31 de dez. de 2008

Festival eclético

Shows, exposições e filmes estão entre as atrações de ciclo judaico

Durante uma semana, o Centro da Cultura Judaica deixará de ser um centro apenas da comunidade israelita. Isso porque 21 das 36 atrações do IV Ciclo Multicultural têm outras raízes. Haverá programas para (quase) todos os gostos, abrangendo cinema, música, dança, gastronomia, fotografia, artes plásticas, literatura e teatro. A lista dos convidados vai do cantor e compositor Gabriel, o Pensador, ao poeta índio guatemalteco Humberto Ak'abal – que falará sobre tradições xamânicas e lançará seu livro Tecedor de Palavras, no dia 26, às 16h30. O tema escolhido para nortear o evento deste ano é a sinestesia da arte. "Queremos que as pessoas experimentem um passeio pelos cinco sentidos", explica a organizadora, Yael Steiner.

Um bom exemplo é a apresentação do grupo portenho Nuevo Trio Argentino, que executará obras de Felix Mendelssohn e Astor Piazzolla (dia 21, às 21h). Antes do início do espetáculo serão servidos vinhos argentinos. Quem quiser se concentrar totalmente na música poderá ouvir o espetáculo com uma venda nos olhos. Após a exibição de filmes, estão programadas degustações. Espectadores vão saborear chocolates (depois da fita Chocolate, dia 20, às 15h), especiarias (Tempero da Vida, dia 22, às 15h) e vinhos kosher (Quando É que Vamos Comer?, dia 24, às 15h). Workshops de culinária com o gourmet Breno Lerner completarão as tardes cinéfilo-gastronômicas.

Para a garotada, o caricaturista uruguaio Hanoch Piven, cujas obras estarão expostas na Galeria do Centro da Cultura Judaica, ensinará suas técnicas de colagem e desenho (dia 21, às 17h). Gabriel, o Pensador, mostrará o seu lado escritor de livro infantil – é o atual vencedor do Prêmio Jabuti da categoria, com Um Garoto Chamado Rorbeto –, narrando uma história para as crianças (dia 21, às 15h30).

IV Ciclo Multicultural. Centro da Cultura Judaica. Rua Oscar Freire, 2500, Sumaré, 3065-4344, Metrô Sumaré. Até dia 26. A partir de segunda (20). Grátis mediante 1 quilo de alimento não perecível ou 1 livro infanto-juvenil em bom estado. http://www.ciclomulticultural.org.br.


Quarta-feira, 22 de novembro de 2006

30 de dez. de 2008

Plantando a sua própria floresta

Nos planos do SOS Mata Atlântica, o plantio de 4 milhões de árvores em 5 anos

O empresário Carlos Junqueira acaba de comprar dez árvores que serão plantadas na mata atlântica. Incentivado pela marcenaria Etel Interiores, de São Paulo, com a qual mantém negócios, ele garante que, em breve, vai aumentar sua “floresta”. A marcenaria é uma das primeiras empresas a participar do projeto Florestas do Futuro (http://www.florestasdofuturo.org.br), da Fundação SOS Mata Atlântica. Nos próximos cinco anos, a ONG pretende plantar 4 milhões de árvores. “O projeto é longo e ainda engatinha, mas os empresários o têm recebido bem”, conta Sulce Lima, do Departamento de Comunicação e Marketing da SOS. Ela lembra que “trabalhar com meio ambiente exige tempo e paciência”.

O Florestas do Futuro propõe a cada empresa participante adotar uma floresta, financiando o plantio de pelo menos 15 mil árvores. As empresas tornam-se parceiras da SOS Mata Atlântica, “formando uma cadeia de efeitos positivos”, como diz diretor da fundação, Mario Mantovani.

A lógica do projeto baseia-se no que se convencionou chamar de créditos de carbono: a quantidade de dióxido de carbono emitida na atmosfera deve ser compensada com o plantio de árvores. Essas árvores estão indexadas no mercado de capitais. “No futuro, certamente haverá uma explosão de recursos financeiros para isso”, prevê Mantovani, lembrando que a preocupação ecológica e a responsabilidade social têm se tornando necessidades crescentes.

A diretora financeira da Etel, Lissa Tozzi, conta que sua empresa “trata a madeira como jóia da natureza. Por isso temos um cuidado todo especial”. A marcenaria já adquiriu sua floresta: 15 mil árvores serão plantadas no Vale do Tibagi (PR).

Anne Louette, coordenadora do Núcleo de Ação Social da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), sempre diz aos empresários que “o carro já existe e só é necessário abastecê-lo”. Ela garante que as ações dão certo quando o empresariado busca apoio técnico e estrutural das ONGs. O gerente de projetos ambientais da Fiesp, Nilton Fornasari, confirma: “O relacionamento com a comunidade facilita a condução dos projetos de modo mais adequado”.

Mas será que as empresas não estão se aproveitando dessas parcerias para fazer marketing? A SOS Mata Atlântica espera que não. “Acredito na alma ecológica das empresas. É importante que elas vejam esses projetos conscientes de que estamos caminhando para a falência ambiental”, observa Sulce Lima convencida de que seu trabalho resultará em benefício coletivo.


Quarta-feira, 17 de novembro de 2004

29 de dez. de 2008

Cartão amarelo para nossos estádios

FUTEBOL
Na semana em que a Fifa anuncia o Brasil como sede da Copa de 2014, estudo aponta falhas nos três grandes templos da bola em São Paulo

Não é fácil a vida de torcedor – e nem estamos falando só dos corintianos, que sofrem com a possibilidade de seu time ser rebaixado. Para ver as partidas de pertinho é preciso enfrentar congestionamentos nos arredores dos estádios, aturar o assédio dos flanelinhas e, muitas vezes, ter de parar o carro em estacionamentos distantes. A aventura não pára por aí. Há ainda os cambistas insistentes e toda a bagunça das filas na entrada. Dentro dos estádios, o público acomoda-se em assentos precários, debaixo de chuva ou de um solzão de rachar, encontra poucos (e sujos) banheiros e sua a camisa em meio ao empurra-empurra das arquibancadas. "No geral, nossa estrutura está bem ruim pelos padrões internacionais da Fifa", diz o arquiteto Vicente de Castro Mello, especializado em obras esportivas.

Nos últimos três meses, ele e o pai, o também arquiteto Eduardo de Castro Mello, integraram uma comissão do Sindicato da Arquitetura e da Engenharia (Sinaenco) que percorreu 28 estádios brasileiros. Muitas vezes, a visita foi feita de surpresa. A equipe passou cerca de três horas em cada um deles e documentou tudo o que encontrou. Esse material transformou-se em uma análise comparativa da situação dos palcos do futebol nacional. O estudo é importante porque, com a confirmação do Brasil como sede da Copa de 2014, alguns desses espaços devem ser reformados para que, até lá, estejam tinindo para abrigar jogos do campeonato. Em São Paulo, os arquitetos visitaram o Morumbi, o Pacaembu e o Palestra Itália – os três mais importantes estádios da capital. "Há pontos negativos que unem todos eles, como a falta de estacionamentos, os assentos descobertos e as condições precárias dos banheiros", conta Vicente. A notícia boa é que, para o bem do futebol, tudo o.k. com o campo. "O gramado e as dimensões estão dentro do aceitável", diz Eduardo.

Luxo só para o anfitrião
Inaugurado em 1960 e batizado de Cícero Pompeu de Toledo, o estádio do São Paulo Futebol Clube tem capacidade para receber 68 000 torcedores. "Após as reformas que faremos visando à Copa, devemos ter uma redução de 10 000 espectadores", explica o assessor especial da presidência, João Paulo de Jesus Lopes, referindo-se ao projeto encomendado ao arquiteto Ruy Ohtake. "Vamos cobrir as arquibancadas e aumentar o conforto." Apesar das boas condições ali encontradas – para os padrões brasileiros –, o Sinaenco apontou três falhas. A principal delas é a falta de um estacionamento aberto aos freqüentadores. Atualmente, há apenas um, pequeno e restrito à diretoria. De acordo com a Fifa, um estádio com capacidade superior a 45 000 pessoas deve ter 10 000 vagas para carros. Os outros problemas são a grade metálica que separa os setores das torcidas (que tira a visibilidade de alguns trechos) e a discrepância de qualidade dos vestiários (que são cinco). Nesse último quesito, uma curiosidade: o vestiário principal, que tem espaço para aquecimento com grama sintética, banheira coletiva e até um compressor de ar para limpar as chuteiras, é utilizado somente pelo São Paulo. Quando outro time aluga o Morumbi para ali mandar seus jogos – pagando para isso um mínimo de 78 000 reais –, precisa se contentar com um dos outros vestiários (que não têm nem armários). "Não vejo problema. É como receber visitas em casa e reservar a elas um quarto de hóspedes."

Patrimônio paulistano
O tempo é o maior inimigo do Estádio Municipal Paulo Machado de Carvalho, o Pacaembu, inaugurado em 1940. As obras para a construção do Museu do Futebol, que deve ficar pronto no segundo semestre de 2008, acabaram revelando um problema: infiltrações de água nas arquibancadas. "Com o passar dos anos, a umidade corroeu a estrutura metálica do concreto armado", explica o arquiteto Eduardo de Castro Mello. O diretor do estádio, Aléssio Gamberini, garante que não há motivos para preocupação. "O trecho de arquibancada que ficará sobre o Museu do Futebol está sendo impermeabilizado", afirma. "E já pedimos à Secretaria Municipal de Esportes estudos de engenharia dos outros setores." A quantidade insuficiente de banheiros do Pacaembu (são 36 para atender o público máximo de 38 000 torcedores) é compensada com uma solução paliativa. Em média, são alugadas trinta cabines de banheiro químico por partida, como no último domingo, quando em seu gramado o Corinthians venceu o Figueirense por 2 a 1. Como é tombado pelo Conpresp (desde 1988) e pelo Condephaat (desde 1994), qualquer intervenção em sua construção depende de autorização especial.

À procura de investidores
Quer irritar o diretor administrativo da Sociedade Esportiva Palmeiras, José Cyrillo Júnior, que assumiu o cargo há dez meses? É só expor a ele os problemas estruturais do estádio que tem sob sua responsabilidade. O mais antigo entre os três maiores da capital – foi fundado em 1933 –, o Palestra Itália passa por maus momentos. "Há rachaduras sob as escadas que dão acesso às arquibancadas, por exemplo", diz o arquiteto Vicente de Castro Mello. "São resultado de infiltração de água." Os banheiros, planejados para outros tempos, não têm nenhum dispositivo para racionalizar o uso de água (como temporizadores que fecham as torneiras automaticamente), e os mictórios, coletivos e em forma de cocho, dificultam a manutenção da limpeza durante os jogos. "Em alguns pontos, atrás do gol, a visão do campo é bem ruim", afirma Vicente. Cyrillo discorda do levantamento e, da manga, saca um projeto para a reconstrução total do estádio, no mesmo endereço atual, aumentando sua capacidade de 32 000 para 45 000 pessoas. "Será uma arena multiuso, coberta, muito moderna", diz. Para viabilizá-lo, o Palmeiras busca investidores. De acordo com estimativas do diretor, seriam necessários 120 milhões de dólares. "Com a oficialização da Copa de 2014 no Brasil, acredito que surgirão parceiros interessados."


Quarta-feira, 7 de novembro de 2007

28 de dez. de 2008

Quanto pior, melhor

ESPORTE
Nada de Palmeiras, São Paulo ou Corinthians: este obcecado grupo de paulistanos só se interessa em ver jogos de equipes quase desconhecidas

Primeira Camisa, Capivariano, Saltense, Elosport, Brasilis, Velo Clube, Joseense... Você provavelmente nunca ouviu falar desses times, mas alguns paulistanos aguardam, ansiosamente, o início dos jogos do que seria a quarta divisão do Campeonato Paulista, neste sábado (19), só para vê-los em campo. Eles não estão nem aí se o Palmeiras vai conseguir reverter a vantagem do São Paulo, no domingo, ou se o Barcelona chegará à final da Liga dos Campeões da Europa. O negócio dessa turma é assistir a partidas de categorias inferiores do futebol profissional e depois contar tudo em um site. Quanto pior, melhor. "Neste ano, na série B do Campeonato Brasileiro, seremos obrigados a ver jogos do Corinthians", queixa-se o músico Fernando de Matos Martinez, que prefere torcer numa boa pelada do Juventus, na Mooca, ou do Nacional, na Barra Funda.

Além de Martinez, esse grupo de obcecados por timecos é formado pelo administrador Orlando Lacanna Filho, o jornalista Emerson Ortunho, o engenheiro eletricista Jurandyr Moraes Tourices Junior, o delegado Victor Minhoto Meinão, o comerciante David Libeskind Sirota e o oficial de promotoria Estevan Mazzuia. Como têm predileção por partidas entre clubes pequenos e quase desconhecidos, eles começaram a se encontrar freqüentemente nos estádios. "Os jogos atraem poucos torcedores, uma média de 100 por partida, e sempre acabávamos nos vendo", conta Lacanna, que freqüenta campos de futebol há quarenta anos. O clubinho se formou a partir do fim da década de 80. Ortunho foi o último a ser admitido, em 2004, quando todos começaram a publicar relatos das partidas no site www.jogosperdidos.com.br. "No início, era apenas para contarmos uns aos outros sobre os jogos que tínhamos visto", lembra Martinez. A idéia deu certo e, pouco mais de três anos depois, o site registra uma média de 650 acessos por dia.

Eles têm o hábito de catalogar os jogos a que assistem. Tourices gaba-se de já ter visto em campo 595 times – entre eles o Badalona, da Espanha, e o Vilnius, da Lituânia. "Eu sou o único que não faz lista", afirma Lacanna. "Não gosto da idéia de assistir a um jogo só para acrescentar mais um time à minha lista." Em geral, a paixão pelas equipes pequenas vem do berço. "Aprendi com meu pai a torcer pelo Jabaquara de Santos", diz Ortunho, que até agora já viu 285 times em campo. Mesmo quando viajam a passeio, eles aproveitam para conferir jogos pitorescos. "Na minha lua-de-mel, em 2005, fui a cinco países europeus", enumera Tourices. "Claro que vi cinco partidas."

Eles só acompanham jogos envolvendo times grandes quando o adversário é uma equipe que consideram inédita. Por isso, Martinez foi assistir à partida entre São Paulo e Sportivo Luqueño, do Paraguai, no último dia 2, pela Libertadores da América. Não para ver o São Paulo, naturalmente, mas sim o Luqueño. Jogos da Copa do Brasil, em que participam clubes praticamente desconhecidos entre os grandalhões, são um prato cheio. Como driblar a fúria da mulher quando há tanto futebol agendado? "A minha prefere que eu veja jogos durante a semana, para estar livre aos sábados e domingos", explica Meinão. A receita de Tourices é apelar para o talão de cheques e o cartão de crédito: "É preciso fazer uma média, levá-la depois ao shopping, deixá-la comprar o que quiser..."


Quarta-feira, 23 de abril de 2008

27 de dez. de 2008

Vamos salvar nossas praças

PATRIMÔNIO
Roosevelt, Sé e República sofrem com o vandalismo

Muitos dos 2 milhões de paulistanos que circulam diariamente pelo centro atravessam a Praça da Sé ou a Praça da República, reformadas há menos de um ano. O investimento de 7 milhões de reais na época deixou-as tinindo. Ganharam bancos, lixeiras, árvores e pisos novos. O que se vê hoje ali, no entanto, é o resultado da ação de marginais, que picham, depredam e roubam parte do patrimônio público, desafiando a lei. A segurança delas é feita por apenas 23 homens da Guarda Civil Metropolitana (GCM), que se revezam em turnos. "Não é suficiente para coibir o vandalismo", admite o secretário das Subprefeituras, Andrea Matarazzo. "Precisaríamos viabilizar a contratação de segurança privada." A situação é pior na Praça Franklin Roosevelt, que há mais de dois anos sofre maus-tratos. Trata-se de uma área de 20 000 metros quadrados praticamente sem árvores, cercada por muros e com uma cobertura em forma de pentágono. Quase todas as paredes estão pichadas, com rachaduras e goteiras provocadas por infiltração. À noite, moradores de rua se instalam sob a marquise e a fedentina é insuportável. A situação só não ficou pior graças a companhias de teatro como Satyros e Parlapatões, que promovem ali em frente espetáculos de segunda a domingo. "Essas praças deveriam expressar o que há de mais essencial para uma cidade: intercâmbio cultural e afetivo", afirma o urbanista Cândido Malta Campos Filho.

Roosevelt: promessa de 12 milhões
Os sinais do abandono são nítidos. Pichações estampam muros, garrafas de vidro e sacolas plásticas se acumulam sobre o gramado, um vazamento cria poças d’água e o cheiro é repugnante. A situação piorou desde julho, quando saíram do local um supermercado – que locava da prefeitura um prédio existente na praça – e uma escola municipal de educação infantil. "Nos últimos meses, o movimento de minha loja caiu 90%", afirma a florista Rosana Barbosa, dona de uma das três banquinhas que funcionam ali. A boa notícia é que a tão prometida reforma do local (desde 2005 se fala nisso) está para sair. "As obras custarão 12 milhões de reais e devem começar em março", anuncia o secretário das Subprefeituras, Andrea Matarazzo. Serão demolidos a marquise e o prédio onde funcionavam o mercado e a escola. A praça ficará mais aberta, com acesso fácil tanto pela Rua Augusta quanto pela Rua da Consolação. Além de escadarias, serão construídas rampas para deficientes físicos. O projeto prevê ainda um telecentro, espaço público que oferece acesso à internet de graça à população. "Aguardamos com muita expectativa a revitalização, para esquecermos essa fase difícil da praça", diz Hugo Possolo, do Espaço Parlapatões, um dos teatros que funcionam na região.

Sé: o cartão-postal que pede socorro
Ao custo de 4 milhões de reais, a Praça da Sé, marco-zero da cidade, teve a reforma concluída no início deste ano. Ficou do jeito que São Paulo merece. Mas, como mostram as fotos ao lado, o lugar está malconservado, com pichações, mato alto e mendigos. É comum que moradores de rua utilizem o espelho-d’água para lavar roupas, e alguns não hesitam em se abrigar sob a sombra das esculturas que enfeitam a praça – aliás, Abertura, de Amilcar de Castro, é uma das que estão pichadas. Da bela passarela que existe no local, faltam duas das 46 placas de vidro. E sete estão trincadas. A Secretaria Municipal de Assistência e De-senvolvimento Social tem se esforçado para tirar os mendigos dali. Diariamente, 44 peruas e 354 agentes circulam abordando os sem-teto e convidando-os a passar a noite em um dos 36 albergues da cidade. "A cada quatro deles, somente um aceita ir", conta o secretário Floriano Pesaro. "A resistência a sair das ruas é grande, principalmente porque 70% dessa população tem algum comprometimento de saúde mental." As praças estão entre seus lugares preferidos. "São pontos em que eles se sentem protegidos e conseguem mais esmola", afirma Pesaro.

República: cadê o chafariz que estava aqui?
O paulistano sempre apreciou muito a Praça da República", diz o arquiteto e historiador Benedito Lima de Toledo. "O que é muito positivo, já que as pessoas precisam gostar de seus patrimônios." Com o rebaixamento dos canteiros e dos gradis, a recuperação do lago e a instalação de novo piso – um investimento total de 3 milhões de reais –, a praça pôde, em fevereiro deste ano, voltar a embelezar o centro. Sem dúvida é a que se apresenta em melhores condições, atualmente. O passeio é limpo – a prefeitura afirma que os seus quase 15 000 metros quadrados são varridos dez vezes por dia e lavados todas as noites –, embora haja um pouco de lixo no gramado. Uma pena que os chafarizes do lago não funcionem mais, desde que foram roubados os 27 jatos e registros que faziam o sistema operar. O busto que homenageia Luiz Lázaro Zamenhof, criador da utópica língua esperanto, está riscado e tem a gravata danificada. "Não adianta esperar quebrarem tudo para fazer nova reforma", diz Marco Antonio de Almeida, superintendente da Associação Viva o Centro. "Quando se fala em praças, sempre insistimos no indispensável: uma boa manutenção."


Quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

26 de dez. de 2008

Elas pedem socorro

PATRIMÔNIO
Pesquisa mostra que oito em cada dez praças da capital estão sem manutenção

Mato alto, bancos quebrados, falta de iluminação e lixeiras destruídas: oito em cada dez praças da cidade, analisadas por uma pesquisa de amostragem divulgada na semana passada, estão malcuidadas e com ar de desleixo. No Largo do Arouche, por exemplo, há sujeira nos canteiros, pichação em uma escultura e diversas falhas nas calçadas. A poucos minutos dali, no Largo Santa Cecília, a gangorra está torta e o balanço, sem nenhuma das cadeiras, não serve mais para as crianças brincarem. "Ficamos impressionados com o descaso com as nossas praças", afirma o arquiteto Cesar Bergstrom, coordenador de um levantamento feito pelo Sindicato da Arquitetura e da Engenharia (Sinaenco). Entre maio e julho, foram analisadas 183 praças, distribuídas proporcionalmente pelas 31 subprefeituras. A amostragem representa 4% do total de 4 620 praças contabilizadas pela prefeitura – esse número inclui "todos os espaços abertos, preferencialmente jardinados, destinados ao lazer e à recreação comunitária".

Segundo o levantamento, há bancos quebrados em metade das praças pesquisadas, lixeiras destruídas em 73% delas e falhas no calçamento em 38% dos espaços (veja quadro). "Esperamos que esses números sensibilizem a prefeitura", diz Bergstrom. O secretário das Subprefeituras, Andrea Matarazzo, atribui parte da culpa às empresas contratadas pelo poder público para fazer a manutenção das praças. "Muitas prestam um serviço de baixa qualidade", afirma. "Além disso, a amostra analisada por essa pesquisa é muito pequena para dar uma idéia da real situação."

As praças mais bem avaliadas são as mantidas pela iniciativa privada. É o caso da Ramos de Azevedo, com 7 000 metros quadrados, conservada desde 1998 pelo Grupo Votorantim. Não é a única. Existem 832 áreas públicas apadrinhadas. E outros 293 pedidos na fila. Na última quarta-feira, representantes das subprefeituras reuniram-se para discutir medidas que desburocratizem o sistema de adoção. Hoje, o processo leva cerca de dois meses. A empresa tem o direito de exibir placas com sua marca no local. E o paulistano, no lugar das áreas malcuidadas reveladas pela pesquisa, ganha praças de verdade que ajudam São Paulo a ser uma cidade melhor.


Principais problemas
Das 183 praças avaliadas pelo Sindicato da Arquitetura e da Engenharia...

48%
estavam com bancos quebrados

22%
com áreas verdes malcuidadas

18%
com falta de iluminação

73%
com lixeiras destruídas ou sem lixeiras

71%
com brinquedos quebrados*

38%
com falhas no calçamento

* Foram consideradas apenas as praças que possuem playground (20% do total da amostra)


Quarta-feira, 29 de agosto de 2007

25 de dez. de 2008

Um cafezal no meio da cidade

AGRICULTURA
Plantação do Instituto Biológico, na Vila Mariana, produz 400 quilos de café por ano

Nem parece que a foto acima foi tirada em um lugar que fica a dez minutos da Avenida Paulista. Em 10 000 metros quadrados de área, o Instituto Biológico mantém desde a década de 40 um cafezal com 1 305 pés na Vila Mariana. Alheios ao burburinho urbano a poucos metros dali, dois funcionários dedicam-se ao trato das plantas. Luiz Lasaro, 58 anos, orgulha-se de dominar todas as etapas da produção: cultivo, adubação, capinação, colheita... "Lido com isso desde os 9 anos de idade", conta. "Aprendi com meu pai." Mais discreto, Alcides da Silva não tira os olhos da plantação nem para conversar com o repórter. "Se eu não zelar bem, com carinho, não produz direito."

A história dessa minifazenda urbana de café é antiga. Em 1924, uma praga devastou os cafezais do estado. "Era preocupante para toda a economia", diz o diretor do instituto, Antonio Batista Filho. A tragédia agrícola motivou a criação, três anos depois, do Instituto Biológico, órgão destinado a realizar pesquisas científicas relacionadas ao tema. Funcionou inicialmente em seis prédios adaptados e distantes uns dos outros. Sua sede atual ficaria pronta em 1945, época da plantação do cafezal. "No começo, servia para pesquisas", conta Batista. "Atualmente, a maior finalidade é didática: recebemos muitas visitas de escolas." Desde 2006, sempre no mês de maio, o instituto realiza o início simbólico da colheita do café paulista. A idéia, inspirada em cidades francesas que fazem o mesmo com a uva, é criar um evento que marque a abertura da safra anual.

Com uma produção pequena, de cerca de 400 quilos por ano, o Instituto Biológico distribui tudo o que se colhe ali a entidades assistenciais cadastradas pelo Fundo Social de Solidariedade do Estado de São Paulo. A última entrega ocorreu em 6 de dezembro, em cerimônia no Palácio dos Bandeirantes. Durante o evento foram apresentadas as onze marcas que estampam o selo da 5ª Edição dos Melhores Cafés de São Paulo – com embalagens sofisticadas e numeradas, em quantidade limitada. São produtos industrializados pelas torrefadoras tendo como matéria-prima os grãos vencedores do Concurso Estadual de Qualidade do Café de São Paulo, adquiridos em leilão no mês de outubro.


Quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

24 de dez. de 2008

Ciclovia, playground e pilates no cemitério

FINADOS
Em alguns pontos da Grande SP, pessoas se divertem entre os jazigos

Duas vezes por semana, a cabeleireira Priscila de Araújo Viana faz aula de pilates no cemitério. Em Mauá, na Região Metropolitana de São Paulo, existe desde 1996 um cemitério dedicado ao bem-estar dos vivos. "Desde o início nos preocupamos em quebrar o preconceito de que é um lugar tenebroso, de tristeza", afirma Ivani de Oliveira Ferraz, a administradora do Vale dos Pinheirais.

Com jeitão de parque, o espaço de 137 mil metros quadrados oferece - além da capacidade para 30 mil jazigos - lanchonete, playground, ciclovia, pista de cooper e um centro cultural. Este, em forma de uma inusitada pirâmide de vidro, serve para palestras motivacionais, apresentações musicais, massagens e aulas de ioga e pilates. "Nossa idéia é: se a pessoa compra o espaço no cemitério quando ainda está viva, por que não usar isso?", justifica Ivani.

Quem compra um jazigo e paga a taxa de manutenção pode, com a família, desfrutar de toda a estrutura do espaço sem pagar mais nada por isso - nem pelas aulas. Os preços variam de R$ 4.994 a R$ 13.980.

As sessões semanais de massagem e as aulas de ioga e pilates são as que atraem maior público. Juntas, cativam quase cem freqüentadores assíduos. Mas ainda há quem não entenda tão estranho rol de atividades em um cemitério. "Quem não conhece acha fora do normal", diz a cabeleireira Priscila. "Mas eu gosto muito do ambiente. Nem parece um cemitério." Abertos também a quem não tem jazigo ali, há cursos de noções de secretariado, artesanato e manicure, entre outros. Todos de graça.

Hoje, por causa do Dia de Finados, a programação do Vale dos Pinheirais é bem movimentada. Haverá quatro missas e um encontro de oração, além de exames para diagnosticar câncer de garganta e diabetes, sessões de massagem e medição de pressão arterial.

Quem visitar o Cemitério da Consolação hoje receberá um livreto que conta sua história e descreve as principais obras de arte que podem ser vistas ali. O material é assinado pelo sociólogo José de Souza Martins, colunista do Estado, e foi viabilizado graças a uma parceria entre as Secretarias de Serviços e de Cultura.

Também será distribuído um mapa com a relação de personalidades ali enterradas, com a localização de seus túmulos. Há nomes como a pintora Tarsila do Amaral, o ex-presidente Washington Luís e o poeta Mário de Andrade. "Cemitério também é cultura", defende o secretário municipal, Carlos Augusto Calil.

Ele antecipa que, para incrementar as visitações ao Cemitério da Consolação, até o fim do ano devem começar a ser feitas ali obras de "reurbanização interna". Túmulos serão restaurados, haverá intensa arborização e, sob as sombras, bancos devem ser instalados. Só o restauro do pórtico principal está orçado em R$ 150 mil.

O maior cemitério do Brasil, que fica na Vila Formosa, na zona leste da capital, espera receber hoje mais de 150 mil pessoas. São 87 mil sepulturas distribuídas em uma área de 760 mil metros quadrados. De acordo com a administradora, Maria Lúcia de Carvalho, há um projeto para que seja feito ali dentro um parque contemplativo.

"Sete mil mudas de árvores já foram plantadas", revela. "O próximo passo será a construção de uma pista de caminhada, de um espaço para leitura e de um local para a realização de cultos ecumênicos." Mesmo sem o tal parque, moradores já desfrutam do imenso espaço do cemitério. "De manhã, é comum ver gente caminhando por aqui", conta Maria Lúcia. "E crianças empinam pipas, principalmente em época de férias escolares."


Festa e caminhada dos mortos

Não é só nos cemitérios que o paulistano celebra o Dia de Finados. Ontem estava previsto para ocorrer, no Centro Universitário Maria Antonia, na Vila Buarque, um debate intitulado Morrer em São Paulo, com uma perspectiva histórica sobre a morte na capital.

Para hoje, está programada a terceira edição da Zombie Walk, uma caminhada de pessoas fantasiadas de morto-vivo, com saída às 15 horas, no vão livre do Masp, na Avenida Paulista. Patrocinada pelo Conselho de Promoção Turística do México, uma cooperativa de arte alternativa preparou um altar com oferendas no Conjunto Nacional, na Paulista. “No México é tradição homenagear algum defunto da família com um altar cheio de coisas que ele gostava em vida”, explica o administrador do conselho, Francisco Méndez.

Com cardápio mexicano, restaurantes também celebrarão. No Obá, nos Jardins, até o dia 9 se homenageia Dercy Gonçalves. Já o La Mexicana, da Vila Olímpia, lembra o Seu Madruga, do seriado Chaves.


Domingo, 2 de novembro de 2008

23 de dez. de 2008

Doc Riders, os doutores sobre duas rodas

COMPORTAMENTO
Médicos que adoram motos criam clube para organizar viagens

Eles não vêem a hora de sábado chegar para trocar os estetoscópios pelas motocicletas. A bordo de suas possantes máquinas - muitos têm cobiçadas Harley Davidson -, os médicos motociclistas enfrentam as estradas semanalmente. "Tem que ser todo fim de semana, como ir à missa", compara o médico Alberto D'Auria, diretor de relacionamento do Hospital Santa Joana e um dos organizadores dos passeios.

D'Auria possui sete motos. "Sou viciado", admite. A primeira, uma Honda S65, ele ganhou quando era um menino de 13 anos - hoje está com 54. "Eu a tenho até hoje", conta. "Está sendo restaurada." Para ir de sua casa, no Morumbi, até o trabalho, no Paraíso, costuma utilizar uma Burgman ou uma BMW. Aos sábados, quando viaja com os amigos, prefere sua Harley Davidson.

Em 1997 ele começou a organizar viagens na companhia de colegas que também gostavam de motociclismo. "O encontro serve para alimentar nossa amizade e promover a confraternização da equipe", acredita. A idéia deu tão certo que o grupo acabou se organizando em um clube, fundado há quatro anos e batizado de Doc Riders. "Hoje são 25 integrantes", conta o médico Rogerio Moreno, que atende nos hospitais Albert Einstein, São Luiz e Santa Joana e é fundador e presidente do Doc Riders.

AVENTURAS
A internet é uma grande aliada desses aventureiros. Seja para trocarem as fotos dos passeios - eles mantêm um fotolog em http://fotolog.terra.com.br/docriders - seja para planejar as viagens semanais. Por volta de quarta ou quinta-feira eles trocam e-mails com sugestões e acabam escolhendo um destino. No sábado retrasado, por exemplo, foram até o Km 53 da Rodovia Castelo Branco para saborear uma bacalhoada em um restaurante. "Estava saborosíssima", afirma D'Auria. Participaram 18 motociclistas.

Numa dessas viagens rápidas, eles precisaram mostrar serviço. Estavam indo para Itu quando presenciaram um acidente entre uma moto e um carro. Os médicos fizeram uma breve interrupção no lazer. "Nós acabamos fazendo o primeiro atendimento", lembra Moreno. "Felizmente, não foi nada grave."

Alguns médicos compartilham com a família a paixão pelas motos. E acabam levando gente na garupa. "Eu nunca vou sozinho", conta D'Auria. "Minha mulher sempre me acompanha." No ano passado, parte do grupo encarou uma maratona até Buenos Aires. Entre os destinos nacionais, já fizeram expedições para cidades mineiras e catarinenses, por exemplo.

Mas o maior passeio do grupo foi realizado em outubro: em oito dias, percorreram 2,5 mil quilômetros pelo sul dos Estados Unidos. "Alugamos motos lá", conta Moreno. "De Las Vegas, em Nevada, fomos até o Texas." Participaram 32 pessoas, entre médicos e parentes. Para viabilizar a aventura, os motociclistas fizeram um planejamento ao longo de oito meses. E vem mais por aí. "Agora já estamos ajustando as agendas para, no ano que vem, irmos para a África do Sul", antecipa Moreno.


Quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

22 de dez. de 2008

Para vovôs abonados

SOCIEDADE
Com tratamento cinco-estrelas, o mais novo asilo classe A da cidade cobra mensalidades que chegam a 12000 reais

Tarde de quinta-feira. Em uma pracinha com decoração anos 50, um grupo lentamente joga vôlei. Ou quase, já que todos ficam sentados e a bola não passa de uma bexiga. O mais animado deles é o publicitário aposentado Jorge Silva dos Santos, de 80 anos. Ele se gaba de sua performance, ri quando um dos colegas não consegue rebater a bexiga e reclama na hora que a terapeuta decreta o fim da atividade. Após sofrer hidrocefalia, um distúrbio neurológico, Santos ficou com seqüelas motoras e problemas de memória. "Sinto falta de poder tocar piano, mas meus dedos não conseguem mais", afirma. Ele é um dos cinco idosos que freqüentam três vezes por semana o Centro de Vivência Hiléa, no Morumbi – e, para tanto, desembolsam 2 000 reais mensais. Santos participa das mesmas atividades que os onze moradores do local, cujas famílias pagam de 6 000 a 12 000 reais por mês, dependendo do tratamento. "Estou aqui passando por manutenção", brinca. "É uma assistência técnica."

Com 118 quartos classudos, piscina, academia, jardim, um restaurante aconchegante e uma pracinha retrô que reúne cinema, livraria e barbearia, o Hiléa foi inaugurado em dezembro, próximo ao Shopping Jardim Sul. Um grupo de investidores bancou o projeto de 45 milhões de reais da administradora Cristiane D’Andrea, diretora-presidente da instituição. Ex-diretora do Hospital Nossa Senhora de Lourdes e uma das fundadoras do Hospital da Criança, ambos no Jabaquara, ela largou tudo para, desde 2001, dedicar-se ao projeto de um lar classe A para idosos. "Nestes sete anos, conheci dezesseis residenciais desse gênero em países como Estados Unidos, França, Holanda e Canadá", conta. "Procurei reproduzir aqui o que vi de melhor em cada um deles." A arquitetura mereceu atenção especial. Os corredores, por exemplo, têm o conceito de "osso de cachorro": nas duas pontas sempre há uma área social, como sala de TV e refeitório, servindo de incentivo à caminhada de um ponto ao outro. Para evitar que pacientes com Alzheimer sintam desconforto com o entardecer, sintoma comum na maioria dos que sofrem com a doença, a iluminação é homogênea durante o dia todo.

O maior desafio de Cristiane é quebrar o preconceito contra a idéia de internação num lar para idosos, ainda que vip. "Acredito que seja uma forma de garantir qualidade de vida", afirma. "É preciso desmistificar a impressão de que o idoso fica largado, longe da família." Os quartos têm um telefone equipado com tela, possibilitando que o morador veja e seja visto por seus parentes – que, para interagir, precisam de um aparelho similar. Visitas podem ser feitas a qualquer hora. As áreas comuns, como o restaurante, são abertas para visitantes. "Com freqüência ocorrem almoços familiares aqui", diz Cristiane, que comanda noventa funcionários (médicos, nutricionistas, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais e enfermeiros, entre outros). "Antes tínhamos de encontrar um médico especialista para cada probleminha que surgia", lembra a empresária Flavia Carraro Campello, nora do engenheiro aposentado Luiz Eduardo de Adolpho Campello, de 95 anos, internado ali desde janeiro.

Doutor Campello, como é conhecido, permanece sério praticamente o tempo todo. Costuma abrir um sorrisão em três ocasiões: quando recebe a visita de familiares, nas atividades com bola (jogava futebol na juventude e, até os 80 anos, praticava tênis) e ao ouvir a música New York, New York. "Ele estudou em Nova York e morou lá durante muitos anos", explica Flavia. Às vezes a memória o trai e ele pensa que está nos Estados Unidos. Não é raro, por exemplo, que cumprimente as pessoas em inglês. Além de atividades físicas, o Hiléa procura reavivar as referências da memória. A praça, com decoração ao estilo anos 50, foi projetada com esse objetivo. Na livraria é possível manusear exemplares de revistas antigas e no cinema, assistir a sucessos de época. Casablanca é um dos favoritos dos moradores, que, ao reverem o romance de Humphrey Bogart e Ingrid Bergman, ao som de As Time Goes By, costumam pedir bis.

• Hiléa. Rua Jandiatuba, 200, Morumbi, 3566-4700, http://www.hilea.com.br/


Asilos cinco-estrelas
Outros endereços de residenciais de primeira

Lar Recanto Feliz. Rua Doutor Romeu Ferro, 246, Butantã, 3723-3131, http://www.larrecantofeliz.org.br/
Em um terreno de 28 000 metros quadrados, há 45 casas, noventa suítes e 72 apartamentos-enfermaria, além de um lago e uma igreja.
Mensalidade: de 2 500 a 7 600 reais

Lar Sant’Ana. Rua Bernarda Luiz, 129, Alto de Pinheiros, 3674-1600, http://www.larsantana.com.br/
Mantido pela Liga Solidária, o casarão conta com 127 quartos. Há a opção de passar o dia ali – e participar de aulas de tricô, inglês, artesanato etc. – pagando-se 70 reais.
Mensalidade: de 3 607 a 5 583 reais

Residencial Santa Catarina. Rua Leôncio de Carvalho, 98, Paraíso,
3177-2999, http://www.residencialsantacatarina.com.br/
Seu grande trunfo é a localização, pertinho da Avenida Paulista. São 125 flats distribuídos em dezesseis andares.
Mensalidade: de 6 300 a 9 400 reais

Solar Ville Garaude. Avenida Copacabana, 536, Alphaville, Barueri, SP,
4193-1020, http://www.solarville.com.br/
Funciona desde 1998. Atualmente, apenas um de seus 54 apartamentos está vago.
Mensalidade: 4 300 reais


Quarta-feira, 2 de abril de 2008

21 de dez. de 2008

Alô? Nós seqüestramos o seu filho!

POLÍCIA

A chocante informação, dada num telefonema, deixou angustiada a empresária Carina Ávila, no fim de março. Se desligasse, seu filho mais velho, Camilo, de 19 anos, seria morto a tiros no mesmo instante, sem nenhuma piedade. Pelo menos era o que prometia a voz nervosa e agressiva do outro lado da linha, enquanto pedia 3 000 reais pelo resgate. "É isso mesmo, dona, ou paga ou vai ter sangue", dizia o interlocutor. Dois dias antes, Camilo havia viajado com os amigos para uma micareta no interior do estado. Ela bem que tentou localizá-lo pelo celular, que tocou, tocou, até entrar o recado da caixa postal. A dúvida entre acreditar na ligação a cobrar e confiar que tudo não passa de um trote de extremo mau gosto já infernizou muitas famílias paulistanas. Há cerca de dois anos a cidade vive uma epidemia de ligações telefônicas anônimas falando sobre acidentes em estradas, seqüestros de parentes ou ameaças de morte. É a nova modalidade de bandidagem, o telemarketing do crime. Embora os enredos sejam um pouco diferentes, todos os telefonemas terminam em extorsões de dinheiro. E são todos falsos.

– Seu filho tem um Gol preto, não tem? Ele falou para a senhora que viajou? Então, pegamos ele na estrada. Está chorando agora. Quer ouvir ele morrendo?

O celular de Carina Ávila soou em casa, enquanto ela preparava o jantar. Todas as informações que ouviu estavam corretas. Já atordoada, ela começou a negociar com o suposto seqüestrador.

– Meu marido não está em casa. Deixa eu falar primeiro com ele...

– Se a senhora desligar, eu atiro agora mesmo no seu filho.

De repente, Carina desligou. Ainda hoje, ela não sabe se por impulso ou descuido. Recorda-se apenas de ter passado os vinte minutos seguintes chorando compulsivamente, até que o filho ligou para casa. Divertia-se com os amigos e se arrumava para uma festa. Não atendeu o celular porque estava tomando banho. "Ninguém se prepara para receber uma ligação dessas, com ameaças a alguém da sua família", diz Carina. "Você fica sem reação, é tudo muito rápido. Mal dá tempo para pensar."

A empresária não pagou o resgate pedido, mas muitas outras pessoas caíram nessa arapuca. Segundo uma estimativa realizada pelo Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado (Deic), há pouco mais de seis meses, o golpe chegou a ocorrer cinqüenta vezes em um único dia na cidade. Não há dados oficiais, mas a polícia acredita que uma parte das vítimas acaba atendendo às exigências dos supostos seqüestradores. A armadilha varia de acordo com a criatividade dos bandidos (veja o quadro), mas a mecânica é sempre a mesma. Com um celular pré-pago ou clonado, difícil de ser rastreado pela polícia, eles telefonam para uma pessoa aleatoriamente (pegam o número na lista telefônica ou da agenda de algum celular que tenha sido furtado) e tentam ameaçá-la citando algumas informações pessoais. Os criminosos, a maioria presidiários ligados às organizações Primeiro Comando da Capital (PCC), de São Paulo, ou Comando Vermelho, do Rio de Janeiro, aproveitam a sensação de insegurança das famílias para deixá-las desesperadas, induzindo-as a depositar de 500 a 20.000 reais em uma conta bancária aberta com documentos falsos.

A variante mais freqüente é a do seqüestro. Primeiro, o bandido escolhe um número ao acaso. Liga e, se quem atender for um empregado ou uma criança, apresenta-se como um antigo amigo da família e inventa uma desculpa qualquer para obter informações sobre o dono da casa, como local de trabalho, a que horas costuma chegar, se tem filhos, onde estudam e, por fim, o número do celular. Em seguida, ele telefona para a vítima. Em tom bem mais agressivo, diz que seqüestrou um familiar e enumera o que descobriu como prova de que está falando a verdade. "Pediram 5.000 reais para libertar meu marido", diz a dona-de-casa J.S., que passou pelo drama em novembro do ano passado. "Fiquei imaginando uma arma apontada para a cabeça dele. Só não depositei o dinheiro porque consegui falar com a secretária do meu marido e soube que ele estava em uma reunião, são e salvo."

Outra modalidade comum é a do "trote do bombeiro". O criminoso se passa por um oficial da corporação, relata um acidente e diz que há um parente do dono da casa entre as vítimas. Então solta a isca: pede para confirmar algumas informações e, aproveitando-se do nervosismo que provoca, descobre dados do "acidentado". É quando a abordagem muda. O falso bombeiro se torna seqüestrador e exige resgate imediato. "Tocou meu telefone e um homem avisou que meu filho tinha sido atropelado", relata o bancário aposentado Keizo Uehara. "Quando comecei a perguntar detalhes, se tinham chamado a ambulância, onde exatamente era o acidente, o assunto mudou. Disseram que era um seqüestro." Enquanto Uehara falava com o suposto seqüestrador, sua mulher, utilizando uma segunda linha telefônica de casa, conseguiu confirmar que estava tudo bem com seu filho. Traumatizados, deixaram o telefone fora do gancho por uma semana.

Esse tipo de crime, que não aparece nas estatísticas policiais, se alimenta do medo que qualquer morador de uma metrópole como São Paulo sente de ser vítima da criminalidade. A polícia, é verdade, vem registrando queda em alguns índices. No primeiro trimestre deste ano, o número de homicídios e roubos de veículos, por exemplo, diminuiu em relação ao mesmo período do ano passado. Já o número de seqüestros mantém-se estável. Entre janeiro e março foram registradas 28 ocorrências no estado. Todas reais, com os ingredientes que fazem dessa modalidade um crime hediondo e bárbaro. São Paulo também tem cerca de noventa casos de seqüestros-relâmpago por mês – um a cada oito horas. É um ambiente dos mais favoráveis para que o golpe do celular assuste tanto. Ele é aplicado aleatoriamente e, por isso, atinge qualquer classe social, em um estado com 22.milhões de celulares e 12,5 milhões de linhas fixas, ou seja, praticamente um telefone para cada habitante. "Eu já vi o pessoal pegar desde empresário até faxineira", diz José Elias de Godoy, capitão da Polícia Militar e consultor de segurança. "O valor pedido pelos criminosos varia de acordo com o bairro. Se a vítima mora em áreas nobres, como Jardins ou Moema, eles jogam mais alto."

De acordo com a própria polícia, o trote do terror é um subproduto do uso de celulares pelos detentos de todo o país. Começou há cerca de quatro anos, dentro da Penitenciária Carlos Tinoco da Fonseca, em Campos (RJ). Cinco membros do Comando Vermelho criaram um conto-do-vigário eletrônico, ainda sem ameaças. Tratava-se de uma armação para convencer a vítima de que fora sorteada numa promoção de empresas de telefonia. Para receber os "prêmios" – televisores com tela plana, DVDs ou computadores –, o interessado deveria comprar cartões com créditos de celular pré-pago, usados depois pelos bandidos para se comunicarem. Em quatro meses, o bando lesou mais de 1 500 pessoas em São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Minas Gerais. O estilista Clodovil Hernandes foi um dos enganados. Gastou cerca de 2.500 reais em 94 cartões e passou 86 códigos de segurança a golpistas. "Ficamos quatro meses investigando a quadrilha e estudando o procedimento dela", afirma o diretor do Deic, Godofredo Bittencourt Filho. "Quando pedimos ao Rio de Janeiro a transferência daqueles presos para uma penitenciária mais segura, eles acabaram sendo apenas separados em cadeias diferentes. Foi o ponto de partida para a epidemia."

Espalhar a quadrilha pioneira foi o equivalente a criar filiais da escolinha do novo crime. Em pouco tempo o golpe se proliferou pelos presídios fluminenses. E não demorou para chegar às celas paulistas. Os resgates arrancados servem para os presos comprarem outros telefones, pagar o jumbo (comida e roupas entregues pelos familiares semanalmente), subornar funcionários, arranjar visitas íntimas com prostitutas e contratar advogados. Difícil é barrar o esquema. Os bloqueadores de celular têm eficiência relativa. Desde 2001, quando o PCC comandou a maior rebelião da história do sistema carcerário a partir do antigo Complexo do Carandiru, a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) instalou o equipamento em oito dos 74 presídios paulistas, entre eles três considerados de segurança máxima. Cada um custou entre 100 000 e 200 000 reais, investimento que não acompanhou as mudanças de tecnologia dos celulares. Hoje, segundo a polícia, nessas prisões são bloqueados os sinais de apenas uma das três operadoras que atuam em São Paulo. Enquanto a solução não vem, a recomendação é evitar o pânico. "Só existe um conselho: não leve a sério, não ceda", afirma o especialista de segurança Ricardo Chilelli, da empresa de consultoria RCI First. "Os bombeiros não ligam a cobrar e os seqüestradores normalmente não agem tão apressadamente. Bata o telefone e procure seu familiar."


Depoimentos de quem viveu o drama

– Alô? Alô? Aqui é dos bombeiros. Acabou de acontecer um acidente. Tem alguém de sua casa fora?

Foi isso o que a avó da universitária Ana Clara Rafaldi, 22 anos, ouviu ao telefone, no segundo sábado de abril. Nervosa – era o horário em que a filha costumava estar no trânsito, voltando do trabalho –, passou a ligação para a neta. "Aí ele mudou o tom de voz. Disse que era um seqüestro e que queria 10 000 reais. Perguntou quanto eu tinha de dinheiro, se havia ouro em casa...", conta. Desesperada, Ana Clara começou a negociar com o bandido. "Não tinha como confirmar com minha mãe. Ele me obrigava a não sair da linha." Por fim, no meio da tensão, a suposta "seqüestrada" chegou em casa. Alívio, nada tinha acontecido.

– Vou logo abrir o jogo! Estou com fotos da criança e nós sabemos de tudo. É melhor você colaborar.

Essas palavras assustaram a secretária Iara Aparecida Silva, 32 anos. O bandido, que se identificou como Nandinho, mostrava que conhecia o bairro onde ela trabalhava e a rotina da família. "Duas semanas antes, eu tinha sido assaltada", relata. "Levaram documentos e fotos de minha filha. Por isso fiquei com medo de que fizessem alguma coisa. Entrei em pânico." Iara não hesitou e seguiu as instruções. No caso, teve de comprar 800 reais em cartões de recarga para celular e passar os números para o tal Nandinho. Para sua surpresa, o criminoso ligou novamente no dia seguinte. "Ele teve a cara-de-pau de me pedir desculpa, disse que falava do presídio de Bangu I e que lá eles tinham uma cota diária de ligações para cumprir."

– Estamos com seu pai aqui. É um seqüestro. Se você não nos arrumar 2 500 reais, ele morre!

"Foi o pior dia da minha vida", diz a advogada D.A.R., 26 anos. "Ele pediu que eu deixasse o dinheiro em um envelope, numa esquina da Avenida Paulista." Um detalhe levou-a a acreditar na história: o número identificado pelo celular de D. era do seu próprio pai. "Tive certeza de que estavam com ele." Disse ao bandido que não tinha como conseguir todo o dinheiro àquela hora. Acabou ganhando um desconto. "Fiz uma vaquinha com os colegas do escritório e levantamos 1 000 reais", conta. "Segui as instruções e deixei o dinheiro no local combinado." A seguir, correu para casa e encontrou o pai, bravo, porque tinham lhe roubado o celular na saída do trabalho.

– Esta ligação está conectada com o coração de seu pai. Se você desligar...

O universitário Fábio Silberstein, 22 anos, viveu o drama no dia 13 de fevereiro. Com informações sobre a empresa de sua família, o bandido fez ameaças e disse que estava com seu pai. Silberstein pediu para falar com ele. "Mas me disseram que o haviam sedado", lembra. O pedido inicial era de 15 000 reais. Foi reduzido para 5 000 reais. Sempre seguindo as instruções via celular, ele foi até o banco do qual é correntista e fez o saque. Ao chegar a outra agência, para depositar o dinheiro na conta do bandido, foi advertido pelo gerente. "Ele disse que o crime já tinha ocorrido ali, que não era para eu cair nessa." Decidiu arriscar e não pagar. Nada aconteceu com seu pai. E, como lembrança, até hoje Silberstein tem o número gravado em sua agenda do celular, sob o nome de "bandido".


As ameaças mais comuns

• LIGAÇÃO PREMIADA
Foi a primeira fórmula aplicada pelos bandidos. A vítima recebe a ligação de um suposto funcionário de alguma empresa telefônica, que a parabeniza por ter ganho prêmios. Entretanto, para recebê-los e continuar concorrendo a outros, deve comprar cartões de celular pré-pago e passar os códigos para outra pessoa que entraria em contato. Com isso, os bandidos carregam os créditos de celulares de presos ou criminosos foragidos.

• ACIDENTE NA FAMÍLIA
Quem liga se identifica como um oficial do Corpo de Bombeiros. Relata um acidente e diz que há um familiar do dono da casa entre as vítimas. Pede então para confirmar algumas informações e, aproveitando-se do nervosismo que provoca, acaba descobrindo dados do "acidentado". É quando o tom da conversa muda. O bombeiro se torna seqüestrador e exige resgate imediato. Pede o número do celular para ir orientando a pessoa até o local do pagamento.

• AMIGO SEQÜESTRADOR
Geralmente ocorre em duas fases. Primeiro o bandido liga para a casa da vítima se apresentando como um amigo dela e fala com algum familiar ou empregado. Puxa conversa, tenta arrancar mais informações sobre a pessoa e pede o celular. Na segunda fase, telefona para a vítima e, em tom agressivo, lista as informações que obteve. Hora do xeque-mate: afirma que seqüestrou um parente e pede resgate.

• POLICIAL ASSASSINO
Dizendo-se policial ligado a um grupo de extermínio, o bandido pede dinheiro para não matar a vítima. Com o objetivo de amedrontar o parente que atende à ligação, descreve algo da rotina da família e garante que tem um dossiê completo. Há uma versão mais light do golpe, na qual o suposto policial diz que o filho da vítima foi encontrado com drogas ou armas e propõe, em troca de suborno, não incriminá-lo.


Para não cair no golpe

• Decore a rotina diária de seus familiares mais próximos, com as rotas e os horários de suas atividades. Guarde na agenda os telefones de colegas e amigos que, numa emergência, possam ajudar a localizá-los.

• Tenha sempre arquivada a relação de empregados e ex-empregados da casa, com os respectivos dados completos, para eventuais investigações policiais.

• Oriente todos em casa, inclusive funcionários de condomínio, a não passar informações pessoais dos moradores, sob qualquer justificativa ou ameaça. A maioria dos golpes bem-sucedidos começa nessas conversas triviais.

• O telefone residencial só deve ser repassado a familiares e amigos. Para as outras pessoas, dê o comercial ou o do celular (que pode ser mudado com muito mais facilidade que o fixo).

• Se houver um telefone instalado na portaria de seu prédio, passe esse número – e não o de sua casa – para os serviços de entrega em domicílio.

• Quando fizer um pagamento com cheque, não escreva no verso o número do telefone residencial. Anote o número comercial, mesmo que seja do marido, da mulher ou do filho.

• Ao receber uma ligação a cobrar, desligue de imediato se não reconhecer o interlocutor. Não prolongue a conversa. Quando de fato houver um acidente, o parente da vítima será informado por um funcionário do hospital ou da delegacia da área, que saberá o nome completo da vítima. Os funcionários do Corpo de Bombeiros não ligam para informar sobre acidentes, muito menos a cobrar.

• Caso telefonem para comunicar um acidente ou anunciar um prêmio – isso é raríssimo, mas uma vez na vida pode acontecer –, peça o nome completo do interlocutor e o telefone para contato. Desligue e retorne o telefonema.

• Em caso de ameaça pelo telefone, desligue e tente encontrar seu familiar. Só procure a polícia se não encontrá-lo ou se as ligações se tornarem constantes.

em parceria com Rodrigo Brancatelli.


Quarta-feira, 17 de maio de 2006.

20 de dez. de 2008

Esquadrão da limpeza

CIDADE
Eles são 13 000, chegam a correr meia maratona por dia e enfim ganharam direito a protetor solar

Os 4.000 coletores e 9.000 varredores da cidade são responsáveis por recolher, todos os dias, 15.000 toneladas de lixo. Enquanto realizam esse trabalho, passam despercebidos por boa parte da população. Mas basta cruzarem os braços, como no último fim de semana, para se tornarem o centro das atenções. Durante a greve de lixeiros que durou de sexta (13) a segunda (16), 3.000 toneladas de detritos acumularam-se nas calçadas paulistanas. "Como é um serviço essencial, fomos obrigados a manter 70% dos trabalhadores na ativa", afirma o presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Asseio e Conservação e Limpeza Urbana (Siemaco), Moacyr Pereira. A pressão deu resultado e os pisos salariais da categoria sofreram um reajuste de 3,55%. Passaram a 563 reais (varredores) e 669 reais (coletores). Com os adicionais de insalubridade, eles vão receber, respectivamente, 639 reais e 822 reais por mês.

Funcionários de sete empresas que prestam serviços para a prefeitura – dois consórcios responsáveis pela coleta do lixo e cinco companhias que cuidam da varrição das ruas –, os lixeiros trabalham oito horas por dia, em turnos diurnos e noturnos. De acordo com o sindicato, 85% dos garis são homens – a maioria na faixa dos 30 anos. Mais da metade têm, no máximo, a 4ª série do ensino fundamental e, destes, 4% são analfabetos (veja o quadro). Diariamente, os varredores andam cerca de 6 quilômetros e os coletores correm cerca de 20 quilômetros (quase meia maratona).

Esses profissionais enfrentam a rotina fétida usando somente luvas e boné como proteção. "O blusão de manga comprida faz parte do uniforme apenas no inverno", diz Ricardo Acar, presidente da EcoUrbis, uma das concessionárias. No resto do ano, os braços ficam vulneráveis. Uma de suas antigas reivindicações foi atendida na greve da semana passada: as empresas terão de fornecer protetor solar. "A Organização Mundial de Saúde recomenda o protetor a todos os que trabalham sob o sol", afirma a dermatologista Ligia Kogos, badalada por sua clientela vip. Nas outras duas vezes em que os lixeiros pediram o benefício, os patrões não atenderam. "Apenas priorizamos questões mais importantes, como o salário", diz Ariovaldo Caodaglio, presidente do Sindicato das Empresas de Limpeza Urbana no Estado de São Paulo (Selur). "Desta vez ficou acertado que iremos fornecer o protetor, mas só daqui a três meses, após uma análise técnica."


QUEM SÃO OS GARIS
• Há duas vezes mais lixeiros que carteiros em São Paulo
• Ganham 639 reais (varredores) e 822 reais (coletores)
• 54% têm, no máximo, a 4ª série do ensino fundamental (destes, 4% são analfabetos)


Quarta-feira, 25 de abril de 2007

19 de dez. de 2008

Ele escreve em todas as linhas

PAULISTÂNIA
Frederico Barbosa, o poeta da Casa das Rosas, do museu, da biblioteca...

O poeta Frederico Barbosa quase não escreve mais. Mas ele continua acreditando na força da poesia. Ele continua poeta. Seu último livro, A Consciência do Zero, foi lançado em 2004. "Aí veio isso aqui", diz, referindo-se à Casa das Rosas - Espaço Cultural Haroldo de Campos de Poesia e Literatura, sob sua direção desde que foi reaberta há exatos quatro anos. "De lá para cá, devo ter escrito no máximo uns dois poemas. Agora eu faço muita coisa em função da poesia dos outros, do ?poetariado? de São Paulo." Ele continua poeta.

Não é pouca coisa. Os cursos realizados até hoje na Casa das Rosas, na Avenida Paulista, somam um total de 9 mil inscritos. Por ali, saraus e lançamentos de livros são constantes - na última terça, a entidade inaugurou uma livraria especializada em poesia. A Poiesis, organização presidida por Frederico, também administra o Museu da Língua Portuguesa, sucesso de público e de crítica, na Luz; a Casa Guilherme de Almeida, que deve ser reaberta no ano que vem como museu literário, em Perdizes; e o projeto cultural São Paulo: Um Estado de Leitores. Há dois anos, o poeta foi curador da Biblioteca Alceu de Amoroso Lima, em Pinheiros - transformou-a na primeira das bibliotecas temáticas da Secretaria Municipal de Cultura, um espaço dedicado à poesia. "Acredito realmente que a literatura pode ser boa para a vida das pessoas", afirma. Ele continua poeta. Um fabricante de poetas.

Nascido no Recife em 1961, Frederico Barbosa sempre viveu no meio dos livros. Seu pai, João Alexandre Barbosa (1937-2006), foi um importante crítico literário brasileiro e tinha uma biblioteca particular de cerca de 20 mil títulos. "Ele era uma das pessoas mais cultas que este país já teve", elogia Frederico. "A literatura esteve presente até na escolha de meu nome, uma homenagem ao poeta Federico García Lorca." Em 1967, convidado pela Universidade de São Paulo (USP), mudou-se para a capital paulista."Foi um choque. Lá eu morava de frente para o mar. Aqui fomos para a Avenida São Luís", lembra, contando que depois se mudaram para a Vila Madalena e, em 1971, para a Rua Monte Alegre, em Perdizes, onde sua mãe mora até hoje.

Adolescente, foi um fanático torcedor do Palmeiras. E assim, entre idas ao Parque Antártica e a adoração aos livros do pai, fez-se poeta. Era década de 70 e o alviverde desfilava em campo sua "segunda academia", um time regido pelo talento de Ademir da Guia. "Meu maior ídolo na face da terra", exagera. Em 1975, o poeta João Cabral de Melo Neto (1920-1999) publicou um poema chamado Ademir da Guia, no qual exaltava o ritmo próprio do craque. "Achei aquilo maravilhoso. O cara reproduziu direitinho o movimento do Ademir", recorda-se, recitando-o ("Ademir impõe com seu jogo/ o ritmo do chumbo (e o peso),/ da lesma, da câmara lenta,/do homem dentro do pesadelo..."). "Eu ia para o estádio, via o Ademir jogar e me lembrava do poema. Foi aí que comecei a escrever também."

Mas até o primeiro livro ainda haveria muito. Frederico foi estudar Física na USP e ensinava Matemática no Colégio São Domingos, em Perdizes, quando, em 1981, decidiu largar a faculdade. "Continuei dando aulas à tarde, mas comecei um projeto pessoal de ler uma peça de teatro por dia", relata. Acabou não embarcando no teatro. Preferiu cursar Letras, no ano seguinte, especializando-se em Grego.

O jovem professor de Matemática mudou de time e abraçou a Literatura. Passou pelos colégios Equipe, Logus e Anglo, em 20 anos de magistério. Em 1990, lançou Rarefato. Depois vieram Nada Feito Nada (1993), vencedor do Prêmio Jabuti, Contracorrente (2000), Louco no Oco Sem Beiras (2001), Cantar de Amor Entre os Escombros (2002), Brasibraseiro (2004) - em parceria com Antonio Risério, terceiro colocado no Jabuti - e o já citado A Consciência do Zero (2004).

Quando foi convidado para dirigir a Casa das Rosas, em 2004, precisou deixar de lado a carreira de professor. O desafio de reorganizar o espaço e transformá-lo em um centro cultural dedicado à poesia era maior ainda a ele, pela ligação afetiva com o poeta e tradutor Haroldo de Campos (1929-2003) - a biblioteca de 20 mil volumes que pertenceu ao intelectual acabou cedida à instituição. "Ele freqüentava a minha casa desde que eu era pequeno", lembra, com voz indisfarçavelmente comovida. Quatro anos depois, a Casa das Rosas se tornou ponto de encontro de poetas e o acervo de Campos está totalmente catalogado e informatizado.

Apesar de não ter nascido na capital paulista, Frederico se considera um legítimo paulistano. "Sou absolutamente apaixonado por São Paulo", não se cansa de repetir, com a autoridade de quem viveu a maior parte do tempo aqui e o conhecimento de quem passou algumas temporadas no exterior. "Aqui é a metrópole da diversidade no mundo. Não existe cidade mais plural do que esta."

Desde 1988, mora em um apartamento na Rua Caetés, em Perdizes - de 1993 para cá, com sua segunda mulher e a filha dela. No tempo livre, passeia pelo bairro: Parque da Água Branca, restaurantes das redondezas e um cineminha no Shopping Bourbon Pompéia - de madrugada. "Gosto de pegar a sessão da meia-noite", conta. "Qualquer filme, só pelo prazer de ir ao cinema."

Ele já exprimiu o amor por São Paulo em diversos de seus poemas. Em Pernambucano Paulistano, por exemplo, escreveu: "cada são paulo a que retorno/ toca tanto que é ruim/ na marginal eu quase choro/ só porque me sinto vir". Referia-se a uma vez que voltava, de carro, de Tamandaré, cidade litorânea de Pernambuco onde havia passado as férias. "Quando cheguei à Marginal, senti aquela poluição fedorenta e vi aquele tempo horroroso", lembra. "Liguei o rádio e começou a tocar Sampa, de Caetano Veloso. Meus olhos ficaram marejados." Ao lado, sua mulher - paulistana - perguntou se ele estava chorando de tristeza por voltar ao caos. "Não", respondeu. "É emoção. Esta é minha cidade. Que cidade linda!"

E é com essa devoção que ele diz, discreto, em tom de confidência, que a única honraria que gostaria de ganhar é o título de "cidadão paulistano". "Nenhuma outra comenda. O resto é tudo uma grande bobagem."


Domingo, 7 de dezembro de 2008

18 de dez. de 2008

Seguuuura o peão!

DIVERTIMENTO
Eles têm curso superior, média de 30 anos, são nerds assumidos e... viciados em jogos de tabuleiro

No apartamento de 80 metros quadrados em que mora, no Butantã, o físico Fabio Tola reserva um quarto só para guardar seus 397 jogos de tabuleiro, na maioria importados. "Compro dois ou três por mês", conta ele, que calcula já ter gasto 8 000 dólares com a coleção. Tola passa 25 horas por semana queimando neurônios para vencer sua mulher, Lucimara, também fã de tabuleiros, ou amigos. "Em média, levamos duas horas em cada partida." O físico engrossou a lista dos 200 participantes da 15ª Festa do Peão de Tabuleiro, no restaurante Aneto, no Jabaquara. O evento começou às 15 horas de sábado e durou até a manhã seguinte. Nerds assumidos (eles não se incomodam com o apelido), os apaixonados por jogos de tabuleiro estão na faixa dos 30 anos. Boa parte é de profissionais liberais, com curso superior – principalmente na área de ciências exatas. As poucas mulheres, cerca de 20% dos freqüentadores da festa, não se sentem intimidadas. "Sempre fui meio moleca", diz a analista de sistemas Érica Briones Graciano. "Já estou acostumada a gostar de brincadeiras de meninos, e ser minoria não me incomoda."

Esqueça os manjados War, Banco Imobiliário, Diplomacia, Combate... Essa turma é obcecada pelos chamados jogos modernos, que dependem muito mais de estratégia do que de sorte. Têm poucas e claras regras, que fazem com que os participantes interajam bastante. Da Alemanha, vêm os mais prestigiados, como Thurn and Taxis, Wallenstein e Tikal. "Meu preferido é o Tikal, cujo objetivo é conquistar riquezas arqueológicas", diz Ricardo Christe Homsi, gerente de uma produtora de internet. "Inexiste o fator sorte, já que não usamos dados."

O maior sucesso no mercado brasileiro continua sendo o Banco Imobiliário, criado em 1933 pelo americano Charles Darrow. Vende 80 000 unidades por ano. "O Brasil, diferentemente de países europeus, não tem um longo e rígido inverno que obrigue as pessoas a ficar mais tempo em casa", explica Aires Fernandes, diretor de marketing da Estrela. "Como a procura não é tão grande, lançamos apenas de dois a quatro jogos desse gênero por ano." Em versão nacional, um jogo de tabuleiro moderno sai por cerca de 45 reais – títulos estrangeiros custam 25 dólares, em média.

Vencer uma partida, óbvio, é a meta de todo jogador. Mas criar um jogo e conseguir comercializá-lo é o sonho da maioria desses aficionados. O jornalista André Zatz e o engenheiro mecânico Sergio Halaban chegaram mais do que lá. Em fevereiro, uma marca alemã lançou o Jogo da Fronteira, invenção da dupla. Ganha quem consegue passar com mais mercadorias por uma fronteira. Após o sucesso estrangeiro, a Estrela decidiu apostar no produto. Desde maio, 30 000 unidades estão à venda em lojas do país. "É um privilégio conseguir espaço na preferência do exigente consumidor de jogos de tabuleiro", afirma Zatz. Uma jogada digna de Wolfgang Kramer. Nunca ouviu falar? "Trata-se do decano dos autores modernos alemães. Inventou mais de 100 jogos."


Sem cartas marcadas
Os jogos de tabuleiro modernos são baseados na estratégia. Dependem minimamente da sorte, têm poucas regras e propiciam bastante interação. Alguns exemplos:

THURN AND TAXIS
Os participantes devem instalar postos de correio em cidades alemãs. O jogo foi premiado com o Spiel des Jahres 2006, o Oscar dos games

GENIAL
Espécie de dominó com peças hexagonais coloridas. O objetivo é montar grupos da mesma cor

JOGO DA FRONTEIRA
Vence quem consegue passar com suas mercadorias pela fronteira

TICKET TO RIDE
No jogo, ambientado no século XIX, os participantes têm de construir ferrovias ligando as principais cidades americanas


Quarta-feira, 6 de setembro de 2006

17 de dez. de 2008

Santo para toda obra

LIVRO
Em Frei Galvão: Arquiteto, Benedito Lima de Toledo conta a história do homem que projetou e construiu o Mosteiro da Luz

Na próxima sexta, em missa a ser celebrada pelo papa Bento XVI, o franciscano Antônio de Sant'Anna Galvão se tornará o primeiro santo nascido no Brasil. O momento, efusivo para os católicos, aquece o mercado religioso: além de artigos como imagens e medalhinhas, há pelo menos uma dúzia de livros à venda sobre o novo santo. Em Frei Galvão: Arquiteto (Ateliê Editorial, 72 páginas, 30 reais), entretanto, sua faceta milagrosa é deixada de lado pelo arquiteto e historiador Benedito Lima de Toledo. "Ele foi, sem dúvida, um importante arquiteto do século XVIII", diz o autor. "Tinha uma percepção muito boa da paisagem. Preocupava-se, por exemplo, com ventilação e iluminação solar."

Quando, em 1765, o nobre português Luís Antônio de Souza Botelho Mourão assumiu o governo da capitania de São Paulo, a pequena capela em honra a Nossa Senhora da Luz, em uma região despovoada conhecida como Campo da Luz, estava em ruínas. Erguida no início do século XVII, dentro dela havia uma imagem policromada da santa, trazida de Portugal. Botelho Mourão ordenou que a igreja fosse reformada, pois queria um espaço para a celebração da festa de Nossa Senhora dos Prazeres, da qual era devoto. À frente dessa obra, frei Galvão mostrou seu talento como arquiteto. "Ele acabou reconstruindo toda a igreja", conta Toledo.

Nascido em 1739 em Guaratinguetá, no Vale do Paraíba, o jovem Antônio de Sant'Anna Galvão foi mandado por seus pais para estudar no Seminário dos Jesuítas de Belém em Cachoeira, na Bahia. Ficou ali dos 13 aos 19 anos. Conheceu diversas igrejas do Nordeste e iniciou seus estudos em arte e arquitetura. Aos 21 anos, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde foi ordenado sacerdote franciscano. Mais tarde, estabeleceu-se em São Paulo. No Convento de São Francisco, no largo homônimo, fazia pregações e dedicava-se à função de porteiro da casa, recebendo os fiéis que ali chegavam. Durante esse período, frei Galvão testemunhou – há quem acredite que projetou – a execução de uma grande reforma na igreja contígua ao convento. Como confessor de irmãs religiosas, acabou convencido da necessidade de uma casa de recolhimento para essas mulheres na cidade. Nascia a idéia do Mosteiro da Luz, que seria fundado em 1774.

Catorze anos se passaram até que o convento ficasse realmente pronto e outros catorze para que a igreja fosse inaugurada, somente em 1802. Frei Galvão foi arquiteto, mestre-de-obras, servente e carpinteiro – assumiu o trabalho braçal ao lado dos escravos cedidos por famílias nobres para a construção. A técnica aplicada, a taipa de pilão, era comum na época. "São Paulo era uma cidade de barro", conta Toledo. "Todas as suas residências eram assim." Hoje são poucas as construções do tipo remanescentes – entre as quais, casas bandeiristas como a do Sítio da Ressaca, no Centro Cultural Jabaquara. Uma percepção importante de frei Galvão fez com que ele alterasse, durante a obra, a entrada da capela, originalmente com a face voltada para o sul. Foi uma previsão acertada de que a região onde hoje está a Avenida Tiradentes seria, futuramente, movimentada. Então criou novo frontispício, e a face principal da igreja passou a ser daquele lado. É por isso que o altar, cuja disposição original foi mantida, está à esquerda de quem entra, e não à frente, como de praxe. Para quem quiser conferir, a igreja fica na Avenida Tiradentes, 676, e permanece aberta das 6h30 às 16h30. Missas são celebradas ali diariamente (segunda a sexta, às 7h; sábado, às 8h e às 16h; domingo, às 8h, às 10h30 e às 16h).


Quarta-feira, 9 de maio de 2007

16 de dez. de 2008

Eles sabem que podem morrer

ESPECIAL
A brutalidade levou o pânico a São Paulo e chocou o país. Em menos de quatro dias, a Polícia Militar perdeu mais gente do que em todo o ano passado – foram 22 mortes em 2005, contra 23 entre a noite de sexta-feira (12) e a manhã de terça (16). Outros 22 PMs ficaram feridos. A carnificina, executada pelos facínoras da organização criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), teve como marca a covardia. Os 93 000 membros da Polícia Militar (26 000 locados na capital) juraram morrer, se necessário for, para garantir a segurança do cidadão comum. Mas catorze dos policiais assassinados nem ao menos tiveram a chance de se defender. Atacados durante a folga, eles foram surpreendidos à paisana. Entre as outras nove vítimas, assassinadas em serviço, estavam incluídos até mesmo dois bombeiros, profissionais dedicados somente a realizar salvamentos e a enfrentar tragédias. O dia-a-dia dos policiais militares é duro. Eles trabalham muito e ganham pouco. A carga horária é de doze horas de serviço seguidas de 36 de descanso, mas as horas extras são comuns. Sem contar os adicionais, o piso salarial de um soldado em início de carreira é de 1 240 reais. No extremo oposto da hierarquia, a mais alta patente, a de coronel, tem soldo básico de cerca de 5 000 reais. Apesar dos baixos rendimentos e da árdua rotina, os homens e as mulheres de farda se colocam diariamente na linha de fogo entre a sociedade e os criminosos. Conheça a seguir a história de nove policiais militares que poderiam dar a vida pela sua.

"Sempre quis fazer carreira militar. Tenho orgulho da minha profissão"
ASPIRANTE-A-OFICIAL JULIANA CUNHA,
24 anos, do 11º Batalhão de Policiamento Metropolitano, na região central

Na última terça-feira, quando o caos ainda tomava conta da cidade, policiais que faziam a ronda pelo bairro da Bela Vista encontraram um casal com uma cópia do estatuto do PCC e mais de 200 papelotes de cocaína. Comandando esses PMs (e mais outros duzentos e tantos, só naquele dia) estava uma bela jovem, a aspirante-a-oficial Juliana Cunha, recém-formada pela Academia de Polícia Militar do Barro Branco. "É impressionante como eles são organizados", comenta ela sobre o fato de ter pego o exemplar da cartilha, manuscrita. Vinda do interior para realizar o sonho de se tornar policial, Juliana está em São Paulo há cinco anos. "Sempre quis fazer carreira militar. Tenho orgulho da minha profissão", diz, sorrindo. "Almejo chegar a coronel." No fim deste ano, quando deve ser promovida a tenente, subirá um degrau desse percurso. Com 1,61 metro de altura e jeito meigo, é difícil imaginá-la combatendo o crime com pulso firme. Grave engano. "Sei me impor quando é preciso", afirma. E é com essa mesma determinação que ela dribla os preconceitos por ser mulher – o contingente feminino representa 10% da PM. Vaidosa, precisa se conter no trabalho. Tem de prender os longos cabelos (que vão até a cintura) em um coque e pegar leve na maquiagem. "Só uso um batonzinho, nada que chame atenção." Distantes 230 quilômetros, seus pais é que estão aflitos com a recente onda de terror. "Liguei para minha mãe todos os dias", conta. Se pensa em voltar à calma do interior? "Não. Gosto de trabalhar aqui", afirma. "Todas as carreiras têm seu risco, né?"

"Treinamos muito, mas praticamos pouco na vida real. É bom que seja assim"
TENENTE ADRIANO GIOVANINNI,
35 anos, do Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate)

Os colegas da faculdade de engenharia mecatrônica duvidavam que Adriano Giovaninni fosse mesmo policial militar. "Eu sempre fugi de brigas", explica o tenente. "E as pessoas esperam que os policiais sejam truculentos como os de filmes de ação." Pois foi justamente o autocontrole que ajudou Giovaninni a fazer carreira no Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate). Aos 35 anos de idade, ele deverá ser promovido nesta semana a capitão da tropa. Vai comandar setenta homens, entre eles seis atiradores de elite, doze especialistas em desarmar bombas e seis negociadores (encarregados da comunicação entre a polícia e criminosos em situações com reféns). Convocado para atuar no chamado gerenciamento de crises, o Gate tem em seus quadros apenas policiais aprovados em rigorosos testes. "Treinamos muito, mas praticamos pouco na vida real. É bom que seja assim", diz o tenente. Sangue-frio e boa aptidão física são necessários porque as missões do Gate tendem a não ter hora para acabar. É em momentos como os da semana passada que a companhia mais trabalha (entre outras missões, a tropa invadiu seis presídios rebelados e desativou seis granadas). "Um atirador de precisão já ficou 23 horas com a mira preparada e não recebeu ordem para atirar", exemplifica. Se a ordem viesse, ele teria de estar firme para acertar o tiro. Capazes de atingir um alvo a 50 metros de distância, esses profissionais trabalham com um fuzil de calibre 7,62, com mira óptica, mas pouco o usam. Em dezoito anos de existência do grupo, apenas seis bandidos foram mortos pelos atiradores de elite. "Em 98% dos casos, a negociação resolve o conflito", conta o tenente Giovaninni.

"Já perseguimos seqüestradores e impedimos uma jovem de se matar no Viaduto do Chá"
SARGENTO ARTHUR GENEROSO FILHO,
42 anos, das Rondas Ostensivas com Apoio de Motocicletas (Rocam)
SOLDADO REGINALDO BERNARDES,
40 anos, das Rondas Ostensivas com Apoio de Motocicletas (Rocam)

Nada irrita mais o sargento Arthur Generoso Filho do que ficar preso no trânsito caótico de São Paulo nos fins de semana. Um dos 190 policiais que fazem parte das Rondas Ostensivas com Apoio de Motocicletas (Rocam), ele vive da velocidade. Generoso está acostumado a acelerar a Yamaha XT 600 da PM até chegar aos 160 quilômetros por hora, driblando outros veículos e perseguindo criminosos. "Não consigo mais andar de carro", diz o sargento, que agora também só usa moto aos sábados e domingos. "Em duas rodas, fica tudo mais fácil." O trabalho do policial, que já fez mais de 100 prisões a bordo de sua Yamaha, começa bem cedo, às 6h45. Sempre com um parceiro, ele percorre até as 18h30 quatro grandes corredores – Rua da Consolação e avenidas Ipiranga, Rebouças e Brasil. Roda por quarenta minutos e pára por outros vinte em algum cruzamento. Muitas vezes, quem lhe faz companhia é o soldado Reginaldo Bernardes, de 40 anos, que nunca havia andado de moto até entrar para a Rocam. Precisou passar por um treinamento de três meses que incluiu direção defensiva e ofensiva, além de técnicas para não se machucar (tanto) em caso de quedas. "Nós enfrentamos muitas coisas nas ruas", conta Bernardes. "Já perseguimos seqüestradores e impedimos uma jovem de cometer suicídio no Viaduto do Chá." Trabalhar sempre ao lado do mesmo parceiro também gera atritos. "É uma espécie de casamento em que sempre pode haver brigas e implicância. Mas tudo puramente profissional, claro."

"Depois de três anos, voltei a andar armado"
CAPITÃO ROGÉRIO GUIDETTE,
36 anos, do 4º Grupamento de Bombeiros, na Zona Sul

Acostumados a entrar em ação em situações no limiar entre a vida e a morte, os bombeiros têm aura de heróis. E muitas vezes são mesmo: resgatar vítimas de acidentes e tragédias faz parte de seu cotidiano. Na corporação há quinze anos, o capitão Rogério Guidette não é daqueles que desde pequenos sonhavam com a profissão. "Meu irmão se interessou, e eu praticamente fui no vácuo", lembra. Hoje, os dois são oficiais do Corpo de Bombeiros em São Paulo. Casado e pai de dois filhos, o capitão diz que as últimas ações do PCC mexeram com sua rotina. "Fiquei apreensivo", afirma. "Fazia três anos que minha arma estava guardada. Agora, voltei a carregá-la." No dia-a-dia, dedica-se mais às funções de comando que a patente exige. Mas, em situações graves, ainda sai à rua. "Imagine seis pessoas acidentadas, uma presa entre os destroços e um caminhão vazando combustível", explica. "É quando sou acionado." Ele orgulha-se do dia em que passava de carro pelo centro da cidade e viu o corpo de uma mulher que acabara de se jogar do Viaduto Santa Ifigênia. Estava de folga, mas foi ajudar. "Apresentei-me como bombeiro e peguei um kit de primeiros socorros que sempre trago comigo." Enquanto aguardava reforços, iniciou o processo de reanimação. Depois de um tempo, os batimentos cardíacos voltaram, e ela foi encaminhada ao hospital. "Não acompanhamos o que acontece em seguida. Infelizmente, imagino que muitas pessoas morrem no hospital, dois ou três dias depois", lamenta. Fora do trabalho, Guidette gosta de cantar – já integrou um coral de música sacra e até os 25 anos tinha uma banda de rock – e é ligado em cinema. "Fiz curso de câmera e de iluminador", conta ele, que planeja realizar vídeos institucionais para o Corpo de Bombeiros.

"Não pensava em nada, apenas em evitar uma tragédia maior no Pacaembu"
MAJOR WALTER MOTA,
43 anos, do 2º Batalhão da Polícia de Choque

Uma pilha foi a primeira coisa que acertou a cabeça do major Walter Mota na noite do último dia 4, durante o jogo entre Corinthians e River Plate, no Estádio do Pacaembu. Logo depois vieram um radinho de plástico, cadeiras arrancadas da arquibancada, pedras, baquetas, pias que pertenciam aos banheiros e até pedaços das catracas eletrônicas. Ainda assim, Mota e outros oito policiais militares seguiram firmes e fortes segurando a horda de torcedores que tentava invadir o gramado. Foi uma cena heróica, transmitida ao vivo pela TV. "Na hora não pensava em mais nada, apenas em evitar uma tragédia maior no Pacaembu", afirma o major. Há 25 anos na corporação, Mota é especialista em situações que envolvem multidões – faz a segurança em shows, jogos de futebol e eventos religiosos. Naquela noite de quinta-feira, ele estava posicionado na lateral do campo quando viu uma pequena confusão na arquibancada amarela, à sua esquerda. O jogo estava aos 37 minutos do segundo tempo, e centenas de corintianos começavam a forçar o portão de acesso ao gramado. Apenas com um capacete e um cassetete, Mota reuniu oito PMs que estavam próximos e se postou na frente da torcida. Mais doze policiais chegaram para ajudar quando o portão de fato foi quebrado. A mulher do major e seu filho de 14 anos não acompanharam as cenas pela TV, pois já dormiam em casa. "Minha mulher está acostumada a me ver nessas situações de risco", diz. "Ainda bem que, quando vou ao estádio com meu filho, por lazer, nunca vejo brigas entre torcidas. É porque eu torço para a Portuguesa."

"Já perdi a conta de quantas rebeliões em presídios tive de conter"
TENENTE GERSON PELEGATI,
38 anos, do 1º Batalhão de Polícia de Choque "Tobias de Aguiar"

A sigla Rota sempre foi temida pelos paulistanos. Criadas ainda no tempo do regime militar, as Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar passaram a década de 80 sendo chamadas de "a polícia que mata". Com cerca de 800 homens e 100 viaturas, o grupo faz parte do 1º Batalhão de Polícia de Choque e atua tanto no enfrentamento de motins de cadeia como na perseguição a assaltantes armados. "Já perdi a conta de quantas rebeliões em presídios tive de conter", diz o tenente Gerson Pelegati. "Não há meio-termo no nosso trabalho. Somos tratados ou como heróis ou como vilões." Pelegati não queria ser nem um nem outro. Professor primário em uma escola pública por dois anos, viu na Polícia Militar a oportunidade de encontrar uma carreira mais estável. Apesar de estar satisfeito com a mudança, diz que estabilidade foi uma das coisas que não encontrou ali. O tenente já fez quase tudo na PM: estourou cativeiros de seqüestradores, correu atrás de ladrões, invadiu penitenciárias, fez investigações e patrulhou ruas. "É um trabalho que só nos enaltece", afirma. "Eu me sinto realizado quando ouço um 'muito obrigado'."

"Sinto como se estivesse fazendo uma boa ação todo dia"
CABO FLÁVIO HENRIQUE DOS RIOS,
39 anos, da Base Comunitária da PM no Jardim Ranieri, na Zona Sul

Os olhos assustados com tanto movimento e a fala mansa chamaram a atenção dos colegas quando Flávio Henrique dos Rios chegou pela primeira vez a São Paulo, há cerca de seis meses. Recém-promovido a cabo da PM depois de dez anos na corporação, ele morou a vida toda em Bauru, cidade a 321 quilômetros da capital. Também se casou lá, em 2001, e por lá criou seu filho, Matheus, hoje com 6 anos. A vida tranqüila fazendo a ronda nas ruas só foi interrompida quando o convocaram para integrar a equipe de uma Base Comunitária da PM no Jardim Ranieri, na Zona Sul de São Paulo, parte de uma região que anos atrás chegou a ser considerada a mais violenta do mundo. Rios ainda precisaria trabalhar no turno da noite/madrugada, das 18h30 às 6h30. "Cheguei meio ressabiado", diz o policial bauruense. "Mas, para ser sincero, nunca me senti tão em casa como aqui." Durante o trabalho, ele é tratado pelos moradores como um vizinho de longa data. Comerciantes lhe mandam pizzas, refrigerante e pães quentinhos. No Natal, duas famílias fizeram questão de dividir a ceia com os policiais. "Minha maior emoção foi há um mês, quando ajudei a fazer o parto de uma moça do bairro. Sinto como se estivesse fazendo uma boa ação todo dia."

"Quando Edílio morreu, chorei muito"
CABO MARCELO SERAFIN,
39 anos, do Regimento de Polícia Montada Nove de Julho

Edílio tinha 16 anos. Há dois meses, após um tombo, sofreu uma ruptura no estômago e morreu. "Cheguei de manhã e recebi a notícia. Foi complicado, chorei muito...", lembra o cabo Marcelo Serafin, policial desde 1987. "Trabalhamos juntos por quase sete anos, ele era bem parecido comigo..." Edílio era um cavalo alazão. A relação dele com Serafin é o retrato da polícia montada, que só na capital mantém 250 animais da raça brasileiro de hipismo. Diariamente, 130 deles saem do Regimento de Polícia Montada Nove de Julho, na região central, para atuar no policiamento ostensivo, em apoio ao trabalho das viaturas. Em geral são vistos com simpatia pela população. "É comum que as pessoas se aproximem para admirar o cavalo", diz o cabo, que, pai de dois filhos, costuma dar atenção especial à garotada. Nas rondas diárias, os PMs da cavalaria se diferem dos demais. Em vez de cassetete, carregam uma espada. Calçam botas de cano alto, quase no joelho, equipadas com esporas. E usam capacete. Mas, segundo os próprios policiais, o que dá alma ao trabalho é o convívio com os cavalos. Além das atividades normais de qualquer PM, eles gastam diariamente mais de uma hora do expediente para tratá-los, limpá-los e encilhá-los – e, no caso de Serafin, conversar com o companheiro de demoradas e perigosas rondas pelas ruas da cidade.

em parceria com Rodrigo Brancatelli e Sandra Soares.


Quarta-feira, 24 de maio de 2006

15 de dez. de 2008

E o nosso palhaço enquanto isso...

PERFIL
...brilha no elenco de Alegría, do Cirque du Soleil. Com vocês, o paulistano Marcos de Oliveira Casuo, o único brasileiro em uma trupe de 55 artistas

O menino que passava as tardes se divertindo com as trapalhadas de Chaves e os esquetes da Escolinha do Professor Raimundo já sonhava ganhar a vida fazendo os outros rir. Só não imaginava que seria em um dos maiores circos do mundo. "Sempre tive vocação para palhaço", conta Casuo. "Nas peças da Escola Estadual Vicente Leporace, em Santo Amaro, onde estudei, eu geralmente fazia o papel do tonto, do pateta." Desde 2002, ele integra o elenco do Cirque du Soleil, grupo canadense que encanta o mundo com suas montagens impressionantes, atualmente em cartaz no Parque Villa-Lobos com o espetáculo Alegría.

Nascido em 1974, Marcos de Oliveira Casuo passou a infância em Interlagos e Santo Amaro, na Zona Sul da cidade. A partir dos 14 anos, trabalhou como office-boy, auxiliar de mecânico, estoquista de supermercado, frentista de posto de gasolina, garçom e caricaturista de um jornal de São Carlos. Na cidade do interior paulista, aliás, deu seus primeiros passos no picadeiro. "Mudei-me para lá com 17 anos", diz ele. "O circo do Marcos Frota chegou precisando de um acrobata livre e desimpedido, que pudesse viajar com a trupe." Para Casuo, o Grande Circo Popular do Brasil foi a sua universidade. "Minha relação com ele extrapolou o profissional", afirma o ator Marcos Frota, fundador da companhia. "Sou um admirador de seu trabalho e tenho muito orgulho dele."

Durante os nove anos que integrou o circo de Frota, Casuo aprendeu e viajou muito. "Conheci o país inteiro sem precisar pagar nada." Em 2001, foi convidado para um teste promovido pelo Cirque du Soleil no Rio de Janeiro. "Eram mais de 100 candidatos e somente quinze foram aprovados", lembra. Seis meses depois, chamaram-no para ir a Montreal, no Canadá, sede do grupo. Ali, fez um curso de formação geral, também seletivo. Como acrobata, treinava com outros quatro colegas. Mais seis meses e só ele foi escolhido. Estreou em 2002, no México. Mas seu projeto ainda não estava completo. "Queria ser palhaço e precisei convencer a direção do circo disso." Dois anos depois ganhou o papel com o qual retorna a São Paulo. Na cidade, que não visitava fazia três anos, virou uma espécie de anfitrião do resto do elenco – seus 54 colegas são de catorze países. "Muitos gostam de andar de skate e querem conhecer o Parque do Ibirapuera", afirma. "Terei de levá-los lá." Até maio, enquanto dura a temporada paulistana, Casuo aproveita para rever família e amigos. Nesse tempo todo de circo, acostumou-se a não ter casa. Com as coisas pessoais na bagagem, mora de hotel em hotel. "Tenho duas pranchas de surfe que faço questão de levar para onde for", diz.


Quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

14 de dez. de 2008

Quer ver arte? Então, vá de metrô

PINTURAS E ESCULTURAS NAS ESTAÇÕES
Entre uma estação e outra da cidade, podem ser apreciadas 85 obras

Obras de Claudio Tozzi podem ser admiradas nas Estações Barra Funda (Movimento) e Sé (Colcha de Retalhos). Tomie Ohtake, na Consolação (Quatro Estações). Aldemir Martins na Tatuapé (Inter-Relação Entre o Campo e a Cidade) e Wesley Duke Lee na Trianon-Masp (Um Espelho Mágico da Pintura no Brasil). A partir de hoje, o acervo de 86 obras do Metrô - 84 delas expostas ao público nas estações - ganha mais uma peça: o painel Gente, Viagem, Gente, da artista plástica Leilah Costa, deve ser inaugurado às 11 horas na Estação Vila Mariana. “É muito bacana levar uma obra de arte para o povo, deixando-a em um ambiente de seu cotidiano”, diz a artista.

O projeto Arte no Metrô começou há exatos 30 anos, quando a Estação Sé entrou em funcionamento. As três primeiras obras a serem expostas ali, integrando o acervo permanente da companhia, foram as esculturas Garatuja, de Marcelo Nitsche; uma sem título, de Alfredo Ceschiatti; e um mural de Renina Katz, também sem nome. “A idéia da iniciativa é tornar os trajetos dos cidadãos mais próximos da arte”, afirma o chefe do departamento de Marketing da companhia, Aluizio Gibson, que coordena o projeto.

No início, o Metrô comprava as obras. Do começo dos anos 90 para cá, o interesse dos artistas em ter uma criação exposta no metrô paulistano, por onde circulam 3,3 milhões de pessoas por dia, passou a falar mais alto. “Eles procuram a companhia com um projeto, que é submetido a uma comissão especializada”, conta Gibson. “Se aprovado, o artista fica livre para doar a obra ou viabilizá-la mediante patrocínio.”

Atualmente, 31 das 55 estações em funcionamento contam com obras em exposição. Participam do projeto 61 artistas, como Maria Bonomi, Alex Flemming, Mário Gruber e Gontran Guanaes, além dos já citados, entre outros. O acervo da companhia é composto por 21 painéis - contando com o inaugurado hoje -, 15 tratamentos cromáticos, 15 esculturas, 14 pinturas sobre tela, 12 instalações e 10 murais.

Para o artista plástico Claudio Tozzi, a concepção da obra que será exposta em um espaço público deve ser pensada de modo diferente ao daquele que ficará em uma galeria ou um museu. “São características especiais, pois há a relação com o espaço, o diálogo com o entorno”, explica. Ele acha interessante levar a arte para ambientes assim. “Fica quase um espaço simbólico, uma referência. Há quem marque um encontro em frente à obra, por exemplo.”

Com o painel inaugurado hoje - um mosaico feito com 44.390 pecinhas de vidro -, a artista Leilah passa a integrar o time dos que têm obras expostas no metrô. O mosaico, de 18 m², é uma releitura que ela fez do cenário das estações, destacando a pressa e a busca por um objetivo comum a todos os usuários do transporte público: chegar ao destino. “Fiz a imagem no computador, utilizando letras e números para desenhar”, revela ela, que levou um mês para conceber a obra. “Se você observar bem, os braços são letras ‘ele’, a roda é um ‘zero’, e assim por diante.”


Na CPTM, grafite está nas estações e até nos trens

Os quase 2 milhões de pessoas que ocupam, diariamente, os vagões da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) também contam com arte para se distrair. Há 18 obras expostas nas estações.

Na da Luz, por exemplo, está o painel Panorama de São Paulo, de 18 m², com imagens da cidade no início do século 20, clicadas pelo fotógrafo italiano Vincenzo Pastore. A artista plástica Maria Bonomi, na mesma estação, assina o painel Epopéia Paulista, com 200 placas de concreto pigmentado.

Mas o ponto forte mesmo da arte da CPTM é o grafite. Nove obras – metade do acervo – são desse gênero. O traço característico dos badalados irmãos Otávio e Gustavo Pandolfo, Osgemeos, pode ser visto nas estações da Luz, Ipiranga e Lapa. O grafite também está em dois trens da companhia, pintados por Ise, Nina e Osgemeos.


Sexta-feira, 28 novembro de 2008

13 de dez. de 2008

O piloto das antigas

PAULISTÂNIA
Bird Clemente lança livro com suas aventuras em Interlagos

Prestes a completar 71 anos - seu aniversário é no dia 23 de dezembro -, o ex-piloto paulistano Bird Clemente sente-se no alto do pódio. “Esse pessoal da internet fica articulando um monte de coisa para cultivar a imagem dos carros antigos”, comenta. “Pô, a gente se envolve por todo esse clima.” Não é para menos. No início do mês, o piloto das antigas foi homenageado pela revista especializada Racing com o prêmio “Capacete de Ouro”, o Oscar do automobilismo nacional, em reconhecimento pelos mais de 50 anos dedicados ao esporte. E na última segunda lançou seu Entre Ases e Reis de Interlagos, um saboroso livro com histórias e fotos de um tempo em que ser piloto era quase romântico. “Sou de uma época em que não tinha a segurança e a organização de hoje em dia”, lembra. “Não usávamos cinto de segurança e nem um algodãozinho no ouvido.” Seqüela das décadas de motores barulhentos, o ouvido esquerdo de Bird não funciona bem, aliás.

Como gosta de lembrar, o interesse pelo automobilismo foi herdado do pai. Argentino, Francisco Clemente era fã das corridas e acompanhou com admiração a carreira de seu conterrâneo Juan Manuel Fangio, pentacampeão mundial de Fórmula 1. “Papai comprou um rádio potente, o Zenith Transoceanic, para ouvirmos as transmissões das provas”, lembra.

Tão logo tirou a carteira de motorista, Bird resolveu se tornar piloto também. Aos 20 anos, com um Fiat Millecento disputou a terceira edição das Mil Milhas Brasileiras. Uma quase estréia, já que o carro quebrou nas primeiras voltas. Foi somente o primeiro dos 82 desafios de sua carreira - 45 deles em Interlagos. “Devo ser o piloto que mais correu nesse autódromo”, acredita.

A época era de puro amadorismo. “Ninguém se dedicava integralmente às pistas”, afirma. “Eu me dividia entre as corridas e o trabalho com meu pai, em uma indústria do ramo de papel.” No final do anos 1950, quando a indústria de carros Vemag montou seu departamento de competição, Bird passou a integrá-lo. Não recebia salário, mas gozava do privilégio de sempre ter carro novo, para uso particular, bancado pela empresa. Ficou lá até 1963. Saiu porque recebeu um tentador convite para mudar de time.

O projeto da Willys lhe pareceu muito interessante. Para levá-lo, a montadora ofereceu algo inédito aos competidores da época: salário. Era cinco vezes mais do que ele ganhava na firma de seu pai. “A partir daí, os pilotos passaram a ser mais reconhecidos no Brasil”, frisa. Na Willys, teve companheiros que se tornariam famosos na Fórmula 1, como o bicampeão Emerson Fittipaldi, seu irmão Wilsinho e José Carlos Pace, o Moco - que posteriormente emprestaria seu nome ao Autódromo de Interlagos.

Quando não havia corrida, eles faziam o que apelidaram de “cirquinho”. “Eram demonstrações de desempenho e habilidade pelo País todo, uma espécie de show sobre rodas”, conta. Encantavam o público com manobras pelas ruas das cidades, divulgando a marca e promovendo as vendas dos carros.

Em maio de 1970, dividindo um Opala com seu irmão, Nilson, venceu as 24 Horas de Interlagos. Três anos depois, também ao lado de Nilson, mas desta vez no comando de um Ford Maverick, conquistou três provas no autódromo paulistano: as 25 Horas, em agosto; os 500 Quilômetros, em setembro; e as Mil Milhas, em dezembro. Em maio do ano seguinte, nas 25 Horas de Interlagos, encerrou sua carreira. “Acabei batendo no começo e não conclui a prova.”

Nascido na Barra Funda, Bird já morou no Pacaembu e em Higienópolis. Há 30 anos vive em um condomínio na Granja Viana, em Cotia, Grande São Paulo. Ali, nada de ronco de possantes automóveis. Na companhia da mãe - uma lúcida e simpática senhora de 96 anos -, da segunda mulher, e de um de seus quatro filhos, o que ele mais ouve são canários, pintassilgos, sabiás, tucanos e o saltitar suave dos dois coelhos de estimação que não param quietos no espaçoso quintal.

Quando sai pelas ruas - tem um Astra e um Corolla, mas seu xodó é um Fusca ano 1967 totalmente original, presente de um amigo - reconhece que não conta com a mesma habilidade de antes. “Não tenho vergonha nenhuma de dizer que meus reflexos estão adormecidos”, diz. “Por causa da idade, não sinto mais prazer em manejar um carro. É difícil conseguir prestar atenção em várias coisas ao mesmo tempo.”

Além do pesado fluxo de carros, Bird destaca um problema do trânsito paulistano que não existia em sua juventude: os motoboys. “Eles fazem uma arruaça nas ruas, mas são necessários. É preciso acabar com a hipocrisia”, afirma. O ex-piloto defende iniciativas como a faixa exclusiva para motos da Avenida Sumaré. “São necessários espaços para que os motoboys circulem, sem ter de ficar costurando entre os carros”, explica. “Mas os problemas de trânsito não se resolvem com marketing. E, sim, com engenharia, com projetos.”

E de onde vem o nome Bird, que ele mesmo concorda que muitos não entendem, muitos pensam que é apelido? “Meu pai era admirador de um famoso oficial da Marinha dos Estados Unidos, o almirante Richard Evelyn Byrd, um dos conquistadores dos pólos. Trocou o ‘y’ pelo ‘i’”, explica. “Ele queria que eu tivesse um nome curto e sem igual, porque achava que eu iria ser um cara diferente.”

Tornou-se um dos precursores do automobilismo nacional, representante de uma época anterior ao glamour vivido por Emerson Fittipaldi, Nelson Piquet, Ayrton Senna e - por que não? - Felipe Massa. “Antes, o automobilismo era tupiniquim. Os astros éramos nós. Eu fui um piloto tupiniquim, da elite do automobilismo brasileiro”, orgulha-se.


Domingo, 23 novembro de 2008