o aumento do fluxo no terminal fez com que o número de itens perdidos chegasse a 309. E já apareceu de tudo: mão mecânica, geladeira, urna funerária, dentadura, cadeira de rodas. “Até muletas. A rodoviária faz milagres”, brinca.

Os objetos encontrados na rodoviária são entregues no balcão de informações. Se for em horário comercial, a própria Mayara os recebe, cataloga e leva para uma sala onde eles são guardados. Se for à noite, o material é encaminhado a um supervisor, que fica responsável por ele até a manhã seguinte.

É preciso ser observador e detalhista para cadastrar os objetos. Na fichinha de cada um, em vermelho vai o nome da pessoa – se for possível identificar de alguma forma – e em preto, uma minuciosa descrição. Quanto mais informações, melhor. “Tenho de garantir que aquele objeto é da pessoa que veio procurar, para que ninguém queira se aproveitar”, diz Mayara. Ou seja: não é permitido que quem perdeu algo veja o item antes, para que não aconteçam golpes de espertinhos que querem surrupiar algo dos Achados e Perdidos. “No caso de um celular, pergunto até quais contatos estavam na agenda dele, para me certificar de que se trata do verdadeiro dono”, exemplifica. Celulares, malas e documentos estão entre as coisas maisp erdidas no Tietê.

Nem 20% do que vai parar na seção é buscado de volta por quem perdeu. Depois de dois meses, o material não solicitado segue em doação para entidades filantrópicas. Dos que são recuperados, Mayara se lembra de algumas histórias marcantes. “Perto do fim do ano, esqueceram uma caixa de isopor cheia de carne de bode”, conta. “No dia seguinte, a pessoa veio buscar.”

“Teve também um homem que perdeu uma mala cheia de roupas bem chiques. Ele chegou fazendo um escândalo”, relata. “Mas, quando a pegou de volta, ficou tão feliz que elogiou por escrito.” A felicidade, aliás, é uma constante. E, pela importância do material, Mayara se lembra especialmente de uma médica que havia perdido todos os seus certificados. “Ela me agradecia muito, sem parar.”

Tem gente que oferece dinheiro como recompensa? “Acontece sim”, diz. “Mas a gente não pode aceitar.” Para Mayara, que estuda Psicologia, o contato diário com as pessoas e com suas histórias é a maior recompensa.


Domingo, 25 de janeiro de 2009

16 de fev. de 2009

Depois da última estação

Como é o processo de limpeza, dos 117 trens do Metrô paulistano – tem até lava-rápido
SÃO PAULO 455 ANOS

As catracas das 55 estações do Metrô paulistano registram uma média de 3,3 milhões de passageiros por dia – só na Estação Sé, são 750 mil usuários, número maior que a população do município de Osasco. A maioria dessas pessoas não faz a menor ideia da operação-limpeza por que passam os 117 trens da frota da companhia.

Há desde a faxina rápida entre as estações, com os trens em funcionamento, até um complexo serviço realizado nos três pátios da capital – no maior, do Jabaquara, passam por manutenção os veículos das Linhas Azul e Verde; no de Itaquera, ficam os da Linha Vermelha; no do Capão Redondo, os da Lilás. “Nos pátios, ocorre um verdadeiro trabalho de formiguinha”, comenta o engenheiro eletricista Wilmar Fratini, gerente de Operações da Companhia do Metropolitano.

No Jabaquara, ficam 62 trens da frota – cada um roda de 400 a 500 quilômetros por dia. Ali, 160 funcionários são escalados para dar conta da limpeza noturna, que começa por volta das 21 horas e segue até as 4 do dia seguinte. De dez em dez dias, cada veículo passa por uma higienização minuciosa, interna e externamente. “A gente procura sempre pegar os que estão há mais tempo sem limpar”, explica Alzirio Ferreira, controlador de Torre e Tráfego, apontando para uma planilha no computador onde estão listados todos os trens.

O primeiro estágio do processo é o mais impressionante. Devagar, a uma velocidade máxima de 5 km/h, o trem passa três vezes, ida e volta, por uma máquina semelhante a um lava-rápido de carros. Em 20 minutos, está limpo. A engenhoca é econômica: dez litros de detergente e mil litros de água são suficientes para a lavagem de oito trens.

Em seguida, entram em ação as “formiguinhas” propriamente ditas. Os trens ficam estacionados lado a lado e os funcionários são divididos em equipes com três integrantes. Cada uma limpa seis vagões por noite – o equivalente a um trem inteiro. “Primeiro varremos o chão, depois tiramos o pó com o pano. Só então começamos a lavar as paredes e os vidros”, conta Maria Felipe de Sousa, que encara o serviço há 13 anos.

Ao longo do dia, 42 funcionários realizam, em rodízio, faxina nos vagões em movimento. Usam vassouras e pás e, em caso de algum resíduo líquido, papel toalha. “Cada trem é limpo dez vezes por dia”, garante Wilmar.

Quem utiliza o metrô paulistano aprova a higiene. De acordo com pesquisa realizada pela Companhia em 2007, 88% dos usuários consideraram “muito boa” a limpeza.


Domingo, 25 de janeiro de 2009

15 de fev. de 2009

O senhor da hora certa

Augusto Fiorelli tem uma missão: não deixar os relógios da Estação da Luz, da Sé e das Faculdades de Direito e Medicina pararem
SÃO PAULO 455 ANOS

Augusto Fiorelli, de 49 anos, não pode ficar mais do que quatro dias fora de São Paulo. É que depende de suas mãos o funcionamento de 12 relógios espalhados pela cidade – entre eles, o da Estação da Luz, o da Praça da Sé, o da Imprensa Oficial e os das Faculdades de Direito e de Medicina da USP. Na cidade que não para, o relojoeiro Augusto é uma espécie de senhor do tempo.

Dar corda nessas engenhocas antigas e históricas é relativamente simples. Ele gira uma manivela que faz subir dois pesos de ferro maciço – um que serve para que o relógio funcione, outro para que o sino seja tocado. No caso do aparelho da Estação da Luz, o primeiro pesa 80 quilos e o outro, 140. Gradualmente eles vão cedendo, pela força da gravidade, fazendo com que tudo opere. Descem cerca de 2 metros por dia. Além de girar a manivela, a cada visita Augusto aproveita para lubrificar as engrenagens, com óleo de motor, e ajustar o horário. “Sempre dá uma ‘diferencinha’ de uns 10 ou 15 segundos”, conta.

No caso do relógio da Luz, cujos mostradores têm 4,4 metros de diâmetro, é preciso dar corda toda semana – sexta-feira é o dia em que o relojoeiro costuma passar por lá. Outros necessitam de visitas menos esparsas. “Na Faculdade de Direito da USP, no Largo São Francisco, onde está o relógio mais antigo, de 1884, o intervalo não pode ser maior do que quatro dias”, diz. “Antes, me revezava com meu avô. Mas há uns dez anos, quando ele deixou de subir escadas, não tenho férias e não posso ficar muito tempo longe de São Paulo. E, felizmente, nunca fiquei doente.”

Ciente da importância de seu trabalho, ele não reclama. “O importante é o relógio marcar a hora certa. Só assim as pessoas pegam confiança nele”, explica. “É gratificante arrumar um relógio que serve a milhares de paulistanos.”

O avô, seu homônimo, morreu em abril. Foi com ele que Augusto aprendeu o ofício de acertar os ponteiros da cidade. “Comecei ajudando-o com 15 anos. Desde 1975 cuidamos do relógio da Estação da Luz”, lembra. É o que necessita de mais esforços, aliás. “Aqui em cima mesmo, não fico mais que 15 minutos a cada vez. O que cansa são as escadarias: 145 degraus.” Sendo que os dois últimos lances são de apertadas escadas de marinheiro.

Nascido no bairro do Ipiranga, Augusto se mudou para a Freguesia do Ó depois que se casou, há 20 anos. Sua relojoaria fica no centro, pertinho da Praça da Sé. Em 1983, ele se formou em Economia na Fundação Armando Álvares Penteado. “Mas já era relojoeiro e nunca deixei de sê-lo”, afirma. Pai de três filhos, torce para que um deles siga a profissão. “A menina mais velha, de 20 anos, está fazendo Ciências da Computação na USP. Aí tem um casal de gêmeos com 15 anos. Já comecei a ensinar o menino a cuidar dos relógios”, conta. “Mesmo que ele queira ter outra profissão, pode pegar um ou dois relógios para dar corda, como hobby.” Augusto lembra que, como são itens históricos de São Paulo, sempre será necessário o trabalho – remunerado, como o dele – de um relojoeiro para dar corda e fazer a manutenção nessas antiguidades.

Seu maior pesadelo é se esquecer de dar corda em algum dos 12 relógios que mantém. “Mas não uso agenda, tenho tudo na cabeça”, garante. “Uma vez, há uns dois anos, cheguei em casa com a sensação de que tinha pulado um. Aí me lembrei que era o da Faculdade de Medicina. Fui lá à noite e dei corda.” Ele tem passe livre nessas instituições.

Para Augusto, dia de correria é quando começa ou termina o horário de verão. “Tenho de acertar todos os relógios. Como sempre cai em um domingo, saio cedinho de casa.” Em poucas horas, o paulistano já tem, à disposição, os grandes relojões como referência para acertar o seu.


Domingo, 25 de janeiro de 2009

14 de fev. de 2009

Antes da missa da Sé, o corre-corre do sacristão

Responsáveis por portas, gavetas e mais de 200 chaves, sacristãos abrem e fecham a Sé e são sempre os últimos a sair
SÃO PAULO 455 ANOS

A Vila de São Paulo de Piratininga nasceu da criação de um colégio jesuíta, em 25 de janeiro de 1554. Para marcar o acontecimento, os padres Manuel da Nóbrega e José de Anchieta rezaram no pátio desse colégio uma missa em honra a São Paulo – na data, os católicos comemoram a conversão do santo. Pertinho dali, na Catedral da Sé, a tradição é mantida – às 10 horas de hoje o núncio apostólico d. Lorenzo Baldisseri, bispo italiano que representa o papa no Brasil, celebra uma missa especial, acompanhado pelo cardeal arcebispo de São Paulo, d. Odilo Pedro Scherer.

Na sacristia, a movimentação se inicia quase uma hora antes. A sisudez e o silêncio daquele espaço, cujas três portas dão acesso ao altar, aos escritórios dos religiosos e à secretaria da igreja, começam a ser quebrados pelos preparativos de uma missa. Um dos dois sacristãos se encarrega de deixar as vestes litúrgicas à disposição dos sacerdotes – nas cores branca, verde, vermelha, roxa ou rosa, conforme a ocasião religiosa – e preparar todos os objetos que serão utilizados durante a cerimônia.

No domingo passado, quando o Estado acompanhou o processo, quem estava trabalhando era o paraibano Vandílson Nascimento, de 30 anos, há 11 em São Paulo. Antes de ganhar a vida como sacristão, foi vigia noturno da própria igreja. Hoje sabe, orgulhoso, tintim por tintim sobre a organização da missa. Conhece como poucos o conteúdo das 32 portas e 31 gavetas do armário principal da sacristia e dos outros dois, que se assemelham a guarda-roupas, um com cinco portas, outro com seis. Toda a mobília, solene, é de jacarandá. Ah, sim, há ainda uma mesinha de apoio com uma gaveta e uma mesa maior, com quatro cadeiras.

Não é só da sacristia que Vandílson cuida. Ele divide com seu colega, o outro sacristão, a responsabilidade de manter organizada e funcional toda a igreja. Quantas chaves têm aí no seu bolso? “Ixi, não sei, não”, responde. “Mais de 40, com certeza. E, no quadro lá no fundo, são outras 200.”

Enquanto os religiosos vestem os paramentos e se preparam para a missa – sempre interrompidos por um ou outro leigo que quer combinar se o salmo será cantado ou rezado, quais serão os avisos ao fim da cerimônia e outras coisas do tipo –, Vandílson não para. Precisa deixar à mão os dois livros utilizados pelo celebrante, o Missal e o Evangeliário, e o sino que será tocado na hora da consagração da Eucaristia.

Depois, corre para o armário onde está guardado o vinho do tipo canônico – marca João Paulo II, em homenagem ao papa que precedeu o atual – e enche a galheta que será levada ao altar. Em seguida, acende o incenso. Corre para cá, corre para lá, fica atento a todos os detalhes para que nada falte.

Quando a procissão de entrada se encaminha para o altar, Vandílson respira aliviado e resta sozinho na sacristia. De prontidão, caso haja algum imprevisto. É católico? “Sim, mas não tomo comunhão quando estou trabalhando, né?”, diz ele, que admite ir só de vez em quando à igreja como frequentador. Mas, assim, trabalhando, ele acompanha três missas todos os domingos – e duas por dia ao longo da semana. “O sacristão é o último a sair”, explica. “Tenho de abrir e fechar a igreja.”


Domingo, 25 de janeiro de 2009

13 de fev. de 2009

A metrópole desvendada

Um passeio pelos bastidores dos serviços e das estruturas que fazem a São Paulo de 455 anos funcionar
SÃO PAULO 455 ANOS

Do homem que dá corda no relógio da Estação da Luz à moça que cuida da seção de Achados e Perdidos da maior rodoviária da América Latina. Da Cantareira à Ilha do Bororé. Dos degustadores de água da Sabesp aos faxineiros do Metrô. São Paulo é infinita. E, como toda grande cidade do mundo, esconde segredos em seus bastidores: pessoas, serviços e estruturas que fazem a metrópole funcionar.

Nos últimos 15 dias, o Estado percorreu esses cantos pouco conhecidos de São Paulo para revelar aos leitores os rostos, as histórias e as curiosidades da cidade que hoje completa 455 anos. O resultado está neste caderno, que traz cenas bonitas, surpreendentes e inusitadas – como charretes e ônibus em uma balsa.

Durante a apuração das reportagens, as descobertas foram da abundância de alimentos na Ceagesp – 10 mil toneladas por dia – à fome de quem tem pouco e faz fila no Bom Prato, onde a refeição custa R$ 1. É, aliás, nos contrastes da cidade aniversariante que está a sua maior beleza. Que não é natural. Mas construída, dia após dia, por seus 11 milhões de habitantes, paulistanos de nascimento ou por adoção, que moram, trabalham, se divertem e vivem – principalmente vivem – nesta gigante metrópole. São Paulo consegue ser tantas em uma só.

Domingo, 25 de janeiro de 2009

12 de fev. de 2009

Pilotos de F-1 testam trânsito de SP

PALAVRA DE ESPECIALISTA
A pedido do ‘Estado’, eles opinaram sobre os congestionamentos que infernizam os paulistanos – e reclamaram

Asfalto ruim, excesso de carros, motoristas alcoolizados e transporte público ineficiente. Ouvidos pelo Estado, cinco pilotos de Fórmula 1 elencaram esses como os principais problemas do trânsito paulistano. São, ao que parece, um desafio até maior para eles do que enfrentar as 71 voltas do GP Brasil, hoje, às 15 horas, em Interlagos.

Favorito ao título, o inglês Lewis Hamilton diz que as ruas da capital estão entre as mais congestionadas que ele já viu. Na quinta, dirigiu pela segunda vez na cidade, em evento promovido por um de seus patrocinadores. Sobre sua “pilotagem” pelas ruas, ele lembrou que foram apenas “curtas distâncias”. E aproveitou para soltar um bem-humorado comentário, uma vez que em seu país, a Inglaterra, mão e contramão são invertidas. “Como sou inglês, preciso sempre prestar atenção nos dois lados das ruas.”

Com chances matemáticas de levar o título, o brasileiro Felipe Massa conhece bem as agruras do nosso trânsito. Paulistano do Itaim-Bibi, ele passa parte do ano em seu apartamento de 628 metros quadrados, no Morumbi. Não é só nas pistas que põe as mãos no volante.

Sempre que está em São Paulo, Massa costuma sair de carro – tem um Fiat Linea e uma Maserati. Freqüenta bons restaurantes como o Gero, nos Jardins, e o circuito gastronômico da Rua Amauri. Corre no Parque do Ibirapuera e é visto em cinemas. “Não há ninguém que goste dos congestionamentos”, diz. “O negócio é ligar o rádio e curtir, porque não tem o que fazer.”

E qual a dica que ele dá às autoridades para melhorar o trânsito paulistano? “Investir na ampliação do metrô, aumentar a área para circulação de veículos – se possível – e melhorar a qualidade do asfalto”, enumera. “Muitas vezes o trânsito fica complicado por causa do conserto de buracos nas ruas.”

Prestes a sentir o gostinho de correr um GP Brasil pela primeira vez, o brasileiro Nelsinho Piquet diz que raramente dirige seu Renault Mégane Grand Tour pelas ruas paulistanas. “Como tenho muitos amigos na cidade, é comum que eu ande de carona”, conta o filho do tricampeão mundial Nelson Piquet, que nasceu na cidade alemã de Heidelberg e passou a infância em Brasília.

Mesmo preferindo o banco do passageiro, o piloto reconhece que o trânsito paulistano é complicado. “Por isso, costumo organizar meus compromissos contando com o contrafluxo dos carros”, conta. Ele lembra que este é um problema comum a várias grandes cidades do mundo. “Equilibrar os dois, os carros e o transporte público, de forma inteligente, talvez seja a solução.”

O finlandês Heikki Kovalainen admite que nunca dirigiu pelas ruas de São Paulo. Ele acredita que problemas de trânsito intenso não são causados apenas pelo volume de carros nas ruas. “É a maneira como as pessoas dirigem: rapidamente, sem prestar atenção e após beber”, diz.

O brasileiro Rubens Barrichello, nascido e criado na região de Interlagos, diz que quando está em São Paulo gosta de dirigir – tem um Honda CRV. “Não vejo nenhuma atitude a curto prazo para melhorar a situação”, afirma, sobre as queixas. “Só se diminuíssemos o número de carros em circulação.”



Domingo, 2 de novembro de 2008

11 de fev. de 2009

Temporal causa morte e faz teto de shopping desabar em SP

Uma pessoa morreu ao ser levada no meio da rua por uma enxurrada na zona sul; zona oeste alagou
CLIMA

O temporal que atingiu São Paulo no fim da tarde do sábado deixou pelo menos um morto e causou tumulto em dois dos principais shoppings paulistanos, com direito a saque. De acordo com o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), em Americanópolis, na zona sul, uma pessoa ainda não identificada morreu ao ser levada no meio da rua por uma enxurrada.

Foram registrados 55 pontos de alagamento em toda a cidade. O Centro de Gerenciamento de Emergências (CGE) declarou estado de atenção em todas as regiões da capital entre 18 e 22 horas. O Aeroporto de Congonhas chegou a ficar fechado por 15 minutos no final da tarde.

Os frequentadores do Shopping Interlagos, na zona sul, viveram momentos de pânico por volta das 18h30. Um corredor do shopping precisou ser interditado - 49 lojas e quiosques fecharam suas portas mais cedo - após a queda de parte do teto de gesso em frente à loja de roupas C&A e um vazamento que inundou outras lojas próximas.

De acordo com a Polícia Militar, o problema atingiu pelo menos duas: a de roupas Khelf e a de sapatos Dunne’s. "Parecia cachoeira. Era água de todo lado. As luzes se apagaram", conta a vendedora da Khelf Maria Márcia Santana. "Achei que fosse desabar tudo." Leonardo Júnior da Silva Carvalho, funcionário da mesma loja, confirma. "Não chegou a cair parte do teto, mas não sabemos de onde caiu tanta água."

Na Khelf, a água escorria do teto com tanta força que estourou a iluminação e deixou o estabelecimento no escuro e totalmente alagado. Entre funcionários e clientes, havia cerca de 30 pessoas na loja neste momento. O pânico foi geral. Os funcionários contam que todos que estavam no estabelecimento correram assustados.

O Corpo de Bombeiros foi acionado, mas não registrou nenhuma vítima. A polícia informou que alguns frequentadores do shopping se aproveitaram da confusão para saquear as lojas, obrigando a administração a interditar o setor.

O gerente de um quiosque do McDonald’s que fica na área fechada afirma que os clientes saíram correndo quando começou o barulho. "Ninguém sabia se era assalto ou tiro", diz. "Os que estavam aqui queriam sair. E quem não sabia, queria entrar para ver o que era."

Por meio da Assessoria de Imprensa, o shopping negou o ocorrido nas lojas Khelf e Dune’s, restringindo o problema apenas à parte do teto na frente da C&A. A empresa também nega que tenha havido saques em lojas.

ZONA OESTE
O Shopping Bourbon, na Pompeia, ficou alagado, assim como muitas ruas do Sumaré e da Vila Madalena. Muitos perderam os carros, que foram levados pela enxurrada que tomou conta da Rua Turiaçu.

O clássico entre Corinthians e Portuguesa, no Estádio do Pacaembu, precisou ser adiado. Durante o temporal, o número de chamados foi tão grande que os bombeiros encontraram dificuldades para atender toda a cidade.

em parceria com Laís Catassini e Luiza Alcalde.


Domingo, 8 de fevereiro de 2009

10 de fev. de 2009

CGE prevê temporais em SP com três dias de antecedência

Central conta com 22 estações de monitoramento
CLIMA


É em uma sala na Rua Bela Cintra, ao lado da central da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), que funciona o Centro de Gerenciamento de Emergências (CGE) da cidade. Ali trabalham um meteorologista e um técnico em meteorologia, dois engenheiros civis, um técnico de informática e três assessores de imprensa. "Monitoramos constantemente as condições climáticas de São Paulo. Três dias antes de uma chuva forte, as autoridades já são informadas e podem se planejar para evitar o pior", garante o meteorologista Michael Rossini Pantera - que, pelo sobrenome, é chamado por seus colegas de "o fera do CGE".

As informações recebidas pelo órgão - e interpretadas pelos especialistas - chegam constantemente de várias fontes. Graças a um convênio com a Prefeitura, a empresa Somar Meteorologia encarrega-se de muni-los com dados meteorológicos. Além disso, 22 estações computadorizadas espalhadas pelo Município enviam informações sobre temperatura, umidade, pressão atmosférica, velocidade e direção do vento e volume de chuvas. Em caso de tempestade, pontos de alagamento são mapeados com a ajuda dos marronzinhos da CET. "Na cidade toda, há 500 pontos onde há possibilidade de alagamento", comenta o meteorologista.

Diariamente, com chuva ou sol, boletins com as condições climáticas da capital são enviados para autoridades, pelos assessores de imprensa. "A CET, as subprefeituras e a Defesa Civil, por exemplo, precisam ser constantemente informadas", conta uma das jornalistas que trabalham ali, Cíntia Luz. Ela faz boletins para a imprensa em geral. Mas a população também pode se informar diretamente pelo site www.cgesp.com.br.

De acordo com a classificação do órgão, há quatro estados em que a cidade pode se encontrar. O "de observação" é o normal. Se há chuva com potencial de alagamento, como ocorreu anteontem à tarde - e repetiu-se ontem -, o estado é "de atenção". Quando rios transbordam, o CGE declara "estado de alerta". Por último, há o "estado de alerta máximo", que seria "uma calamidade pública", diz o meteorologista Pantera. "Felizmente, isso nunca aconteceu por aqui."


Segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

9 de fev. de 2009

Com festas, comida e pedidos, capital celebra Iemanjá

Casas paulistanas de circuitos boêmios comemoram orixá na próxima segunda-feira
SOCIEDADE

De olho em um ponto da Vila Madalena, conhecido bairro boêmio de São Paulo, o então gerente de Bar Joaquim Alvares arrumou as malas e foi para Maresias, no litoral norte, em dezembro de 2007. “Levei uma garrafa com um pedido para Iemanjá”, conta. “Uma semana depois, apareceu um investidor para meu projeto.” Então ele comprou o local, onde funcionava uma padaria e transformou em seu próprio bar.

Na próxima segunda-feira, dia 2, ele e seus três sócios comemoram o dia da “rainha do mar” com uma festa no boteco, batizado de Bar Iemanjá. Inaugurado em outubro, após oito meses de obras, o boteco soma-se aos tantos que existem no agitado bairro paulistano. “Não costumamos abrir às segundas, mas será uma ocasião especial”, diz outro dos sócios, Marcelo Lewandowski.

Os frequentadores da casa poderão comemorar o dia de Iemanjá com duas bandas e um DJ. “Todo mundo terá de vestir camisa branca”, estipula Joaquim, conhecido pelo apelido de Kim. “Também gostaríamos que as pessoas trouxessem rosas brancas para homenagearmos a orixá.” No que depender do entusiasmo de Kim, a festa passará a ser uma tradição do boteco.

Desde que foi aberto, o bar tem em sua decoração um barco onde as pessoas podem colocar seus pedidos para a divindade. Já são mais de mil papeizinhos. “No domingo de manhã levarei o barco para Maresias”, promete Kim, em tom de agradecimento. “Vou colocar os pedidos no mar na segunda-feira. Filmarei tudo e, à noite, mostraremos o vídeo no bar.”

Nascido em São Paulo, Kim jura por todos os orixás que sua devoção à “rainha do mar” não é questão de marketing para promover o seu estabelecimento comercial. “Sei que nome de santo pega em bar”, admite. “Mas morei em Maresias por dez anos. Depois vivi um tempo em um veleiro, percorrendo todo o Caribe. Sempre fui ligado em Iemanjá. Meu contato com ela é cada vez maior.”

A “SANTA”
Iemanjá é um orixá africano. Seu nome é originário da expressão iorubá “yèyé omo ejá” – que significa “mãe cujos filhos são peixes”. No Brasil, seu culto foi trazido durante o período da escravidão. É uma orixá muito popular entre os seguidores de religiões afro-brasileiras.

A maior festa em sua homenagem ocorre em Salvador, capital baiana. Todos os anos, em 2 de fevereiro, milhares de pessoas vestidas de branco se dirigem à foz do Rio Vermelho, onde depositam pedidos e oferendas: espelhos, comidas, perfumes, bijuterias.

Comemorações à Iemanjá também são comuns durante o réveillon em cidades litorâneas. As oferendas costumam ser depositadas no mar, tanto por devotos quanto por turistas que “entram na brincadeira”. “Quando era surfista, tinha o hábito de pedir onda para Iemanjá”, lembra. “Agora só quero harmonia. E que o bar dê certo”, diz Kim.

Graças ao sincretismo religioso no Brasil, no mesmo dia também se comemora a santa católica Nossa Senhora dos Navegantes. Em algumas cidades, religiosos organizam grandes procissões fluviais para celebrar a santa.

FESTIVAL GASTRONÔMICO
O Bar Iemanjá não é o único lugar paulistano em que a orixá é reverenciada. No restaurante Obá, nos Jardins, a divindade africana está sendo celebrada, pelo quarto ano consecutivo, com festival gastronômico. “Iemanjá nos protege e a casa bomba”, comemora o restauranteur Hugo Delgado.

Até a próxima segunda, os clientes encontram no menu 18 pratos feitos com peixes e frutos do mar. Tem casquinha de siri com farofa (R$ 15), salada de polvo grelhado com abacaxi, hortelã e ervas frescas (R$ 34), moqueca capixaba de peixe, com arroz, farinha e pirão (R$ 45) e lagosta ao molho de tomate (R$ 69), entre outros.

“Em todas as mesas colocamos envelopinhos para que as pessoas façam seus pedidos à Iemanjá”, conta Delgado. “Depois levamos tudo para a praia.” De acordo com ele, 85% dos frequentadores topam participar e deixam seus recados à divindade. “No ano passado, foram mais de 800 envelopes.”

Serviço:
Bar Iemanjá: Rua Mourato Coelho, 1325, Vila Madalena, (0xx11) 3032-6881
Obá Restaurante: Rua Doutor Melo Alves, 205, Jardim Paulista, (0xx11)
3086-4774


Quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

8 de fev. de 2009

Incêndio atinge igreja histórica

Parte de templo católico do Paiçandu, sem alvará de funcionamento, pegou fogo na madrugada de ontem
PATRIMÔNIO

Um princípio de incêndio atingiu, na madrugada de ontem, uma sala externa da Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, no Largo do Paiçandu, no centro de São Paulo. Testemunhas tentaram apagar o fogo com baldes de água. Por volta das 2h30, uma viatura do Corpo de Bombeiros chegou ao local e, em minutos, extinguiu as chamas.

De acordo com a auxiliar administrativa da igreja, Gláucia Dias, a sala – que havia sido utilizada para manter velas acesas – estava interditada havia uma semana. “Passamos o velário para uma área mais central, porque ali os fiéis reclamavam que apareciam muitos marginais”, explica. Desde então, o espaço funcionava como depósito de parafina usada – havia cinco sacos com o resíduo. “A estrutura da igreja não foi abalada”, afirma Gláucia. “Cedeu o telhado do quartinho, apenas, e as fiações foram queimadas.”

Segundo a Secretaria de Coordenação das Subprefeituras, a paróquia estava sem alvará de funcionamento. No final da tarde de ontem, fiscais foram até o prédio – que pode ser fechado, se não apresentar a documentação nos próximos dias.

Durante o incêndio não havia ninguém no templo, cujo funcionamento não foi prejudicado – abriu normalmente às 7h. A administração da igreja afirmou que irá pedir investigações para apurar se o incêndio foi criminoso. O pároco, padre Lázaro Mendes, não quis comentar o caso.

Tombada pelo Conselho Municipal do Patrimônio (Conpresp) em 1992, a Igreja dos Homens Pretos foi construída entre 1904 e 1906 por trabalhadores negros. Seu nome alude à irmandade homônima, criada no início do século 18 por escravos e negros alforriados. Por ser mantida por uma irmandade, não tem vínculo patrimonial com a Arquidiocese de São Paulo – que, entretanto, presta assistência espiritual à comunidade. O cardeal arcebispo, d. Odilo Pedro Scherer, foi ao local no início da tarde de ontem.

A primeira capela fundada pela irmandade foi inaugurada em 1737, perto do Vale do Anhangabaú. O local se tornou um ponto de encontro na luta abolicionista. No final do século 19, a Prefeitura desapropriou a área. A irmandade foi transferida, em caráter provisório, para o Largo da Sé. Como indenização, recebeu dinheiro e um terreno no Largo do Paiçandu. Ali foi erguida a nova igreja, inaugurada em 1906.


Quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

7 de fev. de 2009

O fotógrafo da São Paulo distorcida

Angelo Pastorello quer revelar a cidade com sua câmera rudimentar
PAULISTÂNIA

Funciona como uma metáfora da cidade, esta gigante metrópole de tantas distorções. Munido de uma câmera pinhole - uma caixa escura, sem lente nem visor, apenas com um orifício -, o fotógrafo Angelo Pastorello decidiu, em outubro, fazer um ensaio do Mercado Municipal. "São imagens que não têm um enquadramento lógico", observa. "Para dizer a verdade, nem consigo saber direito o que estou fotografando." O inusitado produto dessa experiência acaba de sair em livro, integrando o recém-lançado Imagens de São Paulo, Vol. 02 (Editora Décor, 268 páginas, R$ 185).

A julgar pelos seus planos, Pastorello tomou gosto pela primitiva engenhoca de fotografar. "Quero juntar alguns pontos da cidade que eu acho bacanas e preparar um livro ou uma exposição só com pinhole", adianta. Ainda no ano passado, realizou o trabalho no Aeroporto de Congonhas. "É um lugar que me atrai afetivamente", diz. "Foi ali que vi um avião pela primeira vez, quando era criança." O próximo local a ganhar um ensaio distorcido já está escolhido: a Estação da Luz. Em janeiro, ele fez alguns estudos, com uma câmera digital convencional, explorando as possibilidades do espaço.

Paulistano de Santa Cecília - criado nas Perdizes, bairro onde ainda vive -, Pastorello adquiriu o gosto da fotografia ainda adolescente. "Quando eu tinha 14 anos, houve um curso de fotografia no colégio (o Rainha da Paz, no Alto de Pinheiros)", lembra ele, hoje com 49 anos. "Eu me fascinei pelo laboratório, pela revelação, pelas possibilidades químicas." Quando completou 15 anos, ganhou do pai um minilaboratório para poder revelar e ampliar suas próprias fotos. "Eu montava no banheiro", conta.

Aos 18, trabalhou como laboratorista na Fujifilm, no setor de ampliação. Depois virou assistente de um estúdio que fazia fotos de arquitetura e decoração. "Eu queria estudar Cinema, mas, como tentei duas vezes e não passei no vestibular da USP, resolvi trabalhar nesse estúdio", comenta. Aos 22, começou a fazer fotos, como freelancer, para revistas como Vogue e Casa Claudia.

E é em meio a esse trabalho editorial - até hoje colabora com diversas publicações, de Época a Capricho, de Playboy a Sexy - e a fotos publicitárias - já fez campanhas para a TAM, a TIM, a Microsoft etc. - que ele se dedica a trabalhos mais autorais. "Eu normalmente uso meu tempo livre para fotografar", conta. "Outro dia, peguei a câmera e fui até o Parque da Luz à tarde. Gosto de ficar pensando em construir a imagem."

São dessas produções artísticas que surgem as exposições - já participou de 15, entre coletivas e individuais - e os livros. Além do Imagens de São Paulo, Pastorello participa do The Art Book Brasil - Fotografia em Preto e Branco (Editora Décor, 268 páginas, R$ 185). "Estou negociando outro livro, possivelmente com fotos de nu."

Há dois anos, Pastorello é um dos professores da escola de fotografia Fullframe, em Pinheiros. Recentemente decidiu ensinar também adolescentes - e de forma voluntária. A partir de março vai promover, por meio do projeto Cidade Escola Aprendiz, uma série de oficinas voltada a alunos da Escola Estadual Carlos Maximiliano Pereira dos Santos, na Vila Madalena. "Consegui uma doação de 12 câmeras simples, analógicas, bem comuns. Vou monitorar grupos de alunos que serão estimulados a fotografar o intervalo das aulas", explica. "A ideia é usar o olhar do adolescente, empiricamente. Em um segundo momento, pretendemos expandir para um projeto que ensine noções de fotografia aos participantes."

Quando dá uma pausa nas câmeras fotográficas - atualmente ele possui seis -, Pastorello se divide entre quatro paixões: cinema, futebol, música e bons restaurantes, especialmente de comida italiana, que ele costuma frequentar com a namorada. De música, é quase profissional. Entre 1984 e 2006, tocou contrabaixo e violão na banda de rock progressivo psicodélico Violeta de Outono - dos sete discos lançados, ele só não participou do último, de 2007. "Saí porque estava difícil de conciliar o tempo", explica ele, que assina duas composições da banda: Faces e Trópico.

Palmeirense, confessa que não vai ao Palestra Itália há cerca de três anos. "Mas acompanho tudo pela televisão, inclusive os programas de debate", afirma. Nunca fotografou futebol, entretanto. E tem vontade? "Imagina só levar a pinhole ao estádio e fotografar de dentro do gol do Marcos (goleiro do Palmeiras)", se empolga. "Eu adoraria. Desde que ele não tome nenhum gol, é claro."


Domingo, 1º de fevereiro de 2009

6 de fev. de 2009

Como é mesmo o nome dessa rua?

Grafias diferentes nas placas indicativas de vias de SP confundem paulistanos; Emurb pretende padronizá-las
URBANISMO

Rua Pirajuçara ou Pirajussara? Loefgreen ou Loefgren? Édison ou Edson? Atire o primeiro dicionário quem nunca titubeou ao ver tais nomes de ruas paulistanas. Problema mesmo é quando essas dúvidas chegam aos órgãos que deveriam saná-las – os responsáveis pelo emplacamento indicativo dos nomes de logradouros públicos.

Pois há esquinas em São Paulo onde podem ser observadas duas grafias diferentes para a mesma rua. Uma nas novas e bonitinhas placas colocadas pela Empresa Municipal de Urbanização, a Emurb (36 mil, no total); outra, naquelas placas maiores, instaladas pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) geralmente nos semáforos, nos cruzamentos das ruas mais movimentadas (quase 4 mil).

Dissemos duas grafias diferentes? Perdão, caro leitor. Há casos em que uma terceira forma aparece (como em Loefgrem, na foto desta página) naquelas inutilizadas e quase extintas placas que, antigamente, eram afixadas na parede externa das casas de esquina.

De acordo com o historiador Maurílio José Ribeiro, da Seção de Logradouros do Arquivo Histórico Municipal, o que determina a forma correta do nome de uma rua é o documento da época de sua denominação. “Entendemos que o certo é o que está no Diário Oficial”, argumenta. “Para corrigir, é preciso uma nova publicação.” Parece simples, mas não é bem assim. Nos anos 1940, por exemplo, uma norma determinou que fossem aportuguesados os nomes que utilizassem K, Y ou W. “Uma medida nacionalista”, acredita o historiador. Por esse motivo, a Rua Wanderlei, que cruza com a Avenida Sumaré, virou Vanderlei. Mesmo assim, a placa da CET fixada no citado cruzamento ainda traz a grafia antiga (mesmo a CET não sendo daqueeeele tempo!).

Palavras originárias de línguas indígenas, como o tupi, costumam dar mais confusão ainda. “Apesar de a regra determinar que se use cedilha, há publicações, como no caso da Rua Turiassu, que determinam os dois esses”, diz Ribeiro.

Para tentar evitar tais desencontros, a Emurb pretende estrear ainda neste ano um serviço inédito de revisão das placas de São Paulo. Sobre motos, 30 funcionários deverão percorrer diariamente as ruas da cidade munidos de um computador de mão. Graças a um programinha desenvolvido em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), eles farão fotos e coletarão informações de cada uma das plaquinhas. “Além de checar os problemas de grafia, também vão verificar se houve depredações ou má conservação”, diz Luís Eduardo Brettas, gerente de Projetos Urbanos da companhia.

Será um jeito de diminuir o incômodo que muitos paulistanos sentem ao ver nomes de ruas grafados inadequadamente. Como o próprio historiador Ribeiro, aliás. “Por trabalhar com isso, criei o hábito de ficar observando atentamente cada placa”, diz. “Leio e penso no significado.”

Em tempo: segundo o Arquivo Municipal, o certo é Pirajussara, Loefgren e Edson. Mesmo que as placas erradas teimem em não concordar.


Sábado, 20 de setembro de 2008

5 de fev. de 2009

Em cartaz, a arqueologia paulistana

Exposição na casa bandeirista Sítio Morrinhos conta o passado da cidade desde a época dos caçadores nômades
HISTÓRIA

A casa bandeirista do Sítio Morrinhos, no Jardim São Bento, zona norte da capital, recebeu a missão de contar a história dos primeiros moradores de São Paulo. Não, não estamos falando dos jesuítas que, capitaneados pelos padres Manuel da Nóbrega e José de Anchieta, aqui fundaram um colégio em 1554. Estamos falando dos caçadores nômades que, por diversas épocas, se estabeleceram no planalto paulista, desde 25 mil anos atrás.

Resgatar a pré-história de São Paulo – e atiçar a curiosidade da população para a arqueologia – é o objetivo da mostra Escavando o Passado, em cartaz a partir de hoje no Sítio Morrinhos. “Fizemos uma linha do tempo desde as primeiras ocupações da região até a formação do núcleo urbano”, explica a arqueóloga Cintia Bendazzoli, curadora da exposição, que terá cerca de 300 peças.

Todo esse material foi selecionado do acervo de 100 mil itens do Centro de Arqueologia da Cidade de São Paulo, órgão vinculado ao Departamento de Patrimônio Histórico (DPH). A única exceção é uma urna funerária utilizada por índios ceramistas, estima-se, há pelo menos oito séculos. O objeto pertence à coleção do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (USP). “O interessante é que ele foi encontrado por um coveiro, em 1896, no cemitério da Quarta Parada”, comenta Cintia. “Ou seja: o homem sempre escolheu os mesmos lugares para enterrar seus mortos.”

As peças mais antigas da exposição são artefatos feitos de pedra lascada, utilizadas pelos ancestrais que viveram entre 25 mil e 5 mil anos atrás. “Há pontas de flecha e instrumentos usados para cortar e furar”, exemplifica a arqueóloga. A grande fonte desse material é o Sítio Lítico do Morumbi, perto do Clube Paineiras. Acredita-se que ali tenha funcionado uma “oficina” de produção de ferramentas, graças à abundância de rochas boas para tal uso. Nos anos 60, a região foi escavada e o material, retirado. O espaço montado na exposição simula como era esse sítio arqueológico.

Em outro módulo, estão fragmentos de piso, adornos e pedaços de vestimentas encontrados durante a reforma, concluída no ano passado, da capela de São Miguel Paulista, a mais antiga da cidade, fundada em 1622. Há também um espaço dedicado a contar a história das casas bandeiristas, por meio de objetos como ferraduras e telhas.

O próprio Sítio Morrinhos é uma atração à parte. A casa, construída provavelmente em 1702, serviu como sede da propriedade rural que existia ali. “Passou por vários proprietários, até ser adquirida pelos religiosos do Mosteiro de São Bento”, conta a historiadora Maria Lúcia Perrone Passos, do Centro de Arqueologia da Cidade. “Funcionava como casa de repouso e retiro espiritual dos monges.”

Nos anos 50, as terras foram compradas por empreendedores imobiliários. Do loteamento, surgiu o bairro, batizado com Jardim São Bento em homenagem aos beneditinos. A casa bandeirista, preservada em um terreno de 8,8 mil m², foi entregue à Prefeitura. Após duas obras de restauração, em 1984 e 2000, o Sítio Morrinhos integra o complexo chamado de Museu da Cidade de São Paulo, com 11 casas históricas mantidas pelo DPH.

A exposição deve se prolongar por, no mínimo, seis meses. É a primeira atividade do Centro de Arqueologia. “Mostrar esses objetos à população é uma maneira de dar a ela um retorno do nosso passado”, acredita a arqueóloga responsável pelo recém-criado órgão, Lúcia Oliveira Juliani.

Aliás, o Centro de Arqueologia só nasceu por causa de um episódio nocivo à história, ocorrido em um passado recente. O Sítio Lítico do Morumbi acabou na mão de três empresas do ramo imobiliário que, na construção de edificações, o danificaram. O Ministério Público Federal comprou a briga e, em 2006, as empresas foram obrigadas a compensar o estrago ressarcindo a memória paulistana. Elas bancaram obras de conservação e manutenção do Sítio Morrinhos e custearam a implementação do Centro de Arqueologia. Missão cumprida, a cidade agradece.

Serviço:
Exposição Escavando o Passado
Sítio Morrinhos, Rua Santo Anselmo, 102, Jardim São Bento. Fone: (0xx11) 2236-6121. Grátis


Sábado, 31 de janeiro de 2009

4 de fev. de 2009

Após 11 meses de reforma, Casa do Grito reabre com exposição

Construído com pau-a-pique no século 19, local abrigará mostra de peças arqueológicas
MEMÓRIA

Hoje, o engenheiro civil José Henrique Serafim, do Departamento de Patrimônio Histórico (DPH), consegue respirar com a sensação do dever cumprido. Depois de 11 meses de obras, a Casa do Grito, construção de pau-a-pique próxima ao Museu do Ipiranga, deve ser reaberta ao público.

“Durante todo esse tempo, vistoriei diariamente o andamento da reforma”, conta Serafim. Sob sua responsabilidade, estavam dez funcionários. “O prazo inicial era de seis meses. Mas encontramos tantos problemas no processo que tudo acabou se atrasando.”

A obra custou R$ 140 mil à Secretaria Municipal de Cultura – e eliminou as rachaduras nas paredes, além dos fungos e dos cupins que deterioravam a histórica casa, de 130 metros quadrados e oito cômodos. Os pilares de madeira que sustentam a casa sofriam com a umidade excessiva e tinham as bases apodrecidas. “Criamos uma proteção de concreto”, diz o engenheiro.

Foi a quarta grande reforma pela qual passou a construção, que pertence à Prefeitura desde 1936. A maior delas, da década de 50, praticamente reconstruiu o imóvel, que estava em ruínas. “Além do pau-a-pique, há trechos feitos com tijolos de cinco tipos”, afirma ele. Resultado, obviamente, de intervenções anteriores sem preocupação histórica.

Tombada pelos órgãos municipal, estadual e federal de preservação patrimonial (Conpresp, Condephaat e Iphan), a Casa do Grito ficou conhecida por esse nome graças ao artista plástico Pedro Américo. Ela aparece em sua célebre tela Independência ou Morte, pintada entre 1886 e 1888 e em exposição permanente no Museu do Ipiranga. Acredita-se, entretanto, que a construção ainda não existia quando d. Pedro I soltou seu “brado retumbante”.

De acordo com pesquisadores do DPH, o mais provável é que ela tenha sido erigida em 1844. Pertencia a Guilherme Antonio de Moraes, um sujeito que possuía dois carros de boi e ganhava a vida com eles. De 1887 a 1911, a casa passou por diversos proprietários, até acabar comprada pela família Tavares de Oliveira. Nessa época, já bastante deteriorado, o imóvel chegou a ser utilizado como cocheira.

Desapropriado pela Prefeitura em 1936, ficou abandonado por quase duas décadas, até a sua recuperação. Transformou-se em monumento comemorativo à proclamação da Independência, parte do complexo do próprio museu.

EXPOSIÇÃO
Para marcar a reabertura do espaço, entra em cartaz a exposição Da Independência ao Grito: História de uma Casa de Pau-a-Pique. As cerca de 50 peças que integram a mostra permanente aberta hoje são fruto de escavações arqueológicas realizadas na casa durante a década de 80. Há pedaços de vidro, fragmentos de cerâmica e pedras trabalhadas. “Possivelmente, foram utilizadas pelos antigos moradores”, afirma a curadora da exposição, Margarida Davina Andreatta, arqueóloga da Universidade de São Paulo (USP). Há 20 anos, ela participou das escavações.

Serviço:
Da Independência ao Grito: História de uma Casa de Pau-a-Pique: Parque da
Independência, s/n.º, Ipiranga. De terça a domingo, das 9 às 17 horas. Tel: (0xx11) 2068-0032. Grátis


Terça-feira, 2 de setembro de 2008

3 de fev. de 2009

Oscar Freire: outra quadra em reforma

Obra vai da Padre João Manoel à Ministro
URBANISMO

“O dono do hotel já pagou há um tempão e ainda não começaram as obras”, dizia um freqüentador da Rua Oscar Freire a Valdemir Pereira dos Santos, subgerente da lanchonete Frevo, na manhã de ontem. A reforma de mais um trecho da badalada rua paulistana – entre a Padre João Manoel e a Ministro Rocha Azevedo – era o assunto do dia na região. A previsão é que as obras comecem ainda esta semana e durem quatro meses. O trecho ficará parecido às cinco quadras da Oscar Freire, revitalizadas há dois anos. Terá novas calçadas, iluminação mais eficiente, fiação subterrânea. Em resumo, copiará o charme que deu certo na vizinhança, para tentar atrair mais freqüentadores.

Ontem, o prefeito Gilberto Kassab (DEM) passou por lá para assinar o termo oficializando a parceria da Prefeitura com o Hotel Emiliano. Mas Carlos Alberto Filgueiras, dono do hotel, esquiva-se de assumir sozinho a iniciativa. “Tem outras empresas ajudando, tem outras empresas ajudando...”, dizia, sem determinar quais nem quantas. No acordo ratificado pelo prefeito, consta que a obra custará R$ 1,75 milhão, sendo R$ 1,5 milhão de responsabilidade do Emiliano e R$ 250 mil bancados pelos cofres públicos. Mas se ventilava também que uma administradora de cartões de crédito pagaria parte dos gastos. Enquanto isso, proprietários do quarteirão comemoravam. “Quando comprei esse espaço, já tinha essa expectativa”, contou Jones
Bergamin, da Bolsa de Arte do Rio de Janeiro.


Segunda-feira, 1º de setembro de 2008

2 de fev. de 2009

Monomotor bate em prédio do Campo de Marte

Foi só um susto. No início da tarde de ontem um monomotor Embraer 710 C Carioca chocou-se com um portão do prédio administrativo da Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária (Infraero), no Campo de Marte, zona norte de São Paulo. Uma das asas do avião foi arrancada. O piloto, identificado apenas como Hamilton, de 63 anos, e o passageiro – seu genro, de 39 – passaram pelo Hospital São Luiz com ferimentos leves.

O acidente ocorreu em terra firme. O piloto conduzia a aeronave de um hangar de manutenção até o aeroclube. “Não percorreu nem 30 metros”, conta o diretor do hangar, Valter de Paula. “Foi imperícia do piloto. Tinha acabado de tirar brevê.”

As operações no aeroporto não foram afetadas. O caso será apurado pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos. Quando não há danos a patrimônio ou terceiros, é comum o piloto ficar sem punição.

TRÂNSITO
No centro de Guarulhos, uma pessoa morreu e cinco ficaram feridas num acidente às 6h30 de ontem na Avenida Salgado Filho. O motorista bateu num poste após perder o controle, quando voltavam de um show. Em Santo Amaro, zona sul, quatro pessoas foram atropeladas por um veículo desgovernado anteontem, em frente ao terminal de ônibus.

em parceria com Alline Dauroiz.


Domingo, 31 de agosto de 2008

1 de fev. de 2009

Casarão em SP volta a ser posto de atenção a portadores do HIV

Construído em 1922, prédio estava fechado há quatro anos e foi restaurado
SAÚDE

De 1980 até hoje, foram registrados 67,7 mil casos de aids em São Paulo. Só no ano passado, foram 1.693. Há uma semana, um prédio histórico na Alameda Cleveland, no bairro dos Campos Elíseos, voltou a funcionar como posto de atendimento especial a portadores de HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis. O casarão, de 1.175 metros quadrados, foi construído em 1922 para prestar serviços de assistência médica aos funcionários da Estrada de Ferro Sorocabana. Desde 1996 abrigava um serviço de atendimento a soropositivos mantido pela Secretaria Municipal de Saúde.

Tudo ia bem até janeiro de 2004, quando o imóvel foi fechado por causa de problemas estruturais. E assim ficou até o ano passado. De novembro para cá, graças a investimentos de R$ 4 milhões do Hospital Sírio-Libanês, passou por uma restauração total.

O prédio, em estilo neocolonial, é tombado tanto pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp) quanto pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat). Por isso, toda a obra foi cercada de cuidados especiais.

No período em que o casarão ficou fechado, o atendimento dos cerca de 2,7 mil pacientes cadastrados foi deslocado para um endereço nas proximidades, na Rua Albuquerque Lins. “Não era a mesma coisa, pois o local já tinha uma identidade forte com os usuários”, diz a psicóloga Maria Cristina Abbate, que desde 2003 coordena o Programa Municipal de DST/Aids. Por causa da localização geográfica, lá é onde mais se atende moradores de rua, travestis e prostitutas.

CAMISINHAS
O trabalho da Prefeitura de São Paulo para atendimento a soropositivos e
prevenção da aids existe há 25 anos. Atualmente há 24 postos como o da Alameda Cleveland em funcionamento. cFazemos diagnósticos, trabalhos de prevenção e distribuímos camisinhas”, diz Maria Cristina.

Nos postos é possível fazer exame de HIV em uma hora, retirar preservativos – por ano, são distribuídos 41 milhões em toda a rede – e ter acompanhamento médico. Cerca de 150 agentes comunitários de saúde atuam conscientizando a população mais vulnerável. Ganham uma bolsa de R$ 300 por mês. “Tomamos cuidado para que jovens orientem jovens, mulheres orientem mulheres”, diz a psicóloga.

Em 2007 houve uma diminuição de 34% no número de casos de aids comparado ao ano anterior. Toda a rede acompanha cerca de 50 mil pessoas. Quase 15 mil tomam medicação anti-retroviral.
Gestantes soropositivas recebem cuidado especial para que os bebês não sejam infectados. Isso significa, entre outras precauções, não amamentar o recém-nascido. Em 2004, 8% dos bebês nascidos de mães portadoras de HIV contraíram o vírus. No ano seguinte, esse índice caiu para 1%. Ainda não há dados mais recentes, pois a estatística depende de um acompanhamento de longo prazo das crianças.

CULTURA
Para marcar a reinauguração do serviço nos Campos Elíseos, três exposições entrarão em cartaz no casarão, a partir de 2 de setembro. A primeira será um documentário do trabalho de restauração do prédio, com fotos do antes e depois e de alguns detalhes do processo de recuperação.

A jornalista Roseli Tardelli organizará outra mostra: uma compilação de artigos sobre aids publicados nos últimos 20 anos. Roseli comanda a Agência de Notícias da Aids, organização fundada por ela em 2003.

Por fim, Retratos de Um Universo Escondido é um ensaio produzido pelo fotógrafo e advogado Barry Michael Wolfe. Escocês radicado no Brasil desde 1986, ele produziu uma série de fotografias com os travestis usuários do serviço de atendimento dos Campos Elíseos.

O apoio na restauração não é a primeira parceria que o Hospital Sírio-Libanês faz com a Prefeitura. Desde 2003, um veículo com dois funcionários mantidos pelo hospital circula em 13 postos de saúde da região central. Os profissionais fazem manutenção dos prédios e dos sistemas de informática.


Segunda-feira, 25 de agosto de 2008