5 de nov. de 2009

O bicho curioso da arquitetura

ESPECIAL
Música, discos-voadores, cachaça, torresmos e cinema fazem a cabeça do eclético (e badalado) Weinfeld

Mais difícil que definir a arquitetura de Isay Weinfeld é definir o próprio arquiteto Isay Weinfeld. Mas, se um dia você se atrever a fazer isso, por favor, que seja longe dos ouvidos dele. Porque qualquer tentativa de rotulá-lo seria prontamente desqualificada. "Acho que as pessoas realmente não têm muito que fazer para ficar inventando esse tipo de coisa", diz. "É ridículo." Ele já foi chamado de sucessor de Oscar Niemeyer - "meu trabalho não tem absolutamente nada a ver com o dele" -, arquiteto da moda - "já faz mais de 12 anos que me chamam assim; estranha essa moda que não passa..." - e minimalista - "falta de compreensão total do meu trabalho".

Então é melhor deixar que ele próprio se explique. "Eu ainda não me descobri arquiteto. Arquitetura é a forma como me expresso, mas não fico preocupado em ser uma coisa definitivamente", afirma. E, quem não o conhece, deve custar a acreditar que o mesmo homem que repete isso é o badalado autor de projetos como o Hotel Fasano, a loja das Havaianas e uma unidade da Livraria da Vila, todos nos Jardins. "Eu não faço arquitetura do jeito que eu quero. Faço a obra que o cliente quer, só que do meu jeito. É uma diferença sutil, que resume o que acredito", complementa ele, graduado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Filho de um imigrante polonês que veio para São Paulo após a 2ª Guerra - durante a qual ele ficou escondido por mais de três anos em um porão -, Weinfeld nasceu em 1952. Quando seu pai chegou ao Brasil, começou tudo do zero. "Nem o idioma ele falava", conta. Atuou como vendedor ambulante até conseguir montar uma indústria têxtil.

Ainda na adolescência, Weinfeld demonstrava aptidão para as artes plásticas. "Sempre tinha um trabalho sendo apresentado em exposições", recorda-se. Em seguida, passou a utilizar o cinema para se expressar. Em seu passado como cineasta, escreveu e dirigiu 14 curtas e um longa-metragem (Fogo e Paixão, de 1988, com Fernanda Montenegro no elenco), em parceria com o também arquiteto Marcio Kogan. "Foram trabalhos interessantes porque o arquiteto tem uma visão muito específica sobre a cidade e as relações humanas", acredita.

MÚSICA E DISCOS VOADORES
"Bicho curioso por natureza", como ele mesmo diz, Weinfeld tem vários hobbies. A música talvez seja o principal. Em seu apartamento em Higienópolis, onde mora sozinho - é separado e tem uma filha -, possui uma farta coleção de CDs e um piano. Eclético, admira bandas que vão da inglesa Radiohead - é amigo pessoal do guitarrista, Jonny Greenwood - à cearense Cidadão Instigado - a cujo show foi recentemente -, passando pelo sambista carioca Paulinho da Viola e pela cantora de jazz americana Blossom Dearie (1924- 2009). Há alguns anos, chegou a estudar violino. Nas artes plásticas, admira a suíça Mira Schendel (1919-1988). Tem alguns - mas não diz quantos - quadros dela em sua casa.

Simples torresmos são seu prato favorito. Para beber, uma boa cachaça. "Gosto da Anísio Santiago, mas há outros bons rótulos", explica. Weinfeld acredita em discos voadores e já foi um estudioso de ufologia. "No colégio eu tinha um professor de biologia que era a maior autoridade brasileira no assunto", lembra ele, frisando que já faz mais de dez anos que não lê nada sobre o tema. "Gostava de conversar com ele, nos intervalos das aulas, sobre isso. Eu era fascinado por coisas esquisitas."

Como arquiteto, ele estima ter feito cerca de 80 obras. Tem 35 em andamento - trabalha com uma equipe de 25 profissionais em seu escritório. A maioria em São Paulo. "No exterior, estamos fazendo um hotel em Belgrado, na Sérvia, e uma casa na Ilha de Virgem Gorda, no Caribe", revela. Weinfeld admite que, "infelizmente é comum" negar-se a fazer algum projeto. "Ou porque não tenho interesse na proposta ou porque percebo que não tenho a ver com a pessoa. Me dou ao respeito", justifica-se.

Perfeccionista ao extremo, custou a aceitar desenvolver uma proposta para ser publicada no Estado. Assim que o prazo combinado se encerrou, limitou-se a argumentar que não havia conseguido uma boa ideia. Depois de muita insistência, enviou uma curiosa solução para, segundo ele, "diminuir a quantidade de feiura" de São Paulo. "A proposta é cortar tudo o que estiver acima do quarto andar na cidade."


Quinta-feira, 29 de outubro de 2009

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